quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

TUDO A VER

Combinar elementos desconexos exige certo grau de coragem. Para quem escreve este é, talvez, um desafio constante que anima a criatividade, tão necessária para que o texto atinja o seu objetivo com um diferencial. 

Quando os assuntos são cotidianos, rotineiros, escrever sobre eles pode significar apenas informar, comunicar. E a carga emocional, que os acompanha, é repassada sem nenhuma vestimenta que os tornem menos dramáticos, aflitivos, desconcertantes. E nem poderia ser diferente. Este é o objetivo de informar: relatar, sem devaneios, o que se passa.

Diante de tantas questões aflitivas que nos cercam, caberá a quem escreve por prazer escolher os assuntos e abordá-los sob as cores de uma prosa poética, ou de pura poesia. O leitor terá com este exercício de leitura uma visão mais próxima do essencial que é ver mais longe, que é ver o invisível, quem sabe, relacionando seu viver de forma mais abrangente e iluminada pela comunhão com os demais indivíduos, todos alcançados pelas mesmas questões.

Diante da grave questão energética, sob a iminência da falta de luz, transcrevo abaixo uma saída poética para o problema, que Mário Quintana não autorizaria usá-la de forma tão ingênua, sendo ela tão mais profunda do que uma simples falta de luz. Eis seu pensamento:



Delícia de fechar os olhos, por um instante e assim ficar, sozinho, fabricando escuro... sabendo que existe a luz!

(Caderno H, p.178)



Este escuro independe da luz, que, por sua vez, não depende de qualquer fonte de energia.

A luz do amanhecer, porém, está presente no dia a dia. É dádiva a nós oferecida, é um presente do Criador.

Contudo, quando o irmão Sol vai descansar, ficamos perdidos na escuridão. 

Quem sabe voltamos à época do fogo para iluminar os caminhos?

Talvez, um archote. O que é isto? Uma tocha. Coisa muito antiga!

Melhor um lampião. É mais romântico!

Os lampiões fizeram parte das nossas casas no século 19. Iluminavam bem mais do que as velas. Sobre eles muitos poetas debruçaram sua criatividade. Para apenas despejar sua prosa poética ou, muitas vezes, para tornar o tema motivo de preocupação com o social, como demonstram o texto de Mário Quintana e o poema de Jorge de Lima, que seguem:







Um dia, porém, esta luz começou a relacionar-se com aquela outra metade que decretaria para sempre sua dependência a ela: a água.

E a luz, que dependera do óleo de peixe ou baleia ou ainda do querosene para se fazer presente, achou por bem romper com um velho relacionamento e investir numa fonte jovem, inesgotável e cheia de charme: a água. Esta, por sua vez, corria despreocupada por todo o território, mantida abundante por obra da natureza e pela mão do Criador que abria as comportas sempre que necessário.

E era tanta água correndo mundo afora que a gastança se instalou. Águas que se desfaziam em cachoeiras, que se insinuavam por banhados, que deslizavam pelas pedras dos riachos, que formavam os rios, as praias, que se perdiam nos mares. Era muita gente desfrutando de um bem tão atraente, precioso e tão marcadamente necessário a qualquer ser vivo.



Pois é! Toda esta água vem do céu e ao céu volta, segundo o poema CANTO DOS ESPÍRITOS SOBRE AS ÁGUAS, de Johann Wolfgang Von Goethe, do livro Poemas.




Percebe-se de um bom tempo para cá que esta água não mais está vindo do céu na mesma proporção de sempre. O movimento cíclico está desajustado. O homem vem cometendo tantos desatinos como o desmatamento, o desvio de cursos d’água e a própria poluição, rompendo, desta maneira, a cadeia virtuosa capaz de nos manter autossuficientes de um bem essencial para a nossa sobrevivência.

A partir deste desajuste, a dobradinha luz/água, ultimamente, anda discutindo a relação. Parece que nada será como antes.

A luz reclama que a água não lhe serve mais com aquela dedicação de antes. A água, por sua vez, diz que a culpa é daqueles que da luz necessitam e que se metem na relação, não ajudando em nada. Pelo contrário, destroem os ecossistemas o que acaba acarretando um desgaste, já visível, nesta relação.

Aliás, a água até sugeriu que a luz dê um tempo. Quem sabe ela vai buscar uma nova relação, que lhe dê melhor energia, para continuar iluminando os caminhos.

Embora não pareça, elas têm tudo a ver. Elas sabem disso.

E só para manter acesa uma luz no fundo do túnel, a água promete que vai continuar colaborando por mais um tempo. 

Agora, já disse para a luz avisar aos seus dependentes para maneirarem com a destruição que vem acarretando tantos problemas para ela, a água. E manda uma advertência:

Se bobear, não vai sobrar nem para tomar, quanto mais para iluminar.

Cadê a chuva?

Aliás, como já disse o poeta:

A alma do Homem é como a água: do céu vem, ao céu sobe.



É! O Criador parece que anda dificultando este vaivém, o da água, tão essencial a nossa sobrevivência. Não tem aberto as comportas lá de cima tão facilmente. E nós somos os responsáveis. 

Para perceber a importância desta dádiva da natureza, assistam aos vídeos que seguem. Um, que usa da poesia, o outro, didático, que explica a comunhão entre o casal água e luz nos bons tempos: aqueles da fartura.






Planeta Água – Guilherme Arantes




Kika – De Onde Vem a Energia Elétrica 







quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

TEM QUE SER POSSÍVEL

Nunca o volume foi tão intenso e danoso quanto nos últimos tempos. A quantia de desastres naturais ou aqueles ocasionados pelo próprio homem é alarmante. Embora com a ciência e a tecnologia ao nosso lado, produtos da especialização humana, parece que estamos ainda deficitários no nosso viver diário. De ambas auferimos maior comodidade, mas não o aumento da sensibilidade. A impressão que fica é que o nosso físico beneficiou-se, mas o espírito está cada vez mais perdido. E somos especialíssimos, pois dispomos de algo que fala mais forte: os sentimentos. E é na parte incorpórea ou sensível do ser humano, o nosso espírito, o lugar onde eles repousam.

Os sentimentos, por sua vez, valem-se dos sentidos para expressarem-se. O que estará acontecendo então com os sentimentos?

Os sentidos, pelo que se tem notícia, estão cada vez mais aguçados. A resposta, porém, dada por eles está diminuída de sentimentos.

Estará nosso espírito, então, diminuindo de importância frente ao físico?

Não, claro que não!

O espírito faz parte da criação de algo maior, que transcende a nossa própria origem. Portanto, parece ser eterno.

Diante desta constatação, acredito ser possível alterar o padrão negativo que solapa nossos melhores sentimentos. 

Aos milhões e milhões de seres que se veem constrangidos pelas barbáries, atrocidades, cataclismos, devastações, promovidos pela banda podre da humanidade e pelo grito da natureza, resta adotar uma postura fraterna e de cooperação desinteressada que se espalhe como círculos concêntricos, tal qual aquela pedra jogada na água, gerando ações positivas num mar de ações deletérias. Tudo para que se quebre o padrão negativo que nos assola já há algum tempo.

Está na hora de homens e mulheres voltarem a ser mais sensíveis. 

Não se está a falar aqui daquelas emoções da montanha-russa, despencando, ou do jogar-se do penhasco abaixo seguro por uma corda. Estas são as emoções-choque na classificação de Michel Lacroix, reconhecido filósofo francês.

Fala-se aqui da emoção-contemplação que, por conseguinte, cria em nós, segundo ainda o filósofo, a capacidade de usufruir o sabor do mundo. Enquanto a primeira, a emoção-choque, nos ajuda a sobreviver no mundo, ligando-se ao corpo em ação, a segunda liga-se ao coração receptivo.



E é exatamente esta emoção, ligada ao sentimento, que estamos perdendo. Nos últimos tempos, tem havido uma exacerbação da primeira, a emoção-choque, demonstrando, no meu entender, um retrocesso na evolução da espécie. Convenhamos que a sobrevivência, no início dos tempos, era pura emoção-choque, conforme classificação exposta.

Será que evoluímos?

Claro que sim.

Caberá a nós, seres pensantes, dosar melhor os avanços que a tecnologia nos trouxe. Ela veio para nos ajudar, para nos conectar com mais facilidade. Nada, porém, que passe pela possibilidade de que tal melhoria substitua o sentimento que se extrai de um olhar, ao vivo e em cores.

Se o mundo das notícias, por exemplo, carrega nas cenas de destruição, nós, no universo que nos cerca, por autossobrevivência, temos que recorrer a uma emoção-contemplação, como antídoto. Pousar o olhar sobre um pé de jacarandá florido, escutar a chuva batendo no telhado, trocar balbucios com o pequenino que nos acena quando cruzamos próximo, sentir a grama sob os pés, mesmo estando calçado, pois o caminhar torna-se fofo e por aí afora... Oferecer aos nossos sentidos aquilo que despertará nossos melhores sentimentos, nossas melhores emoções.

Agora, extrair da cena abaixo valores, que nos classifiquem como espécie humana evoluída, está cada vez mais difícil.

“Num automóvel, o motorista e mais dois ocupantes, todos no celular, estão conectados ao mundo, mas não entre si.” 

“Eventualmente, dois dos ocupantes balbuciam algo entre si.” 

“Nada mais do que isto.”

“O motorista, a cada sinaleira em vermelho, digita algo no celular.”

“Não há entre os ocupantes conversa alguma.”

“Os olhares dos dois ocupantes concentram-se nas telas e o motorista no trânsito, quando o carro está em movimento.”


Pois é! Por enquanto, pois em breve os carros não precisarão de motoristas. É o que preconiza a robótica para os próximos anos.

O que Nicholas Carr discorre no seu livro A Geração Superficial – O que a Internet está fazendo com os nossos cérebros – vale uma leitura.

No mundo de 2001, imaginado por Stanley Kubrick, a mensagem final aponta para uma máquina como sendo uma personagem humana. E se nossa dependência para a compreensão do mundo for mediada por uma máquina, então nos tornaremos seres com inteligência artificial.

Isto até pode acontecer.

Agora, ser inteligente é uma coisa. Ser sensível, ter sentimentos é outra. Estaremos realizando tarefas com eficiência robótica, destituídos totalmente de emoções, de sentimentos. Seremos robôs de carne e osso.

Confesso que isto é alarmante. Quero crer, porém, que ainda é possível mudarmos o padrão com equilíbrio, discernimento e muita sensibilidade para temperar tudo, qualidades que os robôs, acredito, nunca possuirão.

É preciso acordar. Isto tem que ser possível.



Por ora, melhor é desembarcarmos do tal automóvel. Pegar a cuia de chimarrão e ir matear com os vizinhos do edifício em frente. Todos sentados, comodamente, em bancos no meio do jardim. E olha que não são apenas os aposentados que frequentam tais bancos. Há quem, depois do trabalho, jogue conversa fora nos mesmo bancos, com ou sem chimarrão. Claro, com o celular no bolso, pois vá que alguém ligue. E esta é a sua função principal.

Agora, posso afiançar que ninguém permanece falando ao celular, sentado no banco. Sou olheira! Ali, o papo e o olho no olho são as coisas preferidas.



O pequeno poema O ENCONTRO, de Mário Quintana, dá uma visão da importância do olhar.




Pablo Neruda, por sua vez, versejou, de forma apaixonada, a importância de um olhar. Vejamos: 



Ou, quem sabe, ESSE SEU OLHAR, composição de Antônio Carlos Jobim, nos convença de que os olhares trocados entre dois seres humanos, que já, muitas vezes, são difíceis de serem entendidos, conforme a letra do festejado autor, jamais poderão ser substituídos, com êxito, por qualquer olho robótico. Nem mesmo por olhos humanos via skype. JAMAIS!

E se ainda o leitor não estiver convencido, acompanhe a letra de PELA LUZ DOS OLHOS TEUS, composição de Vinícius de Moraes e Toquinho, para definitivamente esquecer os robôs. Eles jamais poderão cumprir a importante missão de amar. Nem mesmo pelo olhar.




Esse Seu Olhar – Antônio Carlos Jobim/Kamille Carvalho Huebner(intérprete) e Cadú Carvalho (violão)


Pela Luz Dos Olhos Teus – Vinícius de Moraes e Toquinho/Tom Jobim e Miúcha(intérpretes)







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Comentários via Facebook:

Amelia Mari Passos: Água.Lava.Leva.Limpa.Querida Soninha Athayde Gosto muito de seu trabalho. Sinto-me honrada em ser tua leitora.Perfeita harmonia.Tuas palavras, poesias e a tão linda canção inesquecivel canção.Um abraço com carinho.Obrigada.


quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

DO TACAPE AO DRONE

Das savanas pouco restou. Da espécie, que lentamente foi-se erguendo, surgiram seres das mais diversas características. Tudo de acordo com as condições climáticas do lugar em que a espécie foi se desenvolvendo. O instinto animal preponderante foi a marca de sobrevivência e perpetuação. Quem diria que depois de milênios as armas de destruição seriam o brinquedo favorito de mentes distorcidas que desqualificam o adjetivo civilizatório. E o que é pior! Mentes privilegiadas insuflando, fomentando e se locupletando de ações cruentas e bestiais: tudo em prol do poder.

Nos primórdios, o enfrentamento se resumia à força física. No braço, com o auxílio de um pedaço de osso qualquer, de uma pedra ou de um tacape, íamos ganhando território, as presas e as fêmeas à disposição.

Estamos bem mais sofisticados hoje. Depois de passarmos pela infantaria, cavalaria, pela artilharia com bombas, foguetes e mísseis, de maior ou menor potencial destrutivo, chegamos aos drones. Aniquilamos alvos escolhidos a quilômetros de distância, sem risco para os pilotos encarregados do massacre. É a tecnologia servindo aos propósitos mais vis, estando já em uso pelas forças de repressão, indistintamente.

Como prenunciava Mário Quintana no seu FUTURÂMICA:

E haverá uma época em que se fabricarão bombas atômicas especializadas, especializadíssimas, meu caro senhor, e tão sutis que no princípio não se notará coisa nenhuma... até que um dia alguém descobrirá que se acabaram, por exemplo, todos os tenores de banheiro, todas as imitadoras de Berta Singerman, todos os poetas comemorativos, todas as oleografias do Marechal Deodoro proclamando a República!

(Caderno H- p.161)


O mundo globalizado do século XXI tornou-o plano, como afirma Thomas L. Friedman. Graças aos avanços da tecnologia e da comunicação vivemos todos absolutamente conectados, o que apenas reforça a nossa participação, senão como espectador, mas, também, como partícipe de todos os eventos, positivos ou negativos, que varrem o planeta, cotidianamente.

Isto é bom, porém alarmante e desafiador.

Alarmante, porque estamos à mercê de quaisquer ações tresloucadas que ocorram.

Desafiador, porque devemos manter uma visão otimista do amanhã. E está cada vez mais difícil mantê-la.

Estamos cercados. De um lado, os de direita; do outro, os de esquerda.

O poeta Luiz Coronel dá a sua versão poética da ESQUERDA & DIREITA:




Será o centro um “poder sem utopia, ao sabor dos ventos?”

E os totalmente radicais? E os suicidas em nome de uma causa?

Em quais lados estarão?

Quem sabe ao seu lado, ao nosso lado...


O mundo está precisando de homens e mulheres de boa vontade, independentemente de que lado estejam ou de qual religião professem.

Somos diferentes uns dos outros. Temos idiossincrasias muito particulares, observáveis mesmo entre membros de uma mesma família. Nossas origens são diversas e nossos valores, igualmente.

E a beleza está na diversidade e na capacidade de convivência pacífica. Para tanto, deve haver respeito ao outro. Ensinamentos que partem da própria célula familiar e de uma escola aberta ao diálogo e a valores formadores do caráter de cada indivíduo.

Sendo todos nós originários da mesma espécie, com um DNA caracterizadamente humano, deveremos ter nossos direitos e deveres resguardados pela sociedade em que estamos inseridos, independentemente da origem geográfica de cada um. O que se observa, no entanto, é que a exclusão de certos grupos pode levá-los a servirem de massa de manobra, desvirtuando capacidades que seriam mais bem aproveitadas na sociedade em que buscaram abrigo. Iguais oportunidades de estudo e trabalho seria, por certo, uma solução. 

E o que estará acontecendo aos que estão em suas comunidades de origem? Para que servirão os drones por lá? Para intimidar? Para aniquilar? Para desestabilizar? Para abrir caminhos à sanha predatória? Para espoliar riquezas? E tudo com o aval dos poderosos da região.

É! Estamos longe de uma solução pacífica e proveitosa para todos os lados.

Mesmo assim, o otimismo não deve ceder ao desalento.


Agora, segundo o poeta Mário Quintana, TRÊS COISAS nos acompanham de há muito:

Todas as antigas civilizações – por mais isoladas umas das outras, no tempo e no espaço – sempre começaram descobrindo três coisas: a poesia, a bebida e a religião.

(Caderno H – p.156)


Quanto à bebida, devemos bebê-la com moderação!

Quanto à religião, a leitura da crônica dispensa comentários.

Quanto à poesia, o próprio Quintana dá a resposta quando escreve POESIA & MAGIA, ressaltando o aspecto mágico, que faz parte do nosso ser e que encontra guarida na sua leitura:


A beleza de um verso não está no que diz, mas no poder encantatório das palavras que diz: um verso é uma fórmula mágica.

(Caderno H – p.59)


Se todas as antigas civilizações descobriram no poder encantatório da palavra um alimento mágico, expresso em versos, e se, também, a aquisição de um sistema de crenças foi o caminho para a redenção, ambas, palavra e fé andaram sempre juntas. A ÁRVORE DOS POEMAS, de Mário Quintana, é uma exortação a que a palavra poética cumpra o seu dever de alimentar o espírito, sempre que necessário. Torçamos para que a tal árvore não suspenda a produção.





Agora, só para atualizarem-se, assistam ao vídeo que segue e onde drones (robôs) tocam instrumentos musicais.

Quanto à música drone, dita de estilo minimalista, vou poupá-los.

Ninguém merece!

E o tacape?

- Credo! Que coisa mais retrô!




Flying Robot Rockstars 





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Comentários via Facebook:

Amelia Mari Passos: "O mundo está precisando de homens e mulheres de boa vontade, independentemente de que lado estejam ou de qual religião professem.Soninha Athayde " Sensata razão e seu sensivel coração , espalham esperança.Meu abraço querida