sábado, 21 de março de 2015

RENOVAÇÃO
















Renovar é reinventar-se. É assistir ao espetáculo do chão atapetado pelas flores recém-caídas dos jacarandás da rua onde moro. É saber que este tapete se renovará, por primeiro, em novas flores exuberantes e em um novo tapete de rua no próximo Outono.

Com tantas datas a serem comemoradas no mês de março, é difícil escolher apenas uma para se comentar. Com certeza, porém, todas contêm o aspecto da renovação. Não só porque serão novamente comemoradas no ano seguinte, mas porque implicam num contínuo desejo de melhora daquilo que se está a homenagear.

Quem não quererá melhorar a situação das florestas e da água no planeta?

Para isso, porém, não basta elegerem-se os dias 21 e 22 de março para tais comemorações.

Aliás, se não cuidarmos desses dois fundamentais bens da humanidade, os nossos futuros Outonos não serão tão belos quanto os de hoje. Os jacarandás, talvez, nem mais depositem suas flores sobre os passeios porque, quem sabe, nem mais floresçam para nos dar este espetáculo.

E a nossa cidade, esta jovem de 243 anos, precisa se reinventar para que continue ainda jovem por mais 243 Outonos.

Temos que cuidar das poucas áreas de mata nativa de que ainda dispomos. Isto é absolutamente urgente.

E o nosso Guaíba? O nosso Arroio Dilúvio? Tanto se tem falado e tão pouco se tem feito.

Em A HORA É AGORA!, crônica publicada em 02/01/14, fiz referência a outra crônica, de nome RS + 25 – OH, GAIA! HAVERÁ SAÍDA?, publicada em 04/07/12, onde o vídeo anexado demonstra o que foi feito no Arroio Cheong Gye Cheon, em plena cidade de Seul, capital da Coreia do Sul.

Na mesma crônica, outro vídeo apresenta estudos iniciais feitos pela parceria UFRGS/PUC, onde as Universidades colocam todo o seu aparato humano e tecnológico à disposição dos gestores públicos, para que se leve adiante essa proposta de despoluição do Arroio Dilúvio. Tais vídeos são bastante elucidativos para a resolução de problemas como a despoluição e o cuidado com os mananciais, criando-se com estas medidas um forte apelo ao turismo na região.

Em outra crônica, À BEIRA DE UM RIO, publicada em 27/08/14, fiz uma reflexão sobre a situação do nosso Guaíba, de todos os demais rios que o compõem e dos arroios que desembocam nestes rios. A poluição hídrica é um fato gravíssimo.



Embora diante de tantas mazelas que nos cercam, é preciso ser feliz.

Não é nem preciso comemorá-la na data de 21 de março, dia dedicado a ela.

É preciso, porém, vivenciá-la diariamente. Renovando-se cada um de nós a cada amanhecer.

Na crônica UMA BUSCA DIÁRIA, publicada em 26/03/14, a felicidade é descrita como a capacidade de encantamento, de entrega, de emoção e paixão pela vida. Instantes do dia que o transformam para além do trivial, embora, como escrevi, esse aspecto contenha elementos significativos na busca de instantes em que a felicidade pode ser, também, ali encontrada. 

Como as marés, ela vem e vai. O importante é que esse movimento se estabeleça com constância. E cabe a cada um de per si captar, pelo menos, um instante diário em que o espírito, que é amor, possa sentir com o coração o poder de amar. A felicidade, neste momento, inundará aquele ser amoroso que detém o poder divino de fazer-se feliz, porque filho do Criador.

O aprendizado da felicidade requer um exaustivo trabalho do sentir. É pela capacidade de sentir que nos tornaremos mais próximos do outro e descobriremos o valor maior que representamos para nós mesmos e para o conjunto. Por isso, o embate é constante e necessita de um compromisso diário.

Torçamos para que os amanheceres sejam mais plenos e fraternos. Que novos caminhos se abram a todos que acreditam num olhar amoroso para consigo e para com o outro.

Aí estará depositada a semente da felicidade. Dela surgirá uma colheita digna de quem a plantou. 

E renovar-se será o propósito diário, a cada amanhecer...








Felicidade – Marcelo Jeneci






sábado, 14 de março de 2015

EXALTAÇÃO!

Tudo já está nas enciclopédias e todas dizem as mesmas coisas. Nenhuma delas nos pode dar uma visão inédita do mundo. Por isso é que leio os poetas. Só com os poetas se pode aprender algo novo.
                                         (Do Conhecimento, Caderno H, p. 165)


Mário Quintana, de forma irônica e com senso de humor, trata o fazer poético, que era mestre, como uma força poderosa de enriquecimento do conhecimento: pela simples visão inédita do mundo, como afirma.
Assim, digo eu, é possível aprender que uma lua pode revirar os olhinhos ou desviá-los só para não constranger o casal que está amando, como em:





Esta lua é tão viva, tão partícipe, tão antiga, que já faz parte do olhar de quem com ela tem parceria.
Assim como vivas são as imagens do trecho extraído de DELÍRIOS de Manoel de Barros:

Eu estava encostado na manhã como se um pássaro à toa estivesse encostado na manhã. Me veio uma aparição: Vi a tarde correndo atrás de um cachorro. Eu teria 14 anos. Essa aparição deve ter vindo de minhas origens. Porque nem me lembro de ter visto nenhum cachorro a correr de uma tarde. Mas tomei nota desse delírio. Esses delírios irracionais da imaginação fazem mais bela a nossa linguagem.
E ainda:

Sapo é um pedaço de chão que pula”. 
Até as pedras da rua choravam”.


Gabriel Perissé, em seu livro A ARTE DA PALAVRA, páginas 119 e 120, diz a certa altura:

“O escritor é um ser humano. Sente o divino prazer de ser humano. Um ser humano comum. Que pega ônibus. Que fica na fila de um banco. Mas carregando uma luz... iluminando essa fila, o que nela existe de kafkiano, de cruel, de cômico, de insensato, de sugestivo... iluminando os episódios corriqueiros que acontecem dentro de um ônibus. E essa luz torna o ônibus mais ônibus, mais real, tão real que chega a ser surreal... Mais impressionantemente real do que podemos perceber na nebulosa rotina do dia a dia”.

E, mais adiante:

“O que ilumina é a convicção. A convicção de que há uma força simbólica na realidade, nas palavras, e que essa força, percebida, identificada, oferece novo alento à nossa vida”.

E esta palavra, cuidadosamente buscada, metaforicamente usada, é que fornecerá estilo, tornando-se este eterno.

Shakespeare, no trecho que segue, exalta a metáfora, tão usada pelos poetas. Com certeza, é ela quem dá precisão à linguagem poética.


(do livro A Poesia – Uma Iniciação à Leitura Poética – Armindo Trevisan, páginas 236 e 237)


Diante do que já foi exposto, acredito que esteja plenamente justificado o título desta crônica. Uma EXALTAÇÃO, neste dia 14 de março, à arte de poetar e um aplauso a todos aqueles que a este ofício se dedicam.

VIVA O DIA NACIONAL DA POESIA!

 Sintam-se motivados com as sugestões que seguem:
“Eu acho que todos deveriam fazer versos. Ainda que saiam maus, não tem importância. É preferível, para a alma humana, fazer maus versos a não fazer nenhum. O exercício da arte poética representaria, no caso, como que um esforço de autossuperação. É fato consabido que esse refinamento do estilo acaba trazendo necessariamente o refinamento da alma”.
 (Mário Quintana, Caderno H, p. 24 – trecho extraído do epigrama A POESIA É NECESSÁRIA)


ME ENSINA A ESCREVER, composição de Oswaldo Montenegro, incentiva-nos quando diz que não sabe se o poema é bonito, mas sabe que precisa escrever




Me Ensina a Escrever – Oswaldo Montenegro 





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Comentários via Facebook:

Elizabeth Remor: Parabéns Soninha Athayde, excelente homenagem! Abraço dourado.

Amelia Mari Passos: Não há palavras.Nada será justo.Amo- te - ler. Obrigada. "Não sabe se o poema é bonito, mas sabe que precisa escrever." assim é .

Maria Odila Menezes: Parabéns Soninha! Mais uma vez me encantas com a tua Crônica. Trechos que ficaram na minha memória:" O que ilumina é a convicção." "Eu acho que todos deveriam fazer versos."

Zaira Cantarelli: Soninha Athayde, transmites msg de sabedoria, refletes um aprendizado íntimo, humano, poético. muito bom te ler ! Escrever é a arte do voo onde a gente se transporta a um outro mundo para parir versos e é tão bom qdo os amigos curtem o q escrevemos, mas infelizmente apenas alguns, os verdadeiros (no meu caso).

Rosane Luft: Sonia no meio de tantas notícias ruins ler uma poesia é tudo de bom, nos faz acreditar que a vida é possível. um abraço




domingo, 8 de março de 2015

ATÉ QUANDO?

A cena que segue existiu e é recente. Acabou virando um conto. 

VIAGEM SEM VOLTA é um alerta àquelas mulheres que buscam o convívio como prazer em encontros fortuitos com outras mulheres em igual situação existencial, de pura carência afetiva. É tão absurda esta constatação que parece ficção. A luta pela própria identidade é ainda anterior ao alcance de níveis educacionais satisfatórios, às oportunidades de trabalho em postos de direção, bem como à igualdade de remuneração salarial com os trabalhadores homens.

A cena abaixo descrita é a realidade transformada em ficção. Aliás, a ficção tem um pé, às vezes dois, na realidade que nos cerca.

Então, vamos lá!



Chegam devagar. O banco, vazio, os recebe. Lado a lado, acomodam-se. Não se falam. Ele, olhar perdido, é um estranho ao lado da companheira. Nada parece interessar. Ela, vez por outra, fala algo.

Que pena! Não dá pra ouvir. Do banco ao lado, Helena observa o casal. Têm aproximadamente a mesma idade. São diferentes, porém. No olhar feminino há mais luz, mais brilho, mais vida. Acompanha com visível interesse o entorno. O rapaz que panfleta alcança um pedaço de papel colorido com alguma propaganda. Ela, habilidosa, de imediato vai construindo um barquinho. Um barquinho de papel, aprendido na infância. Timidamente, mostra ao companheiro. Ele olha com olhos de absoluta indiferença. Ela, por sua vez, fala palavras que se perdem por entre as árvores da praça onde se encontram. 

Que lástima não poder ouvir! Helena fica a conjecturar sobre pensamentos e sentimentos transbordantes daquela cena. Com certeza, haverá tantas coisas pra falar. Tanta vida! Helena navega mais além e imagina que aquela senhora acostumou-se a sentir prazer em doses esporádicas. Lembra-se de si própria quando regava as plantas, que se espalhavam pelo apartamento, encontrando nisso única fonte de prazer: o prazer do encontro com o outro. Não importando que o outro fosse uma planta ou, como agora, um barquinho de papel. 

Com esses pensamentos, Helena vê aproximar-se outro casal de idades aproximadas.

A mulher adianta-se e vem cumprimentar a conhecida: aquela do barquinho. O homem, por seu turno, mantém-se à distância. Depois, muito lentamente, aproxima-se. As mulheres, a esta altura, já conversam animadamente. Parecendo sentir-se obrigado, o recém-chegado cumprimenta com a cabeça e troca umas poucas palavras com o cidadão: aquele do olhar perdido.



Helena observa o entusiasmo com que as duas mulheres conversam. Parecem sugar uma da outra toda a seiva de que ainda dispõem. Parecem alimentar-se de “pura vida”. É comovente observar-se esse esforço mútuo.



Porém, aproxima-se o companheiro da “loquaz visitante” e sinaliza o fim do encontro: com um olhar e um toque no braço.

Visivelmente contrariada, a mulher encerra a conversa. Lança, ainda, um muxoxo para a amiga, que sorri. Que vontade de “quero mais”!

Ele, afastando-se, encara a mulher que, prontamente, despede-se e o acompanha. E lá se vão... Lado a lado, mudos.

No banco da praça, o barquinho, nas já enrugadas mãos, permanece. Com carinho, a senhora completa a última dobra.

Em frente, no laguinho, outro barquinho navega: daqui pra lá, de lá pra cá. Vai e volta...

Que pena! Esse não navega mais. Atracou no banco. Sucata virou.

Helena observa o casal que se levanta. Por sua vez, acredita que ainda haja tempo e força para lançar o seu próprio barco e virar timoneira.

O sino da igreja próxima desperta Helena para o instante que se foi.

Do seu banco, ainda enxerga o barquinho de papel. Resta caído no chão, levado pelo vento.

Não há mais tempo. Eis o retrato de uma viagem sem volta.

Que pena! 



Que sejam cada vez mais raras, pelo menos em nosso meio, as cenas reveladoras da sujeição evidente que reconhecemos em tantas situações do nosso cotidiano, bem como os maus tratos e agressões costumeiramente noticiadas.

Lutemos para que o ser capaz de gerar seja um ser liberto, com identidade própria e com liberdade necessária para amar e ser amada.

Que o poema abaixo sirva de alerta para “essa coisa de marcar” que só ao gado é imposto.

Dia 8 de março: um dia de ALERTA.







Mujer Coraje – Ivan Lins 









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Comentários via Facebook:

Rosane Luft: Legal , muito bom.

Amelia Mari Passos: " Lutemos para que o ser capaz de gerar seja um ser liberto, com identidade própria e com liberdade necessária para amar e ser amada.Soninha Athayde" Minha flor gosto de tua sincerida e Coragem! Recebe meu abraço.