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sábado, 1 de novembro de 2008




 

ENFIM, NIVELADOS...


“Me dá uma moeda pro pão?”

Que cena mais comovente! Os olhos mortiços do guri, ainda pequeno, espelham a cara da fome. Encolhido junto a uma parede, próximo à confeitaria, seu pedido repete à exaustão. A maioria não se detém.

Parece que ninguém mais ouve, enxerga ou se incomoda com essas cenas. Ficou combinado que isso é assim mesmo. Uns têm, outros não têm. Uns vivem, outros vegetam. Uns exploram, outros são explorados.
E os dias arrastam-se para uns, à semelhança de seus fétidos corpos arrastando-se pelas calçadas.

E os dias voam para outros, à semelhança de seus velozes carros, de seus aparatos tecnológicos que consigo carregam. Correm porque o feriado se aproxima. Terão tempo para uma escapada, que pode ser logo ali, há alguns bons quilômetros ou até há alguns milhares de quilômetros. Pra que existe avião?

Que coisa mais chata essa gente esparramada sobre calçadas de avenidas tão nobres. É uma verdadeira poluição visual.

Vamos buscar outros ares. Pelo menos, vamos mudar os cenários e ver essa mesma gente espalhada sobre calçadas de outros lugares. Oh, pobres coitados! Vamos nos engajar em campanhas mundiais. Ao menos estão eles bem longe de nossos olhos. A gente contribui e acalma a consciência. E já está de bom tamanho a nossa preocupação com o social. Os esfarrapados daqui, afinal, vivem num país tropical. Não devem sofrer tanto com o frio.

Pois, a moça parou. Quis dar a ele uma moeda de um real pra comprar pão, mas o guri pediu:

“A senhora compra, tia, e me dá”.
Ficou sentado, encolhidinho, esperando. Será que ele sabe qual é o “seu lugar”? Não quis entrar, nem junto com a moça. O seu lugar é ali fora. É, mais ou menos, como o cachorrinho que deve ficar fora do estabelecimento. É pior. É muito pior.

Nessas alturas, a moça lembrou-se da cena fotografada, onde caixões e caixas abertas e amontoadas, fétidas, com restos mortais, esperam destino para possível incineração, por falta de pagamento na manutenção dos túmulos.

Tem diferença entre pagar e não pagar? Parece que sim. Será mesmo?
Se pagar, fica fechadinho, guardadinho. Se não pagar, vai pro forno. Tem diferença?

E essa gente esparramada pelas calçadas? Vai pra onde? Pra vala comum, que está de bom tamanho.

“Pois à terra dada não se abre a boca”- trecho do poema dramático Morte e Vida Severina do poeta maior João Cabral de Melo Neto – mostra-nos que esta vida pode ser mais Severina, ou menos.




    
     trecho de Morte e Vida Severina



Mas ao fim, todos, com certeza, estaremos nivelados.
Pois o sopro divino não faz distinções. E, como sabemos, estamos todos de passagem.

Reflitamos sobre isso nesse Dia de Finados.