quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

POR QUÊ?




Aquela arvorezinha enfeitada com restos de papéis coloridos e latinhas, lembrando que já é quase Natal, contrapõe-se àquela outra que permanece na memória visual de Belinha. Aquela lembrada é de uma formosura ímpar. Altiva, iluminada, homenageava, todos os anos, ÀQUELE que descansava na manjedoura, num presépio delicadamente arranjado ao pé da árvore altaneira. Tradição que se mantém pelos séculos.

Por que tanta diferença entre estas duas árvores?

Junto a esta arvorezinha, enfeitada com restos, jaz dormindo um homem. Não há ali uma manjedoura, nem, tampouco, as demais figuras que compõem o cenário, tão conhecido, de um presépio.

Terá tido este homem a oportunidade de viver momentos de encantamento junto a uma árvore de Natal? Talvez, sim. Talvez, não. Quem poderá saber? Ele próprio. Ninguém mais.

E as luzes que costumam acompanhá-la?

Belinha guarda os momentos de encantamento que aquelas luzes representaram. Bem mais tarde, fez um poema só para registrar aquele período da sua infância. Ele ficou assim:





Ah! Tinha uma manjedoura que também encantava. Este cenário, ainda hoje, faz parte de seus pedidos, pois dialoga com seu MODELO todos os dias e, em especial, na data do SEU aniversário. Uma oração virou o poema que segue.




Agora, como esquecer aquela arvorezinha feita de restos.

Como nem tudo é um mar de rosas, problemas houve e foram enfrentados por Belinha com denodo, ainda bem jovem, entendendo o momento certo para iniciar a mudança quando foi necessária. Seguir em frente e evoluir, transcendendo o aqui e o agora para o depois: com esperança.

Belinha acredita que a LUZ, embora não presente na pequenina árvore, está, sim, presente no ser deitado ao lado, pois todos possuímos esta LUZ interior que nos mantém vivos. Às vezes, porém, é tênue esta sensação de força interior que ela nos propicia.

Por que então ali ainda se encontra?

Sua posição, deitado sobre a calçada, revela, sim, ser uma criança que não soube crescer, pois crescer dá trabalho. Aliás, muitos assim existem. E nem se encontram deitados nas calçadas da vida, embora todos esses, também, circulem sem rumo definido.

É claro, porém, que, muitas vezes, seres desprovidos desta força interna precisariam DAQUELA SENHORA que nos identifica como cidadãos. Todos: filhos deste solo dos quais és mãe gentil. Tão gentil que os acolhesse, não como indigentes, mas como possíveis brasileiros aptos para o trabalho. A autoestima desses novos cidadãos seria resgatada e as suas luzes interiores acenderiam muitas outras luzes. E todas, em corrente, de forma sucessiva, iluminariam cada novo ano por chegar com aquilo que nos faz acreditar num amanhã melhor: a esperança.

Daí, talvez, nem coubesse a pergunta inicial:

POR QUÊ?

A imagem simplesmente não existiria.






 A Harpa e a Cristandade – Luis Bordon







sábado, 24 de novembro de 2018

ADIANTA, SIM!


Pela rua, com uma pequena mochila às costas, caminhava e falava. Não gesticulava. Apenas falava. Às vezes, num tom mais alto. As palavras eram repetidas à exaustão. Tive minha atenção despertada, pois eu caminhava alguns passos atrás. Ao ultrapassá-lo, lentamente, pude observar que não portava celular, nem fones de ouvido. Questionava o fato, demonstrando não se conformar com o ocorrido.

E o que ocorrera?

Parece que haviam roubado um verso. Mais precisamente o 5° verso.

Exasperado, repetia e repetia:

-Roubaram o quinto verso. Não adianta escrever!

Incrível ter ouvido esta frase de um transeunte sozinho, andando por uma calçada do bairro onde moro, longe de onde eles, os versos, flutuam por entre os jacarandás da praça que os acolhe.

Quem teria roubado o tal 5º verso?

De qual poema?

Quem seria o seu autor?

O próprio transeunte?

Ou estaria ele impregnado pela atmosfera de magia, própria daquela praça “dos livros”, que foi capaz de torná-lo tão imaginativo a ponto de transformar-se em um poeta.

Estaria nascendo um novo poeta?

Afinal, cantar e escrever, dizem, é só começar.

E quem teria roubado o seu 5º verso?

Seria apenas imaginação sua?

Quem sabe, uma desculpa para não escrever. Teria tentado escrever um poema, mas ao ver-se sem ideia alguma para tanto, alardeava, agora, que não escreveria mais. Seria apenas uma desculpa para encobrir a sua incapacidade.

Pessoalmente, não creio nessa possibilidade.

Um poema pode nascer desse seu caminhar que se deixa acompanhar pela sua própria voz. Basta sentir desperta esta vontade de expressar-se. E o verbo roubar, talvez, esteja tão em moda que o usou querendo dizer que este 5º verso sumiu da publicação. Um problema da editora.

Brincadeiras à parte, talvez o poema INSPIRAÇÃO represente, de forma plena, o amálgama entre o poeta e a sua criação. Uma completude que o sustenta, que o alimenta e que dá frutos para quem de sua obra puder sorvê-la.

Imagine se, acaso, sumisse o meu 5° verso da estrofe que segue. Ficaria ela, a Poesia, sem a definição do que ela é pra si mesma. Raciocínio que se completa no verso seguinte.

Ela, com certeza, é muito pra mim mesma, pois ela própria reforça a certeza de ser tudo pra mim.

Acompanhe a segunda estrofe e seu 5º verso:


Eu sou tua amada transfigurada.

Eu sou tua inspiração.

Então, vê se, qualquer dia,

Busca, em outra amada, mais do que sou:

Porque eu sou apenas POESIA.

Mas sou TUDO pra ti.


E se esta aprendiz de poeta, neste outro poema, descobrisse o sumiço do 5º verso que encerra a última estrofe do seu poema POETAR. Veja a falta que faria.


É saber-se artífice da palavra,

Mas não seu dono.

Pois essa arte de sua lavra,

Se a muitos puder encantar,

Aí, sim, valerá a pena poetar.



Agora, impensável seria o sumiço dos 5ºs versos do poema ISTO, do poeta/maior Fernando Pessoa. Imaginem a falta da confissão poética que tudo esclarece ao final.



(Poesia Completa, página 165)




Por isso, meu conselho ao transeunte/poeta é que persevere porque de uma perda poderá nascer uma ideia que resgatará esta frustração. Uma nova inspiração, um novo olhar, outro ângulo, outro enxergar.

Tenho pra mim que a atmosfera da Feira do Livro desceu sobre esta cidade uma aragem renovada, plena de emoções afloradas.

Todos ganharam. Os que escrevem, aqueles que leem, aqueles que apenas circulam, timidamente, por entre as bancas, mas absorvem as sensações que encontram pelo caminho, bem como as conversas que despertam a atenção.

Alguns, quem sabe, sentirão despertados em si o poder criador pela necessidade de exprimir suas emoções, preenchendo aquela folha em branco que há tempo jaz sobre a escrivaninha.

Outros se perderão no meio de tantos livros comprados, mas que serão apreciados pela leitura rotineira.

Aos que habitualmente escrevem, com certeza, terão seu prazer recompensado pela leitura e exposição de seus livros àqueles muitos que puderem encantar.

E ao nosso transeunte/poeta, que vive “off-line”, parece este mês de novembro ter trazido a ele a possibilidade de sentir-se poeta: o que não é de todo mau negócio.

Dizem alguns que “de poeta e louco todos têm um pouco”.

E isto ficou provado neste encontro inusitado com alguém que perdera o 5° verso.

Acredito, porém, que tenha ganhado momentos de êxtase com sua criação mental: o que já é um bom início para o nascimento de um poeta.

Portanto, siga em frente!

Afirmo com convicção, meu caro transeunte/poeta:

ADIANTA, SIM!


Pois, saiba que versos, mesmo sendo “Simples Versos”, feitos de coração, são um presente para quem os recebe. Veja o que a música VERSOS SIMPLES, cantada por uma das componentes do Grupo Chimarruts (vídeo abaixo), deixa como recado a todos nós.



Versos Simples - Chimarruts









sábado, 6 de outubro de 2018

AS URNAS...



Quando Aninha lá chegou, depois de uma viagem de trem, pôde vê-lo ainda. Deitado, com o semblante sereno. Lá estava seu avô tão querido. Companheiro de caminhadas quando vinha visitá-la na Capital. Ainda bem que, à época, as urnas funerárias não eram muito comuns. Caso contrário, estaria escondido e dali jamais sairia. Já seria pó. Depois de seu nome ter sido afixado ali na urna, ao pó teria voltado. Aninha não poderia tê-lo visto pela última vez.

Bem diferente das urnas que visitaremos no próximo domingo.

Ao contrário daquelas que representam o fim, estas últimas sempre indicarão alguém que permanecerá vivo. Se o seu nome foi ali digitado, um ser renovado, pelo apoio popular, nascerá mais forte ainda.

As primeiras urnas representam o fim daquele eleitor. Restarão apenas suas ideias, valores, atitudes. Se tiverem sido adequados, todos lembrarão dele com orgulho. Caso contrário, nada restará mesmo.

Em nossas urnas, nesta data cívica que se aproxima, dali sairá um ser vivo vencedor: apenas um. Os demais, metaforicamente, estarão mortos. Assim como nas primeiras urnas, restarão suas atitudes, suas obras, suas ideias, seus valores. É claro, se tiverem sido, razoavelmente, pelo menos, adequados. Caso contrário, nada restará.

Bah! Esqueci!

Como estarão todos vivos, porque esta urna, diferentemente da primeira, não põe fim à vida, haverá, portanto, a possibilidade de continuidade da prática indecorosa de tantos atos contrários aos valores que dignificam o ser humano.

Estas urnas apenas separam o joio do trigo. Não extinguem o joio. Ele continuará vivo, destruindo plantações inteiras, solapando os mais diversos valores: materiais ou espirituais.

Estas urnas, diferentemente das primeiras, são uma esperança de vida renovada pelo toque consciente e cidadão de quem aguarda o melhor para todos.

E aos não escolhidos, espera-se que repensem suas ações e atitudes para que, num futuro, possam sair vencedores de novos pleitos eleitorais, pois estes reforçam a importância da participação dos cidadãos na construção diária deste país.

Assim como Olavo Bilac, no poema A PÁTRIA, publicado em 1904, exorta a criança brasileira a amar a terra em que nasceu, também Aninha, hoje, espera que a urna confirme este amor pelo Brasil, regurgitando aqueles nomes cujos modelos não nos servem.

Segue, abaixo, o poema A PÁTRIA de Olavo Bilac, cujos dois últimos versos são por demais motivadores e ensejam um comprometimento, desde tenra idade, com o país em que se nasce.




Obs. Poema que integra a Antologia Poética de Olavo Bilac, publicada em 2015, pela L&PM POCKET, vol.38. (Revisores: Paulo Hecker Filho, Cintia Moscovich e Simone Borges).



A Pátria - Olavo Bilac