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sábado, 24 de novembro de 2018

ADIANTA, SIM!


Pela rua, com uma pequena mochila às costas, caminhava e falava. Não gesticulava. Apenas falava. Às vezes, num tom mais alto. As palavras eram repetidas à exaustão. Tive minha atenção despertada, pois eu caminhava alguns passos atrás. Ao ultrapassá-lo, lentamente, pude observar que não portava celular, nem fones de ouvido. Questionava o fato, demonstrando não se conformar com o ocorrido.

E o que ocorrera?

Parece que haviam roubado um verso. Mais precisamente o 5° verso.

Exasperado, repetia e repetia:

-Roubaram o quinto verso. Não adianta escrever!

Incrível ter ouvido esta frase de um transeunte sozinho, andando por uma calçada do bairro onde moro, longe de onde eles, os versos, flutuam por entre os jacarandás da praça que os acolhe.

Quem teria roubado o tal 5º verso?

De qual poema?

Quem seria o seu autor?

O próprio transeunte?

Ou estaria ele impregnado pela atmosfera de magia, própria daquela praça “dos livros”, que foi capaz de torná-lo tão imaginativo a ponto de transformar-se em um poeta.

Estaria nascendo um novo poeta?

Afinal, cantar e escrever, dizem, é só começar.

E quem teria roubado o seu 5º verso?

Seria apenas imaginação sua?

Quem sabe, uma desculpa para não escrever. Teria tentado escrever um poema, mas ao ver-se sem ideia alguma para tanto, alardeava, agora, que não escreveria mais. Seria apenas uma desculpa para encobrir a sua incapacidade.

Pessoalmente, não creio nessa possibilidade.

Um poema pode nascer desse seu caminhar que se deixa acompanhar pela sua própria voz. Basta sentir desperta esta vontade de expressar-se. E o verbo roubar, talvez, esteja tão em moda que o usou querendo dizer que este 5º verso sumiu da publicação. Um problema da editora.

Brincadeiras à parte, talvez o poema INSPIRAÇÃO represente, de forma plena, o amálgama entre o poeta e a sua criação. Uma completude que o sustenta, que o alimenta e que dá frutos para quem de sua obra puder sorvê-la.

Imagine se, acaso, sumisse o meu 5° verso da estrofe que segue. Ficaria ela, a Poesia, sem a definição do que ela é pra si mesma. Raciocínio que se completa no verso seguinte.

Ela, com certeza, é muito pra mim mesma, pois ela própria reforça a certeza de ser tudo pra mim.

Acompanhe a segunda estrofe e seu 5º verso:


Eu sou tua amada transfigurada.

Eu sou tua inspiração.

Então, vê se, qualquer dia,

Busca, em outra amada, mais do que sou:

Porque eu sou apenas POESIA.

Mas sou TUDO pra ti.


E se esta aprendiz de poeta, neste outro poema, descobrisse o sumiço do 5º verso que encerra a última estrofe do seu poema POETAR. Veja a falta que faria.


É saber-se artífice da palavra,

Mas não seu dono.

Pois essa arte de sua lavra,

Se a muitos puder encantar,

Aí, sim, valerá a pena poetar.



Agora, impensável seria o sumiço dos 5ºs versos do poema ISTO, do poeta/maior Fernando Pessoa. Imaginem a falta da confissão poética que tudo esclarece ao final.



(Poesia Completa, página 165)




Por isso, meu conselho ao transeunte/poeta é que persevere porque de uma perda poderá nascer uma ideia que resgatará esta frustração. Uma nova inspiração, um novo olhar, outro ângulo, outro enxergar.

Tenho pra mim que a atmosfera da Feira do Livro desceu sobre esta cidade uma aragem renovada, plena de emoções afloradas.

Todos ganharam. Os que escrevem, aqueles que leem, aqueles que apenas circulam, timidamente, por entre as bancas, mas absorvem as sensações que encontram pelo caminho, bem como as conversas que despertam a atenção.

Alguns, quem sabe, sentirão despertados em si o poder criador pela necessidade de exprimir suas emoções, preenchendo aquela folha em branco que há tempo jaz sobre a escrivaninha.

Outros se perderão no meio de tantos livros comprados, mas que serão apreciados pela leitura rotineira.

Aos que habitualmente escrevem, com certeza, terão seu prazer recompensado pela leitura e exposição de seus livros àqueles muitos que puderem encantar.

E ao nosso transeunte/poeta, que vive “off-line”, parece este mês de novembro ter trazido a ele a possibilidade de sentir-se poeta: o que não é de todo mau negócio.

Dizem alguns que “de poeta e louco todos têm um pouco”.

E isto ficou provado neste encontro inusitado com alguém que perdera o 5° verso.

Acredito, porém, que tenha ganhado momentos de êxtase com sua criação mental: o que já é um bom início para o nascimento de um poeta.

Portanto, siga em frente!

Afirmo com convicção, meu caro transeunte/poeta:

ADIANTA, SIM!


Pois, saiba que versos, mesmo sendo “Simples Versos”, feitos de coração, são um presente para quem os recebe. Veja o que a música VERSOS SIMPLES, cantada por uma das componentes do Grupo Chimarruts (vídeo abaixo), deixa como recado a todos nós.



Versos Simples - Chimarruts