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terça-feira, 25 de novembro de 2008



DE PLANTÃO...

Pois a gauchada andava mais inquieta que cavalo sarnento. Aquela notícia surgira mais rápida que bote de cobra. E foi assim, de repente, que Gumercindo viu-se cercado por vizinhos que vinham em busca de mais informações.

Afinal, coisas estranhas andavam acontecendo bem perto dali, há apenas alguns quilômetros. Talvez Clóvis, seu filho, que era engenheiro agrônomo, pudesse esclarecer o que estava ocorrendo lá pras bandas de Santa Catarina.

Mas, Gumercindo foi logo informando que seu filho não se encontrava. Tinha ido à Capital e lá permaneceria por uns dois meses, completando um curso de especialização.

A indiada, porém, tinha vindo decidida a buscar alguma explicação para tais fenômenos, no mínimo estranhos.

Frustrados por não encontrarem Clóvis, apearam mesmo assim dos cavalos e passaram a confabular. Tinham que tomar uma decisão. Pela descrição de quem estivera por lá, a coisa prenunciava possível entrevero. E o pior é que o inimigo não aparecera: só deixara rastros. De qualquer maneira, cautela era necessário nessa hora. Mas atitudes deviam ser tomadas. A mais sensata, após votação, pareceu ser acampar sobre a coxilha mais próxima à fronteira. Ficar ali por um tempo, de plantão. Depois, ir-se aprochegando despacito...

Tomada a decisão, já, de pronto, apareceram uns tauras para seguirem na linha de frente.

Entonces, dando adeus ao amigo Gumercindo, foram-se campo afora. Mas, sem se aperceberem, lá se foi também, no meio da indiada, o sobrinho de Gumercindo, o Andrezinho, 16 anos, um guri muito metido.

Como sempre, tinha vindo passar as férias escolares na casa do tio. Nos últimos anos, mudara-se pra Capital, onde estudava. Estava cursando o 2º Grau. A cada visita, trazia novidades da cidade grande.

Pois aquela notícia deixara o guri todo assanhado. Não pensou duas vezes: meteu-se, por entre a indiada, com seu tordilho.

Depois de muito cavalgar, quando a barriga já andava pelo espinhaço e a noite caíra, chegaram a tal coxilha. Só então, deram com os olhos no guri. Mas aí já era tarde.

Resolveram apear, acampando todos juntos, exceto alguns poucos que se acomodaram no topo da coxilha para melhor enxergar.

Tinham trazido o suficiente para passarem uns três dias, não mais. Esse seria o tempo necessário para descobrirem o que por ali estava acontecendo. Armas, munição e homens de prontidão: era o principal. O resto dava-se um jeito: charque, mate e café de chaleira.

Andrezinho já se sentia no meio do entrevero que, com certeza, iria acontecer. Seria uma experiência e tanto. Logo ele que pretendia ser jornalista, mais precisamente um correspondente de guerra. E tratou de preparar seus apetrechos: bloco, caneta, câmera fotográfica e um aparelhozinho, minúsculo, em que se viam imagens, que nem num televisor em miniatura. Coisas de guri da cidade.

Enquanto isso, os tauras da linha de frente, que tinham trazido um binóculo emprestado do patrão Afrânio, dono da Boqueirão, se aboletaram no cume da elevação. E, de lá, começaram a ver luzes que se acendiam e se apagavam, como se estivessem a sinalizar algo. Quando o facho de luz afastou-se um pouco, os cavaleiros da linha de frente, no meio da escuridão, viram dois círculos que se desenhavam sozinhos. Era como se alguém, de dentro da terra, de baixo pra cima, fosse traçando, com o auxílio de um gigantesco compasso, linhas circulares. E a indiada esperando, ansiosa, o embate. Quando vissem os adversários, avisariam a retaguarda e avançariam de surpresa. Mas nada! Ninguém apareceu: nem cavaleiro, nem cavalo. Nada aconteceu. Só a escuridão... Assim, passou-se a noite.

De manhãzinha, quando a claridade se instalou, puderam, então, observar os tais círculos por entre a plantação, toda ouriçada, como se uma força interna a tivesse empurrado de baixo para cima.

A peonada entreolhou-se e começou a desconfiar de que aquela notícia da tal de máquina, que o patrão Afrânio contara a eles, poderia ser a chave para tão estranho fenômeno.

E saíram dali em direção aos homens da retaguarda, certos de que a revelação, brevemente, chegaria aos ouvidos do mundo.

Já imaginaste, tchê? Se Deus é mesmo brasileiro?

Pois a tal máquina, que anda em busca de Deus e que está sob reparos, um tal de acelerador de não sei quê, parece que está por chegar ao seu destino. Seria a maior revelação para a humanidade. A indiada acha até que foi sabotagem. Quando o destino final estava ali e ela pronta pra explodir, seguraram a dita. O máximo que ela conseguiu foi ouriçar as palhas da plantação, estacando logo após. Mas deixou marcas. E o mais interessante... Por mais alguns poucos quilômetros, a tal máquina teria irrompido em solo rio-grandense. Já pensaste? O papa, que nos visitou, já era gaúcho, ucho, ucho! Agora, imagina só! Deus sendo gaúcho, ucho, ucho!

E o Andrezinho?
 
Pois não foi dessa vez que ele conseguiu estar no “front”, sendo testemunha ocular dos sonhados embates.

Mas como é um guri bem informado, já recebeu por e.mail informações de que na Inglaterra, há alguns anos atrás, uns gaiatos fizeram esses mesmos desenhos em plantações de trigo. Só pra mexer com o imaginário popular.
 
Mesmo com essas informações, o guri acha que não vai adiantar repassá-las. O pessoal não ia acreditar.

E pelo que pôde observar da peonada, eles estão esperando que a máquina seja consertada. Voltaram às lides campeiras, por ora. Mas, estão de olho. Aliás, nem pregam mais o olho. Tem sempre alguém de plantão.