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segunda-feira, 9 de março de 2009


 

O ENJOO


A zona é conhecida. Lá pras bandas do bairro Espírito Santo. Depois de Ipanema, antes do Veludo. É por ali. Seus pais pedem ao tio que pare o carro. A menina vai vomitar. Precisa vomitar. Eram tantas as bolachinhas que comia! Todas cobertas de manteiga. A camada de manteiga era quase mais espessa que a própria bolacha. Era uma comilona de tudo. Considerando o que comia, deveria ser bem mais gordinha. Mas era levemente cheinha de corpo. Ah! Costumava misturar coisas diferentes entre si, tipo puxa-puxa com pastel, salsicha com chocolate branco e por aí afora...

Portanto, vez por outra, dava-se mal. Mas, era uma criança saudável. Tinha em torno de nove, dez anos. Estudava em escola pública. Era excelente aluna. Mas, ainda brincava de boneca. E como brincava! Sozinha, pois não tinha irmãos. Era dona do pátio, do galpão, do seu mundo.

Observadora das lides caseiras, após o café da manhã, corria para o galpão para preparar o café para os seus filhos e para o pai deles. Tudo parecendo real. Eram responsabilidades que assumia como dona daquela “casa de bonecas” montada dentro do galpão, no fundo do quintal.
Espelhava-se na mãe, seu modelo naquele instante da vida. Brigava com os bonecos, seus filhos, quando esses desobedeciam. Tudo de mentirinha. Mas parecia verdade.

O importante é que, no fundo, não era verdade. Só parecia... No instante seguinte, já se entretinha com Rex, o cachorro da família. E logo, logo estava a arrumar a pasta com o material escolar, porque, à tarde, a escola esperava por ela.

Para lá chegar, tinha que percorrer uma espécie de servidão de passagem, que a vizinhança chamava de “bequinho”. A escola era numa rua paralela, atrás de sua casa. O tal “bequinho” era o acesso mais próximo.

Pois, perigo ali não havia. Nem em sua casa, rondava o perigo.

Ir à venda da esquina, onde comprava bananas e docinhos, também não causava apreensão a ninguém.
Costumava ir à venda, mais de uma vez ao dia, só pra comprar “branquinhos”. Aí, depois, acabava ficando enjoada de tanto comer. Era um enjoo próprio de quem come demais.

Era só comida demais.

Aninha lembrou-se, hoje, dessas cenas. Acha que não foi por acaso. Sua trajetória exitosa de vida leva a crer que teve a sorte de não ter enfrentado situações de risco. Risco de ver seu mundo do faz de conta transformar-se em uma brutal realidade.
Teve tempo de escolher o momento exato de parir. E sabem de uma coisa? Nem enjoar, enjoou. Nunca soube o que foi isso.

Enjoar mesmo só na época das bolachinhas “Lili” com manteiga.

Nesse Dia da Mulher, cercado de tantas comemorações, Aninha percebe que o caminho a percorrer ainda é longo.
Mas, desde já, causa-lhe enjoo essa violência perpetrada contra nossas meninas: que andam a enjoar antes do tempo.

Que vergonha!
Até quando?