domingo, 28 de setembro de 2008



 
TALHADO PRA COISA!

Pois Paulo, por ser do tipo franzino, virara Paulinho. O que perdia no vigor físico, ganhava no raciocínio rápido, na esperteza, na quase audácia. Por vezes, excedia-se.

Como naquela vez, no colégio, em que, por detrás da porta, ouvira Irmã Beatriz confidenciar a uma colega sua simpatia pelo Professor Moacir, de Matemática. Interpretando as palavras da freira, a seu bel-prazer, achou que tinha descoberto um segredo. Guardou-o, portanto, para, no momento certo, usá-lo em seu favor.

Lá pelas tantas, numa prova de final de semestre, cometeu tantos erros que estava por um fio para ser reprovado. Daí, o pirralho pretendeu usar o tal segredo para ser aprovado. Ao ser inquirido pela irmã Beatriz, vice-diretora, demonstrou saber da tal conversa. Com isso, pretendia safar-se modificando a nota final.

Quase foi expulso por comportamento danoso a si e aos que com ele conviviam. E, claro, teve que repetir o ano. A irmã, coitada, que sentia simpatia pelo Professor, por ser ele um vocacionado para a profissão, quase já não se dirigia ao colega. Tinha até medo que os demais professores ficassem pensando coisas e loisas... Um absurdo!

Mas o guri não se emendava.

Certa feita, inventou uma tal de rifa, cujo prêmio não existia. Os pais foram chamados a devolver o dinheiro recolhido.

Conforme ia crescendo, tornava-se mais habilidoso no trato com os colegas. Mas o fato é que ninguém depositava muita confiança nele.
Acabou por concluir o 2º Grau, embora não gostasse de estudar. Essa era a verdade.

Mas lá pela casa dos vinte e poucos anos, conseguiu passar num concurso, tornando-se um funcionário público de nível médio.

Nesse novo ambiente, pôde exercitar essa sua índole nada recomendável. Aliás, antes trabalhara numa borracharia, onde lá, também, metera-se em alguns “rolos” com os colegas. Portanto, o problema não era onde ele trabalhava, mas, sim, o seu perfil.

Não se sabia exatamente o que ele pensava sobre as coisas. Nem o que pretendia. Os colegas da repartição já comentavam que Paulinho era meio muçum. Ensaboado, pra piorar.

Nessa marcha, conseguiu meter-se na associação de classe, onde obteve votos suficientes para dela fazer parte. Os colegas reconheciam que, para percorrer alguns caminhos, fazia-se necessário ser, digamos assim, habilidoso.

A essas alturas, ele ficara sabendo do apelido que lhe haviam posto: Muçum

Mas isso não lhe incomodava. Pelo contrário, dava-lhe um renovado estímulo. A cada tento obtido, ficava provado ser de grande utilidade, no seu dia-a-dia, essa sua característica.

Sim, porque ela transformara-se em algo desejável. Não mais abominável, como na juventude. Os tempos da Irmã Beatriz eram coisa do passado.

Paulinho, agora, é o Paulinho Muçum.

O fato é que já tem conseguido para o Posto de Saúde, onde trabalha, algumas melhorias. Os “coitados”, que lá buscam atendimento, têm até esperança que Muçum consiga um novo aparelho de Raios X. As comadres já cochicham que Muçum prometeu “furar” a fila dos transplantes. Ninguém sabe como ele fará isso. Também, não importa.

O que interessa é que ele vai se candidatar a um cargo no Legislativo. E conta com o apoio de todos aqueles “infelizes”, a saber: os necessitados que nele acreditam.

Dizem até que anda metido num tal de “negócio da china”. Essa “china” é aquela dona, conhecida no bairro, que, nas horas vagas, é uma sacoleira de mão-cheia. Costuma trazer, às escondidas, uns remédios Made in China, via Paraguai.

Que dupla! Esses vão longe...

Aliás, como lema de campanha já está pensando em algo tipo:

“Vote em Paulinho Muçum. Aquele que não é apenas mais um".

Todos da comunidade estão esperançosos. Paulinho já prometeu atender a todas as reivindicações. São pedidos e mais pedidos...

Mas, sempre paira a dúvida.

Tomara que ele não vire um “daqueles quitandeiros”. E ainda convença um ou outro de seus eleitores a se tornarem “laranjas”. Já pensou?

Sabe como é: uma mão lava a outra.
Favores prestados, favores cobrados...


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