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terça-feira, 20 de setembro de 2011











PAZ


O fogo atrai naquela gélida noite.

Todos ao redor como se estivessem absolutamente ligados àquele ritual ancestral. Os gravetos, habilmente dispostos ao derredor de uma lenha mais robusta, prendem o olhar do chiru. Os olhos de Teobaldo, peão de estância, fixam-se na chama que crepita.

Que tonteria querer saber o que se passa com o peão do lado! Está, também, ele preso pelo olhar ao fogo que arde. E assim estão todos por ali: aquerenciados, irmanados, seduzidos pela chama que propaga luz e calor.

Um latido próximo desperta os homens. O cusco veio se juntar aos companheiros de tropeada.

No descampado, hoje, não zune o minuano. Só o frio se espalha pelo campo.

Esta noite, Teobaldo está pensativo. Na roda do tempo volta à infância: aos tempos de guri. Vê-se encilhando um petiço e iniciando um arremedo de doma dentro do cercado da fazenda, onde morava. Lembra-se de dar voltas e voltas, no mesmo lugar, como se estivesse domando de verdade. E o poço redondo em que buscava água! O balde, pendurado por uma corda, se sumia numa escuridão também redonda, lá embaixo, longe dos seus olhos.

Estão por ali, agora, vários peões da estância. Lentamente, os causos começam a despontar e a cuia, de mão em mão, vai celebrando a união fraterna que a cena traduz.

Teobaldo, sentado num resto de tronco, com os ouvidos bem atentos, vai escutando tudo o que pode. Com a mão estendida, pendente ao seu lado, traça no chão um círculo dentro de outro círculo e, nesse, outro círculo menor e, daí em diante, vai se perdendo em pensamentos.

No alambrado da vida, vai escancarando desejos, peleando vivências, tropeando o dia a dia. Como um bagual, que não se entrega, desperta das lembranças com o passar da cuia às mãos pelos companheiros do fogo de chão. Ao lembrar-se do seio da mulher amada, no gesto de pegar a cuia, fixa o olhar no verde da erva.

Descobre, naquele momento, ao sorver o mate, sua ligação ao seio materno, aos olhos da amada, aos companheiros da roda de chimarrão. Dá importância à chama de um amarelo intenso, à lua cheia, toda branca, pendurada lá em cima, ao calor que cerca todos que ali estão. Em plena harmonia e paz, Teobaldo permanece sorvendo, de olhos fechados, aquele mate bueno. Solito, em seus pensamentos, vê o pampa sem aramados, sem fronteiras, com o minuano zunindo e as melenas seguras pelo chapéu de beijar santo em parede.

O certo é que essa sensação de paz é o encontro do ponto de equilíbrio: ele e o mundo. Teobaldo está ciente de que, nesse labirinto da vida, cada um tem uma entrada e uma saída. Sem esquecer, é claro, do PATRÃO que, da porteira, a todos vigia.

 E a Terra, toda redonda, vestida de azul, que a todos nutre e conserva, agradece o belo quadro que com ela foi construído naquela noite.



Que nesse vinte de setembro, relembremos nossas façanhas, nossos ideais, nossa visão libertária, mas, sobretudo, busquemos, sempre, acima de tudo, a paz. Que entre nós, paisanos, reine a justiça, o entendimento e a solidariedade: ingredientes saudáveis para uma coletividade que se quer modelo para outras.




Uma viagem pela música gauchesca: