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sexta-feira, 19 de abril de 2013





VOAR...
            NAVEGAR...
                               VIVER...
 
A imaginação voa e vai construindo pontes, elevadas, adentrando, por vezes, chão abaixo, para sair logo adiante, lépida e faceira, pronta para novas rasantes.

Voar? Sim, voar é preciso.

Na imaginação, Adalberto já vestiu sua cidade de tudo o que dela espera.

De repente, vê-se num barco, navegando de lá pra cá, daqui pra lá, num vaivém contínuo, com as pequenas ondas a balançar o cansaço de mais um dia de trabalho, com a brisa acariciando-lhe o rosto, num retorno mais relaxante e mais rápido ao lar que o aguarda.

Adalberto acabou de pintar o quadro de um porto hospitaleiro que recebe e devolve, diariamente, seus trabalhadores aos seus lares.

Navegar? Sim, navegar é preciso.



Uma buzina estridente, contínua, devolve Adalberto à realidade. Espremido, não divisa qualquer movimento, nem o fim dessa peregrinação diária, estafante. Não sabe nem a que horas chegará ao seu destino. Seu sonho de consumo tornou-se um pesadelo, que se repete a cada dia, inclusive nos fins de semana, quando, eventualmente, sai a passear.

Seu veículo parado, no meio de outros milhares, todos parados, aguardando o fluxo que se arrasta.

Viver?

Não, isso não é viver.


Segundo a Presidente da Petrobras, um engarrafamento é uma coisa “linda”.

O que é uma coisa linda? Algo que desperte prazer, na sua ampla acepção.

Ela confirma, então, que sente prazer em ver milhares de carros, todos congestionados em uma rodovia.

Que maravilha! Atesta-se, aqui, o total desprezo ao outro. Claro que faz a ressalva de que a mobilidade nas cidades dependerá dos planos diretores, para que esses orientem o fluxo dos carros a favor da sociedade. Foi uma frase extremamente infeliz.


Os planos diretores das cidades esbarrarão na falta de verbas para a construção de tudo aquilo com que Adalberto sonha: a mobilidade por terra e água.

Mais carros, mais carros...

Isso é viver? Não, isso não é viver.

Mas viver é preciso!

 
A expressão “Navegar é preciso, viver não é preciso” coube à época de sua criação. Segundo historiadores, sua origem remonta ao ano 70 a.C. O general romano Pompeu teria sido incumbido de uma missão: escoltar a frota que iria transportar trigo das províncias para a cidade de Roma, que passava por séria crise de abastecimento de gêneros alimentícios, por conta de uma greve de escravos.

A viagem era arriscada em face das condições do clima em alto mar, ocasionando riscos à navegação, bem como o ataque de piratas, frequente à época.

Diante da necessidade de enfrentamento do drama por que passava a população de Roma, ele teria proferido essa famosa frase, quando o comandante da frota antevira uma tempestade, sugerindo, então, que adiassem a partida.

Ao que se sabe, a viagem foi bem sucedida. O militar, em face da empreitada exitosa, foi guindado ao posto de cônsul com apoio da população romana. Posteriormente, acaba integrando o Primeiro Triunvirato que governou todo o território romano.

Afora a questão histórica, Fernando Pessoa, celebrado poeta português, também usou a mesma expressão, no seu poema “NAVEGAR É PRECISO”.

Há algumas interpretações possíveis para o poema. O próprio autor escreve que “viver não é necessário; o que é necessário é criar.” Outra, também possível, seria a necessária precisão no ato de navegar, deixando à vida a imprecisão, por ser ela imprecisa, por natureza.

Abstraindo-se essa digressão histórico-literária, cabe a nós refutar a afirmação de que um congestionamento é algo lindo de se olhar, porque isso não traz ao cidadão felicidade alguma. O ideal é que esse cidadão possa se locomover, ou através de transporte de massa, de superfície ou não, ou de barco pelo nosso Guaíba e seus afluentes.

Soa como um deboche a afirmação de que um congestionamento é lindo de se ver.

Viver dessa maneira, sim, não é preciso. Viver assim não é viver.

Esse viver é aquele a que Fernando Pessoa se referia. É o viver por viver.

Para ele o necessário era criar algo, tornar essa vida grande para toda a humanidade.

No caso presente, tornar esse viver produtivo, criativo, em prol da comunidade. Com planejamento, torná-lo menos impreciso. Num esforço conjunto, visando ao bem comum, todos contribuiriam na busca de melhoramentos das condições ambientais que cercam essa comunidade. Dentre elas, a mobilidade de seus cidadãos.

Portanto, continue voando em sonhos, navegando nas águas serenas, tão próximas de nós, indo e vindo de forma sustentável, menos estressante, e, sobretudo,aja sempre no sentido de obter melhorias para si e para a comunidade em que está inserido.

VIVER É ISSO!

E VIVER É PRECISO!


Agora, enquanto isso, da próxima vez que pintar um congestionamento, Adalberto já decidiu: ele abrirá a porta do carro e os seus potentes alto-falantes explodirão numa batida frenética. E ele pulará para fora do carro e gritará “CON LOS TERRORISTAS” e “DO THE HARLEM SHAKE”, contorcendo-se de mil maneiras.

Tem certeza de que seus companheiros de estrada, pelo menos os mais próximos, sairão de seus carros e todos, juntos, dançarão o Harlem Shake. Assim, extravasarão todo o stress e a raiva contida através daquele meme já tão globalizado, já tão nosso também.

Só pra sacanear, para virar hit.

Só para mostrar, para o mundo todo, como é lindo um congestionamento!



Entrevista publicada no jornal Zero Hora de 14 de abril de 2013:

"Então, que maravilha! Acho lindo engarrafamento! Meu negócio é vender combustível. Só entendo que deveríamos ter sempre planos diretores para orientar o fluxo de carros a favor da sociedade. Acho lindo carro na rua, estou faturando..."

- Maria das Graças Silva Foster, Presidente da Petrobras

 
Navegar é Preciso - Fernando Pessoa
  
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