quinta-feira, 31 de março de 2011



A IMAGEM

Uma gota escorre pelo ralo. E outra corre atrás. E mais outra... Seguem mesmos caminhos? Nem sempre. Há as que se perdem nos vãos dos tijolos, secando sem juntar-se às demais. A maioria, porém, segue o curso normal e desaguá no esgoto, na rua, no arroio... Estão juntas, coesas, fétidas ou não. Isso, absolutamente, não importa. São parte de um universo maior. 
 
Lembro-me, agora, do cachorro do vizinho. Leal, amigo, brincalhão, um olhar manso. Exatamente igual a tantos outros que conheço. Não importa se abandonados, ou não. Não interessa se circulam perfumados pelas avenidas, ou não. Seguem o caminho sem atropelos. São previsíveis. De longe, avistam os irmãos da espécie. Atravessam a rua, chegam devagarzinho e, aos poucos, vão se cumprimentando. Daquele jeito que só eles sabem fazer. São parte de um universo maior. Vez por outra, porém, surgem alguns que, desde filhotes, são agressivos. Não por raça, mas por algum traço particular que os diferenciam. Algo em seu DNA que destoa dos demais. Parece não se acertarem com nenhum outro da espécie, nem da mesma raça. São absolutamente desconectados daqueles com os quais convivem, sejam eles humanos ou outros iguais a si. 
 
Parece que quanto mais se aprimora a evolução, mais aumenta a capacidade de destruição desse ser guindado a um patamar superior na escala evolutiva.
 
Quando irrompe, no Pacífico, aquela onda aterradora é a força das águas se fazendo presente. É o momento de maior grandeza dessas águas. Elas se unem para demonstrar quão coesas estão, quão fortes são. Não há destruição entre si. Elas se reconstroem em novas danças. É a natureza absoluta. 
 
Quando o felino abocanha a presa, pode ser sobrevivência. Porém, muitas vezes, é o próprio filhote que é devorado. Será o quê, então? Um desvio do instinto? 
 
Aqui, já estamos ascendendo a um novo estágio evolutivo. E, quando se chega ao topo da cadeia, os exemplos vão ficando mais cruéis. 
 
Nós, humanos, o que fazemos? O matar, por legítima defesa, é diminuto. A destruição em massa, a matança planejada e os assassinatos são uma constante. As agressões físicas e verbais se somam no dia a dia dos cidadãos. A violência contra os nossos semelhantes é avassaladora e impressiona a quem se detém a observar tais mazelas. 
 
Estamos no topo da cadeia evolutiva, mas, a cada instante, um tsunami explode, de dentro para fora, e violentamos, esfolamos, “apagamos”, viciamos, atropelamos uns aos outros. Nosso interior está doente, profundamente doente. Em poucos segundos, a mão humana exercita a destruição: as torres gêmeas, um povoado, uma aldeia, um grupo de pessoas... 

 
Por último, a imagem, que não sai da retina, lembra um tsunami. 
 
Como uma vaga, em alta velocidade, um carro, qual uma onda gigantesca, foi levando de roldão tudo o que havia pela frente. 
 
Nosso tsunami chegou dias antes do outro e foi mais destruidor. 
 
Constatou-se que ele abalou o ápice dessa cadeia evolutiva. Nós, animais altamente especializados, inventores de toda a moderna tecnologia, alçados à condição de humanos, saímos diminuídos. 

Talvez haja, porém, conserto, porque não foi atingida a base. 
 
Somos ainda animais. Alguns, ainda, racionais.





Assista ao vídeo do atropelamento em massa:

 
 
 
Tsunami no Japão:
 









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Segue, abaixo, comentário recebido por e-mail:


"Sonia; O teu blog está lindo. O texto Imagem retrata com fidelidade o fato comparativo. É uma crônica impregnada de criaividade, no meu entendimento. Parabéns"

Izabel Eri Camargo







2 comentários:

Fernanda Só / Lucas Azevedo disse...

O tsunami natural no oriente foi provocado, em princípio, pela própria natureza. Uns argumentam que foi resposta às agressões humanas ao meio ambiente.

O tsunami no trânsito portoalegrense foi provocado, num primeiro momento, pela insensata atitude de um ser humano. Alguns tentam explicar a ação como uma resposta a provocações que partiram dos que foram atropelados.

Como explica a física, a toda ação há sempre uma reação oposta e de igual intensidade.

Os dois tsunamis, creio, têm sido reações. Às camadas tectônicas ou ao desequilíbrio ambiental, e ao estresse cotidiano ou ao próprio ser humano.

Para ambos os casos vale a mesma equação, cujo elemento fundamental é o próprio ser humano.

Soninha disse...

Vou me permitir discordar. Não acredito que, no primeiro caso (tsunami), o elemento fundamental seja o ser humano. Há estudos que provam que fenômenos desse tipo sempre aconteceram, bem antes de qualquer desequilíbrio promovido pelo ser humano. As camadas tectônicas de há muito movimentam-se, independentemente da ação do homem.