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segunda-feira, 27 de novembro de 2017

PROCURA-SE...



A bala, que Amanda ainda se lembra, não é a mesma da qual se fala hoje. Nem mais existe aquela que era um sucesso entre os mais jovens.

Os campos, pelos quais Amanda se deslocava até a escola, não mais existem. E os que ainda restam, afastem-se deles por precaução.

As portas e janelas, sempre receptivas a quem chegava ou passava por elas, não mais se deixam cumprimentar, pois trancadas sempre estão.

Os coletivos onde os corpos se deixavam descansar, em que até um cochilo poderia acontecer, é ocorrência improvável, hoje, pelo pisca sempre alerta.

O som do telefone que toca não pode ser atendido de pronto, a menos que se possa saber de onde provém. Ah! Nunca pronunciar a palavra “sim”?

Em compras no supermercado, carregar os pertences pessoais na mão ou no braço. Nem pensar em deixá-los descansando no carrinho de compras.

Marcar lugar no restaurante? Apenas uma chave ou algo sem importância. Bolsas na cadeira? Abandone a ideia.

Entrar em qualquer site? Sai da frente! O perigo ronda durante o tempo inteiro.

Assistir a um espetáculo ao ar livre ou em ambiente fechado, à noite? E a volta pra casa?


Mas o olhar do Snoopy, um cãozinho Shitsu, muito querido, continua o mesmo. Não mudou.

E o sabiá cantando na janela? Permanece fazendo a sua visita diária.

O sol que ilumina nossos dias ainda é o mesmo.

As nuvens continuam esbanjando criatividade em desenhos que se perdem nos tempos.

A lua ainda aparece em noites marcantes para quem se detém a admirá-la ou, sob sua luz, acercar-se com mais paixão da pessoa amada.

Os cantos das aves matutinas e vespertinas ainda estão presentes em nossos dias.

Este é um país pródigo em riquezas naturais e pleno de pessoas que o amam e que trabalham, incessantemente, pela sobrevivência em condições dignas.

E o sorriso do filho, há poucos meses parido, é a certeza de que o amanhã existe.

E o cumprimento do vizinho é a confirmação de que não estamos sós.

PROCURA-SE alguém que atenda às expectativas de que balas se tornem balas para consumo humano novamente; de que drogas voltem às farmácias como produtos usados para debelar doenças, salvando vidas; de que armas sejam restritas a quem delas tem competência para uso e dever de ofício para usá-las, quando necessário; que possamos ir com a certeza de que voltaremos.

Terras existem e os minerais mais valiosos do planeta aqui se encontram, como o nióbio. Água também não nos falta, bem como milhões de trabalhadores em todos os segmentos da sociedade: nossa maior riqueza.

PROCURA-SE alguém que não dissimule, que não minta, que não trapaceie, que não desvie indevidamente: que não roube.

Àqueles que estão envolvidos em todos os tipos de crimes, que se encontrem os mecanismos para pôr fim a este estado de desintegração moral e social em que nos debatemos.

Que os trabalhadores, letrados ou não, se apercebam da importância de observar-se um comportamento correto de cidadão para cidadão. Isto irá refletir-se na capacidade de melhor escolher quem irá dirigir esta sociedade, que a todos deve incluir.

Que a palavra, escrita ou falada, carregue o refrão da solidariedade, da responsabilidade, do respeito, da empatia e do desejo e empenho por construir uma nação digna para os que aqui estão e para os que virão. A todo aquele que aqui nascer, a exemplo do refrão de um conhecido samba, possa:
“Amar a liberdade, só cantar em Tom Maior e ter a felicidade de ver um Brasil melhor”.

PROCURA-SE esse alguém...

E a esperança é que nos alimenta nesses dias incertos.





 Tom Maior ao Vivo







sexta-feira, 17 de maio de 2013


DE PORTAS E... DE ESCADAS

 
Um pátio abaixo do nível da rua. Lá, no fundo, uma casa cor-de-rosa: a casa de infância de Rosinha. Entre o muro da casa e a rua, mais ao alto, uma escada. Poucos degraus, mas respeitados pela menininha que, vez por outra, alçava-os. Não ultrapassando o quinto degrau. Era ordem da mãe: não ultrapassar além desse degrau. A cabeça espichada e o olhar alongado divisavam a rua e o lado contrário dela. E lá, para espanto de Rosinha, as escadas existentes eram todas de descida para a rua. Do outro lado, os terrenos ficavam um pouco acima da rua.

Isso despertava certa surpresa e fazia a imaginação correr solta. Como seria morar do outro lado da rua? Quando fosse sair pelo portão do muro da casa, teria que descer a escada e não subir, como do lado em que morava.

Uma escada para subir, que Rosinha só se aventurava até o quinto degrau. Do outro lado, uma escada para descer para a rua. Que gozado!

Um dia, desrespeitando todos os avisos, subiu até o último degrau, o décimo. Um grito, porém, fez com que descesse, às pressas, até o degrau permitido. E, de lá, divisou a vizinha da tal casa, descendo os degraus do seu portão, enquanto acenava para que a menininha não atravessasse a rua. Rosinha não ia fazer isso. A mãe não vira a cena.

Nos breves instantes em que no topo permaneceu, descobriu que escadas são feitas para subir e descer. No seu quarto ano de vida, descobriu que elas, as escadas, têm grande serventia. Com o tempo, com as pessoas e com as leituras descobriu, também, que elas nos elevam ou nos rebaixam, metaforicamente falando. Tudo depende dos valores com que somos forjados. E, muitas vezes, é preciso não transigir, para nos manter íntegros na postura moral. Escadas galgadas podem nos enobrecer ou nos aviltar. E, nesse último caso, a subida pode ser desastrosa.

Há, por fim, aquela outra escada, a última, que nos conduz ao reino dos céus. Mas lá, talvez, esbarremos numa porta.

Agora, o poeta Vinícius de Moraes, em seu poema A PORTA, musicado por Toquinho, diz estar ela sempre aberta. Aqui, embaixo, ela serviria para abrir e fechar. Lá, aberta que está sempre, seria um convite a que entrássemos.

Resta saber se subimos escadas, degrau por degrau, sem eliminar, sem “derrubar” companheiros que também estão a percorrer a mesma jornada.

Escadas e portas têm inúmeras serventias.

Por aqui, as primeiras nos auxiliam a galgar obstáculos até alcançarmos a última, a que nos conduzirá àquela porta: a que está sempre aberta, para que entremos.

Será mesmo assim?

Rosinha, depois de tanta leitura e análise, quer crer que assim seja.

Amém!

 

A Porta – Vinícius de Moraes
 
 
 
Quanta poesia expressa em palavras tão singelas, mas que fazem de uma porta um ser vivo. Porque para a poesia uma escada pode ligar dois mundos, assim como uma porta pode dar-se ao luxo de estar sempre aberta.

Não esqueçamos que POESIA não tem lado certo ou errado. Ela é todos os lados. Porque ela é a expressão do ser humano em toda a sua diversidade, complexidade e também singeleza e simplicidade. Ela serve para sensibilizar, para encantar, para humanizar. Em última análise, para causar prazer estético. E isso é que nos faz crescer.

Exige, por vezes, certo treino, mas vale a pena. A tudo o leitor deverá estar atento: desde as recorrências vocabulares, as aliterações, as assonâncias, como também o ritmo, a métrica ou o verso livre. Ao comum dos leitores, porém, nada disso importa. Se todo esse trabalho de juntar palavras de forma artística contiver, ao mesmo tempo, uma possibilidade singela de apreensão do significado e uma sonoridade rítmica agradável, o leitor dessa poesia estará cativo e o poeta terá conseguido o seu intento.

A POESIA é a escada que nos conduz a patamares mais elevados como seres pensantes. Sob diversas apresentações, a tudo e a todos abarca, devolvendo-nos o produto pronto para ser consumido sem moderação.




 
 



 Chico Buarque – Ode aos Ratos (Carioca ao Vivo)
(exemplo de aliteração pela consonância – repetição do som de uma consoante)