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quinta-feira, 30 de agosto de 2018

UMA PARCERIA PRODUTIVA



Ele é vivo. Ele é audível. Ele permite escutar as batidas de um coração. Ele conduz ainda ao processo criador e, também, ao sono profundo.

Ele dá tempo ao tempo que se escoa. Imerso nele, sua audição torna-se extremamente sensível a qualquer barulho, embora distante.

Assim como aquela menininha, que ouvia o bater das folhas secas no chão de terra endurecida, a menina Rosinha, hoje, bate o sapatinho sobre o piso frio, só pra ouvir o barulhinho que dali surge.

Da mesma maneira, depois das bases da construção e do edifício erguido, vem o silêncio para que seus ocupantes desfrutem, em harmonia, a ocupação desses espaços.

É o desfrute de um silêncio que exigiu muito barulho anterior. O produto, porém, foi contabilizado como positivo.

O barulho é condição para que o silêncio se instale logo após, seja reconhecido e produza algum efeito.

Assim como a menininha que conhecia já tantos barulhos diversos e que, no silêncio daquela tarde, reconheceu o som da folhinha seca batendo contra o chão. O som de um silêncio que guarda, até hoje, na memória.

De igual forma, depois de um recreio movimentado naquela escolinha, um silêncio habilmente administrado se instala e todos se irmanam num silêncio produtivo.

Para que as bases do silêncio sejam produtivas o barulho é polo motivador e propulsor.

Mal comparando, seria o conhecido “depois da tempestade vem a bonança”.

Após um dia estafante, em que o trabalho, as ações, os projetos foram levados adiante, o descanso, assim como o silêncio, assumem uma posição primordial.

O enfrentamento diário das ações pessoais culmina com o produto dessas ações e o consequente desfrute de um descanso cujo agente em evidência é o silêncio.

Mas e quando o barulho, a gritaria e as promessas regurgitam dos candidatos, nos palanques, à procura das “bases”, aquelas que constroem efetivamente uma nação?

Em regra, qual é o produto após esta tempestade de promessas?

Será a bonança? Não!

Será o silêncio? Sim!

Pois, meus caros, este silêncio é o resultado destas tempestades verbais. Este não é um silêncio produtivo. Este é o silêncio do descompromisso, do esquecimento, da desfaçatez, do descaso, do puro interesse eleitoreiro. Desse silêncio não precisamos.

O silêncio produtivo é aquele que apresenta resultados efetivos, favorecendo os momentos de bonança àqueles que labutam diuturnamente na construção de um país. A esses sobra, neste momento, o silêncio necessário para que reflitam e busquem candidatos que se afastem do silêncio do dia seguinte às eleições e promovam o barulho necessário para que a construção das promessas se torne realidade. Um grito que faça a diferença: é o que se precisa. Um grito que promova condições para que o silêncio produtivo seja possível. Um silêncio capaz de assegurar um sono tranquilo, pois o renascer do dia estará garantido pelo pleno emprego, segurança, saúde e educação.

Basta de tempestades verbais, finalizadas por silêncios vergonhosos.

Agora, o que surpreende é o silêncio “das bases”, sempre procuradas, aduladas por todos os tipos de promessas.

Diante deste silêncio, que é o pior de todos, poderemos assistir à construção de nossa pirâmide social ruir, pois suas “bases” são manipuladas. Haverá, então, o silêncio dos inocentes levados pela catástrofe nacional. Silêncio e barulho produtivos andam juntos. Construir e usufruir são irmãos que nunca deveriam afastar-se. Um após o outro: para sempre. Assim, constrói-se uma nação.












quarta-feira, 20 de agosto de 2014

UMA MANHÃ PARA ESQUECER!


Para quem se dizia “o rei do pedaço”, foi muita humilhação amanhecer daquele jeito. Uma situação totalmente imprevisível acontecera.

A coisa toda fora mais rápida que bote de cobra. 

Lembrava que, naquela noite, tudo se acalmara bem cedo. Os viventes e também os animais acolherados junto aos galpões, no meio do feno, descansavam. Quando Epaminondas, o Epa, fazia um último reconhecimento pelo cercado, já tardiamente, para ver se nenhuma de suas preferidas por lá andava ainda a ciscar, aconteceu o inusitado. 

Quem poderia prever algo tão insólito! Não houve tempo para reação.

Parece que já o esperavam para fazer tal judiação. Logo ele, que morria de pena do Gonçalo, o Gonça, sempre às voltas com aquele incômodo a que o submetiam quando chegava qualquer visitante. O patrão Humberto até tinha razão para tal procedimento. O bicho ficava uma fera quando aparecia qualquer cara nova pela redondeza. Então, a solução era uma coleira que lhe colocavam, mantendo-o preso junto ao potreiro.

Latir raivosamente é uma coisa. Dá medo e precisa de contenção.

Agora, cantar é outra coisa. No seu caso, era a confirmação diária de seu charme e elegância quando se aproximava delas. Elas todas gostavam. E como gostavam!

Ele conhecia, melhor do que ninguém, os hábitos daquele rincão. Madrugador, que nem os pássaros da região, soltava o seu reconhecido canto, numa total demonstração de que continuava vivo e no comando.

Naquela manhã, porém, a bruxa estivera solta por lá. O interessante é que sua preocupação passava longe daquilo que aconteceu.

Andara sabendo que, há algum tempo atrás, lá pras bandas da Cidade Maravilhosa, um companheiro já tinha sido preso por ordem judicial. Tudo porque cantava a plenos pulmões durante a madrugada. A notícia não descartava a hipótese de ser o pobre despejado. Coitado do Natal! Este era o seu nome. Não sei como andará ele hoje. À época, ele cantava de oito em oito segundos, durante a madrugada, segundo depoimento do seu algoz.

Agora, Epa respeitava horários.

E, claro, não vivia em plena Copacabana, conforme seu patrão lhe segredou, depois de ler a notícia que, aliás, encontra-se registrada logo abaixo.



Mas voltando à manhã fatídica, nunca imaginou que passaria por tal situação. Ao contrário do amigo Natal, o Epa não foi preso. Pôde andar toda a manhã, desfilando a sua impotência diante de todas aquelas beldades, suas conhecidas há tanto tempo.

Uma verdadeira humilhação. Estava livre do pescoço para baixo. 

Imaginem a cena! Como cantar com a goela presa! 

Daquela manhã jamais esquecerá!

Após um tempo interminável, apareceu um cidadão todo uniformizado que o tirou, finalmente, daquele constrangimento.

Soube, dias depois, que o tal artefato tinha como lugar de uso o tornozelo. Claro, com os gambitos que tem, foi mais fácil o meliante desfazer-se da engenhoca prendendo-a ao pescoço do Epa. Um colar de fazer inveja às belezocas do quintal!

Agora, o Epaminondas acredita, firmemente, que o meliante não quis debochar de ninguém. Quis livrar-se da engenhoca e foi criativo.

O Epa, que se recupera do vexame diante das suas fãs, anda a cantar mais alto do que o de costume. Só para reforçar seu importante papel no galinheiro do seu Humberto.

Ouviu, dias atrás, seu patrão a matraquear pelo galpão umas ideias com as quais concorda.

Se a coisa está tão fácil assim, melhor é dispensar as tais tornozeleiras. Afinal, se assim fosse, ele, o galo Epaminondas, não teria sofrido todo esse vexame.

Quanto ao seu patrão? 

Bem, o Epa não tem uma resposta de pronto.

Acredita, porém, que ele e os demais estancieiros farão a diferença quando exigirem do Estado soluções eficazes e duradouras, para que o deboche não se estabeleça como prática cotidiana.



Aliás, a criadora do Epaminondas lembra o poema TECENDO A MANHÃ, de João Cabral de Melo Neto, que reforça a necessidade de união de todos, representados ali, ao invés do canto, pelos gritos dos galos, que se agrupam em torno da construção de um tecido social tão forte que ascende, por si só, em busca de soluções para o coletivo.


Pois é! Epaminondas e seus pares não sabem que serviram de mote para tão denso poema. Poema que, tornando-se concreto, poderia resolver o caso “das tornozeleiras”. Quem sabe, com o decreto de sua inutilidade e com o avanço e efetiva solução do problema carcerário no Brasil.

Quem sabe!





TECENDO A MANHÃ – poema de João Cabral de Melo Neto