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domingo, 23 de novembro de 2014

A RECEITA

Nestes tempos conturbados, difíceis, em que o corpo padece, muitas vezes, pela inércia do espírito, nada melhor do que recuar, silenciar e montar estratégias diante da avalanche de negatividade que se avoluma a cada dia.

Alguns caminhos avistam-se. Não há, porém, uma única receita salvadora. E não se está a falar de problemas de ordem econômica, social ou política. O que se busca, aqui, é salvaguardar o ânimo, a paixão, a iniciativa, o persistir, o seduzir, o amar.

São estes gatilhos que movem o ser humano. E paixão, é bom lembrar, é aquela chama que deve irromper a cada amanhecer para que nos mantenhamos vivos e atuantes pelos anos afora.

Como conservá-la acesa?

Dirigindo o olhar para tudo e todos que acrescentem, que surpreendam, que encantem a partir do nosso próprio empenho para que tal aconteça.

Perceber-se a si e ao outro como seres cativantes, portanto, prontos ao sorriso, à conversa, ao encontro, ao convívio. Com tais ingredientes o espírito dará uma resposta positiva que impulsionará o corpo para variadas atividades. Assim, trabalho poderá significar prazer.

E este é o plano. Transformar uma atividade laborativa em algo prazeroso, com uma resposta que afague o eu, que lhe dê retorno positivo no plano das emoções. Ações motivadas e gratificantes garantem sucesso como resultado de qualquer empreendimento. E, na esfera do puro prazer, a gama de situações e possibilidades é imensa para quem se aventura a tais delírios, como os poetas que concebem versos delirantes, tal como propõe Manoel de Barros em UMA DIDÁTICA DA INVENÇÃO, VII, onde descreve:



E delírio pressupõe um clima prévio de sedução. E o mesmo Manoel de Barros, em GORJEIOS, dá a receita:



Já Mário Quintana vai além quando, em POESIA E MAGIA, assegura:

A poesia de um verso não está no que diz, mas no poder encantatório das palavras que diz: um verso é uma fórmula mágica.

Como mágico deve ser o encontro entre DOIS AMANTES de Pablo Neruda, poema extraído da compilação Cem Sonetos de Amor (XLVIII-Meio-Dia), que diz:



Eternidade que a poesia persegue na reflexão de Mário Quintana sobre a palavra CRÔNICA, quando diz:

Ah, essas pequenas coisas, tão quotidianas, tão prosaicas às vezes, de que se compõe meticulosamente a tessitura de um poema... Talvez a poesia não passe de um gênero de crônica, apenas: uma espécie de crônica da eternidade.

Com certeza, todos nós buscamos ser felizes. Se não for pedir muito, quem sabe, sermos lembrados, pois o perene nos fascina, nos instiga, nos faz melhores.

Por ora, dê um tempo no tempo e viva com entusiasmo e alegria o presente. Afinal ele te prepara para o amanhã: que é logo aí.

Esta é a receita que nos fará melhores. 

Claro, tudo dependendo do nosso empenho.


E nesta busca por felicidade parceria melhor não há do que somar música e poesia. Juntas criam o cenário perfeito para o encontro amoroso: aquele que mistura o choro e o riso, que se ilumina, que não fica, nem vai, como diz a letra da música ESTADO DE POESIA de Chico César, na voz de Maria Bethânia. Aquele cenário em que a epifania do instante se eterniza: um cenário que é o próprio estado de poesia.




Estado de Poesia – Maria Bethânia 





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Comentários via Facebook:


Maria Odila Menezes: Belíssima crônica, Soninha! Parabéns!!!

Amelia Mari Passos: Um arco-iris bem no meio do dia.Sensiveis e inquietas palavras. Amei.



quarta-feira, 13 de maio de 2009

UMA HOMENAGEM

 

Sobe-se uma pequena rampa que leva ao lugar procurado por todos que dele necessitam. E todos estão meio apressados quando lá chegam.

Ao adentrar-se, como que resplandece todo o recinto. Inunda-se de luz. Exala dali, também, um perfume.

Maitê, quando lá esteve, constatou, por algum tempo, que as pessoas, ao entrarem, comentavam entre si ou murmuravam consigo mesmas expressões tipo:

-Que cheirinho bom! Que cheiro gostoso! Hum...!

As paredes revestidas de plaquetas brancas, muito limpas, demonstram o asseio com que são tratadas. De cada um dos vãos, que dividem as pequenas janelas, pendem vasos com folhagens verdadeiras, todas de uma mesma espécie, adornadas por pequenos ramos e flores artificiais, todas na cor azul e branca, combinando entre si. São dezessete vasos ao todo, espalhados por vãos e sobre as meias-paredes que dividem os espaços. Em um dos vasos, o bem central, esconde-se uma varinha de incenso. Um perfume espalha-se pelo recinto, atingindo, inclusive, alguns bancos próximos ao local. Sobre uma das paredes pende um arranjo feito com garrafas pet, na mesma tonalidade das rosas artificiais que enfeitam os vasos. No início de dezembro, essas flores são substituídas por outras de cor vermelha, a prenunciar a chegada do Natal.

É constante o cuidado com a limpeza do chão. E, ao que parece, de dois em dois dias, é feita uma lavação e escovação completa. Portanto, o ambiente é limpo e cheiroso. Quem recepciona os usuários está sempre atenta, conduzindo, informando e auxiliando quem lá chega. Veste uniforme, limpo, impecável. Do semblante brota uma luz que se despeja num sorriso.

Para quem se detém por instantes, trocando com ela algumas palavras, percebe o jeito prestativo com que é tratado. Maitê deteve-se mais do que o habitual. E pôde constatar o que é trabalhar “com amor”.

Encantada, Maitê ficou por lá conversando. Descobriu, então, que todos os enfeites (vasos, folhagens, flores, arranjo e incenso) foram comprados pela própria funcionária, com seu próprio dinheiro. No caso do incenso, a compra é constante. Mas isso é apenas um detalhe. O mais importante é seu trabalho, digamos, socioeducativo.

Assim, a comunidade indígena que circula por lá, por exemplo, (mães e seus filhos), foi aprendendo noções de higiene. Tudo graças às orientações da funcionária. Mas, quando é necessário, sabe ser “durona”. Isso acontece toda vez que certas “tribos” tentam usar o local para outros fins, que não os adequados àquele ambiente.

Agora, o principal foi o discurso da funcionária, revelador em si, e que respondeu à curiosidade de Maitê. Pois, o dito foi mais ou menos assim:

“O nosso ambiente de trabalho não é dos melhores. Recebemos todo tipo de público que, aqui, vem para fazer “suas necessidades”. Se a gente vier trabalhar suja, desleixada, não mantendo o lugar limpo, não terá vontade, incentivo de trabalhar. Ficará um ambiente “muito pesado”. E, afinal, a gente fica aqui dentro 12 horas. O nosso ambiente de trabalho deve ser constantemente limpo e a gente também deve estar limpa para poder se sentir bem. Senão, vamos nos sentir deprimidos. Sabe, todo mundo tem seus problemas. Mas temos que deixar os nossos problemas lá fora. E procurar chegar, aqui, bem. Por que é que temos que conviver com o mau cheiro, característico desses lugares? Fica muito melhor trabalhar num lugar limpo e cheiroso. Não acha?

Maitê acha que sim. Concorda, integralmente, com a postura dessa funcionária.

Pois é, está a falar-se, sabem do quê? De um banheiro existente no Parque da Redenção, em Porto Alegre. É um banheiro diferente. Ou melhor, quem ali trabalha é que faz a diferença. Maitê quer acreditar que existam outros banheiros iguais. Igualmente, acredita que existam outros funcionários semelhantes a essa dedicada trabalhadora que dignifica a classe e a Instituição a qual pertence.

De qualquer sorte, dedica a ela esta homenagem pelo Dia do Trabalho, recém- comemorado.

Dias atrás, Maitê, em suas andanças pelo Parque, esteve no referido banheiro.

Parecia que entrara em outro banheiro. Não era aquele seu conhecido. O mau cheiro, naquele dia, era característico. O chão estava todo molhado. Aquela luz, que costuma irradiar-se pelo recinto, não existia; tampouco o perfume do incenso dando as boas-vindas a quem chegasse. A funcionária presente... Bem, não falemos dela.

A homenageada, nesse dia, não se encontrava. Era seu dia de folga.







Nota: A servidora Sirlei Barreto dos Santos, a homenageada, recebeu, à época, uma medalha pelos serviços prestados ao Departamento Municipal de Limpeza Urbana. A mim coube um Diploma, expedido pelo Diretor-Geral, em agradecimento pela homenagem.