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sábado, 12 de novembro de 2016

UMA HOMENAGEM ÀQUELE QUE IMITA A VIDA...










Logo estarei de volta ao lar antigo. Trouxeram-me para passear.

Alimento-me dos olhares e de quando me pegam, me tocam.

Gosto mesmo é de quando me levam, pois troco de lar. O que, aliás, é o de que mais gosto.

Enquanto não volto ao lar antigo, vou curtindo o sol bem de perto e a lua quando, por acaso, está iluminando a praça, como nesses dias de Super Lua.

Todos os anos, saio para passear. É uma vez ao ano, são apenas alguns dias, mas vale a pena aguardar tanto tempo. Fico muito bem-instalado numa barraca. Acordo ao som dos pássaros, o que é uma bênção. Não que a casa, onde me encontro o resto do ano, seja ruim. Lá, também, sou bem-tratado. Na verdade, é onde reflito e concluo que meu nascimento é muito parecido com o daquele de cujas mãos nasço para o mundo.

Tenho, também, um tempo para vir ao mundo. Às vezes, nasço de forma rápida. Em outras, levo até bastante tempo. Muitas vezes, desistem de mim e tenho que penar uma dupla frustração: a minha e a do meu criador.

Agora, quando venho ao mundo, sou pura alegria. Também, em dose dupla. Represento o produto lapidado e muito amado de meu mestre: aquele que acreditou na materialização de um sonho, de um desejo e até mesmo de um projeto de vida.

Saio daquelas mãos calorosas para o mundo. Sou porta-voz das emoções, dos sentimentos, dos reveses e aflições, das alegrias e louvores de quem acreditou que eu poderia, materializado, tornar-me uma extensão daquele ser criador. Coloco-me na condição de um descendente daquele ser que me criou. E nessa condição, saio pelo mundo.

E vou conquistando olhares, afagos, comentários.

Dependendo dos locais onde me encontro, minha exposição é mais visível, mais próxima, mais livre, mais face a face com quem me olha.

Por isso, adoro este passeio anual pela praça que me acolheu tão bem desde o início desta minha peregrinação pela cidade. E já são mais de sessenta anos.

De lá, posso voltar para o lugar de onde saí ou ir para outro lugar desconhecido, mas já, de antemão, desejado por mim. Tenho certeza que isto, também, é o que mais deseja meu mestre/criador.

Posso ser motivo para a oferta de um presente. Às vezes, isto deixa-me apreensivo, porque já aconteceu de me jogarem num canto, ficando eu ali: abandonado.

Na maior parte das vezes, porém, sou afagado, folheado com todo o cuidado e colocado em um lugar seguro, para que eu me conserve por muitos e muitos anos. Fico eu ali para o desfrute de quem me quiser afagar.

Agora, o meu tempo de vida é insuperavelmente maior do que a do meu criador.

Não tenho tempo para acabar. Aliás, posso nunca acabar. Tenho esta vantagem em relação ao meu criador. O que, de certa forma, é uma bênção para mim, mas, também, para quem me criou.

Aquela reflexão que me gerou, aquelas ideias que me tornaram algo importante, que me transformaram num portador de possibilidades, de soluções, de conceitos, de descobertas, de plasticidade nas imagens, quando assim também me adornaram, de emoções confundindo-se com a razão pura, de sonhos, tudo aquilo que leva às gerações futuras um conhecimento do acervo inestimável de culturas as mais diversas e remotas: isto tudo sou eu. Ao fim e ao cabo, somos eu e meu criador peças importantes no processo civilizatório da humanidade.

Tenho a pretensão de ser um imitador da vida.

Nasço para ela depois de algum tempo.

Dependo, nos meus primeiros passos, de alguém que me cuide. Desejo que me olhem e me afaguem: que me queiram próximo. Posso expressar um conjunto de muitos sentimentos. Transmito muitas ideias, muitas possibilidades. Por isso, posso ser fonte do aparecimento de outros seres semelhantes que a mim se juntarão nesta diversidade de assuntos e paixões.

Confesso que tenho a autoestima elevada, pois tenho a convicção de que sempre terei alguém interessado em mim. Mesmo quando eu estiver atirado num meio-fio de calçada, alguém, que também lá estiver, pousará os olhos curiosos em mim e trará para junto daquele cobertor surrado e sujo o meu corpo feito por páginas e páginas, já meio desgastadas, mas ainda plenas de palavras e, também, muitas vezes, de imagens.

E isto foi exatamente o que meu mestre/escritor encontrou em uma rua de seu bairro.

E o corpo era um livro infantil: Alice no País das Maravilhas.

Com certeza, sua leitura serviu àquele morador de rua, nem que por um tempo curto, de alento para os sonhos daquela noite que já se iniciava. De um mundo subterrâneo, que tão bem conhece, para um País das Maravilhas que ainda espera que exista: um sonho com o qual adormece.


Agora, devo confessar que me sinto profundamente frustrado quando chega aos meus ouvidos a notícia de que tiveram contato comigo, mas nem percebi, não soube, não senti. Sou tomado por uma sensação de vazio. E se eu for jogado às nuvens? E se eu por lá permanecer para sempre? A tela fria é algo que me tem incomodado.

Nem quero mais falar disto. Fui!


Estou voltando para a praça. Afinal, esta foi apenas uma pequena digressão que me permito uma vez ao ano.

O tempo urge e tenho que aproveitar os últimos dias para me expor, para me fazer amar: para encantar.



E só para corroborar minha tese, de que possuo corpo e alma, leiam estes três pensamentos de Mário Quintana, publicados no Livro “Caderno H”, Editora Objetiva, 2013.








Ou, ainda:




Eu acrescentaria que, quando te faço sonhar ou mesmo chorar, estou expondo a minha alma, que se confunde com a do meu criador, e que reverbera na tua, leitor.

Cuidado, porém! Por ter herdado tanto do meu autor, lá pelas tantas, posso escorregar pelo lado sombrio da mentira. Nesse caso, estarei isento de culpa, pois, afinal, sou um imitador da vida...

Aliás, segundo afirmação do filósofo e escritor alemão Johann Gottfried Von Herder, nascido no século XVIII (1744-1803):

“Muitas vezes, um livro forma ou arruína um homem, por toda a vida”.

Agora, para mais ainda confirmar a minha importância, o nosso grande poeta Castro Alves, cujo legado encontra-se reunido no Livro Espumas Flutuantes, composto por 54 poemas, credita a mim, livro, uma importância relevante. Para tanto, o poeta faz uma exortação a todos aqueles que semeiam livros, quando saltam de sua pena os versos que compõem a 8ª estrofe do poema O LIVRO E A AMÉRICA, composto por 10 estrofes:




Como última reflexão, acredito que, imitando a vida, também tenho o poder de transformá-la, pois ela é mutável e feita de pessoas. E eu, livro, posso mudar uma pessoa. E pode ser para melhor... Por que não? 






A Leitura na Vida! 









domingo, 10 de maio de 2015

PRESENÇA CONSTANTE

Com chuva, com sol, não importava o tempo, aquele compromisso era cumprido com grande satisfação por mim e por quem me acompanhava.

Afinal, a leitura de livros e revistas era complementada por outra leitura: a da pauta musical.

Ler, algum tempo atrás, era percorrer com os olhos o caminho das letras, as pausas e interrogações, as reticências... Para mim era também reproduzir com o toque dos dedos as notas absorvidas pelo olhar e transformadas em sons que brindavam os ouvidos, que alimentavam o corpo e o espírito.

Ler e imaginar, ler e sonhar, ler e interpretar um texto sempre foi prazeroso.

Agora, reproduzir a pauta musical em sonoridades que convidam o próprio corpo ao movimento e que, também, carregam a imaginação pra bem longe é uma capacidade que nos oferece um sabor diferenciado ao trivial do cotidiano. Treinar o ouvido à beleza dos sons do mundo musical é um importante suporte para que enfrentemos alguns momentos de maior ou menor inquietação espiritual. Ser capaz de sentir emoção no ato de ouvir determinada melodia é bastante reconfortante. Nem é preciso entender de pauta musical. Basta aprender a sentir a beleza que brota de sonoridades as mais diversas. E isto fica por conta do momento, do tipo de música e do humor daquele que está em busca.



Retornando à caminhada, sob chuva ou sol, agradeço àquela que me acompanhou nesta jornada por longos sete anos. De ônibus, lá íamos duas vezes por semana, nos primeiros tempos, e uma vez no restante, até o local onde as aulas eram ministradas. Tempos inesquecíveis. Claro, este é apenas um trecho da caminhada. Outros existiram antes e depois deste. Alguns outros, posteriores, bem mais desafiadores.

Todos, porém, com esta presença fundamental, constante, incentivadora e colaborativa na acepção mais ampla da palavra. Além de ter sido uma guerreira de longas batalhas ao meu lado.

O meu carinho e saudade àquela que me acompanhou até quando pôde. E que, acredito, ainda olha por mim de longe. Quem sabe... Talvez, de bem perto.



Ah! Ia esquecendo...

Hoje, a sigla LER, não o verbo, representa um dos motivos de consulta ao ortopedista. A síndrome chamada Lesão de Esforço Repetitivo tem levado vários jovens, segundo informação de um médico ortopedista, a serem atendidos após sentirem dores nos dedos e pulsos pelo ato de uso repetitivo de comunicação pelo WhatsApp ou What’s Up, o que seria mais correto. Além do uso compulsivo de celulares, tablets e smartphones que, comprovadamente, geraram a chamada Dependência Digital, já considerada um transtorno mental.

Isto, porém, é assunto para outro momento.

Hoje, é o dia delas: o Dia em Homenagem às Mães. O meu agradecimento e saudades à Dona Sirene, minha mãe.

As saudades, no meu caso, revelam que a distância no tempo não interfere no sentimento de falta. Ele ainda está presente. 



Minha homenagem às Mães com a Turma do Balão Mágico cantando MINHA MÃE, letra sempre atual e que serve a todas nós mães de hoje, às futuras e, também, àquelas que já se foram.






Minha Mãe – Balão Mágico 








domingo, 23 de novembro de 2014

A RECEITA

Nestes tempos conturbados, difíceis, em que o corpo padece, muitas vezes, pela inércia do espírito, nada melhor do que recuar, silenciar e montar estratégias diante da avalanche de negatividade que se avoluma a cada dia.

Alguns caminhos avistam-se. Não há, porém, uma única receita salvadora. E não se está a falar de problemas de ordem econômica, social ou política. O que se busca, aqui, é salvaguardar o ânimo, a paixão, a iniciativa, o persistir, o seduzir, o amar.

São estes gatilhos que movem o ser humano. E paixão, é bom lembrar, é aquela chama que deve irromper a cada amanhecer para que nos mantenhamos vivos e atuantes pelos anos afora.

Como conservá-la acesa?

Dirigindo o olhar para tudo e todos que acrescentem, que surpreendam, que encantem a partir do nosso próprio empenho para que tal aconteça.

Perceber-se a si e ao outro como seres cativantes, portanto, prontos ao sorriso, à conversa, ao encontro, ao convívio. Com tais ingredientes o espírito dará uma resposta positiva que impulsionará o corpo para variadas atividades. Assim, trabalho poderá significar prazer.

E este é o plano. Transformar uma atividade laborativa em algo prazeroso, com uma resposta que afague o eu, que lhe dê retorno positivo no plano das emoções. Ações motivadas e gratificantes garantem sucesso como resultado de qualquer empreendimento. E, na esfera do puro prazer, a gama de situações e possibilidades é imensa para quem se aventura a tais delírios, como os poetas que concebem versos delirantes, tal como propõe Manoel de Barros em UMA DIDÁTICA DA INVENÇÃO, VII, onde descreve:



E delírio pressupõe um clima prévio de sedução. E o mesmo Manoel de Barros, em GORJEIOS, dá a receita:



Já Mário Quintana vai além quando, em POESIA E MAGIA, assegura:

A poesia de um verso não está no que diz, mas no poder encantatório das palavras que diz: um verso é uma fórmula mágica.

Como mágico deve ser o encontro entre DOIS AMANTES de Pablo Neruda, poema extraído da compilação Cem Sonetos de Amor (XLVIII-Meio-Dia), que diz:



Eternidade que a poesia persegue na reflexão de Mário Quintana sobre a palavra CRÔNICA, quando diz:

Ah, essas pequenas coisas, tão quotidianas, tão prosaicas às vezes, de que se compõe meticulosamente a tessitura de um poema... Talvez a poesia não passe de um gênero de crônica, apenas: uma espécie de crônica da eternidade.

Com certeza, todos nós buscamos ser felizes. Se não for pedir muito, quem sabe, sermos lembrados, pois o perene nos fascina, nos instiga, nos faz melhores.

Por ora, dê um tempo no tempo e viva com entusiasmo e alegria o presente. Afinal ele te prepara para o amanhã: que é logo aí.

Esta é a receita que nos fará melhores. 

Claro, tudo dependendo do nosso empenho.


E nesta busca por felicidade parceria melhor não há do que somar música e poesia. Juntas criam o cenário perfeito para o encontro amoroso: aquele que mistura o choro e o riso, que se ilumina, que não fica, nem vai, como diz a letra da música ESTADO DE POESIA de Chico César, na voz de Maria Bethânia. Aquele cenário em que a epifania do instante se eterniza: um cenário que é o próprio estado de poesia.




Estado de Poesia – Maria Bethânia 





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Comentários via Facebook:


Maria Odila Menezes: Belíssima crônica, Soninha! Parabéns!!!

Amelia Mari Passos: Um arco-iris bem no meio do dia.Sensiveis e inquietas palavras. Amei.



terça-feira, 4 de março de 2014

RECARGA CONCLUÍDA


 
Pode tirar da tomada. Pode soltar os tamancos. Pode esticar os pés. Relaxe, pois é hora disso.
E nesta terça-feira, depois de uns dias meio nublados, ela voltou. Num céu azul, no final da tarde, lá está ela, novamente, crescente. Apenas um fio, ainda. Da janela, sentada em uma cadeira, Bia estica o corpo para vê-la melhor.
Por quatro dias, o envolvimento foi total. Pra quem não sabe, Bia está voltando, como tantos outros, da avenida. Não só acompanhou o bloco carnavalesco de seu bairro, dando força para o pessoal como, também, e principalmente, desfilou na sua escola do coração.
Ela e outros tantos milhões de pessoas divertiram-se, sonharam, se energizaram para enfrentar as dificuldades que surgirem ao longo do ano. Nesse período, o do Carnaval, enquanto alguns curtiram o Oscar, milhares sucumbiram em guerras, ou, ainda, resistem às atrocidades que persistem nos milhares de conflitos pelo Planeta.
Por aqui também os homicídios se somaram aos latrocínios, aos assaltos, aos furtos, aos acidentes ocasionados pelo excesso de velocidade, às fraudes, aos desvios de toda a ordem, aumentando as estatísticas que amedrontam, que nos tornam, a cada dia, menos seguros.
Oxalá nunca chegue até nós a matança indiscriminada de uma guerra ou mesmo de uma revolução que se alimenta dos mais indefesos, daqueles que servem de bucha de canhão para apetites sempre discutíveis.
Assistindo a alguns programas sobre comunidades, em que o samba é o principal elo de agregação, observa-se o cunho social que ali se encontra alinhado à simples diversão de compor e cantar.
Pessoas de profissões diversas, credos diferentes, todos reunidos num abraço que preserva uma cultura, que se impôs e se mantém. Graças ao trabalho de membros dessa mesma comunidade, a cultura do samba tem perpassado gerações.
E isso é o que mantém milhares de comunidades pelo país afora agregadas e, espiritualmente, fortes para os desafios que são constantes e diários. Seres gregários precisam de outros iguais para sentirem-se mais seguros e felizes, embora as carências materiais ainda persistam.
Para os que não carecem de bens materiais nessa mesma proporção, talvez, seja difícil entender o porquê da tão grande importância de uma comunidade que se reúne para cantar, tocar, curtindo momentos de descontração. Claro, há quem descontraia, sozinho, ouvindo Beethoven.
O fato é que é imprescindível que se guardem momentos para esse recarregar de baterias. Logo ali adiante, essa energia será bastante necessária.
Lembrei-me de um cidadão português, padrinho de um casal de brasileiros, na véspera do casamento, que disse, com sotaque característico, perguntado sobre onde andavam os noivos: “estão a recarregar as baterias”.
Digressão à parte, o importante é creditar a esses encontros de samba e ao próprio Carnaval essa função de energização do corpo, da mente, dos sonhos, da vida que nos exige, a cada dia, mais força, para que a esperança se mantenha firme e forte.
E essa energia é tudo de bom!
E com ela virá a crença em dias melhores, com mais tolerância, mais fraternidade, porque o barco é um só e já está se tornando pequeno diante de tanta tecnologia. O que parece estar longe de nós pode, a qualquer momento, nos envolver de forma comprometedora à nossa sobrevivência.
Por ora, curtamos as nossas rodas de samba e o nosso Carnaval, que também é cultura.
 
Ah! A lua ainda está lá. Agora, um fio bem mais brilhante. Anoiteceu.
A RECARGA, POR ORA, ESTÁ CONCLUÍDA.



 
 
 
 
 
 

Troca de Energia/Samba de Coração - Péricles 



 

quinta-feira, 21 de março de 2013

A PRESENÇA DELA
                                 É GARANTIA DE VIDA
 
O berço cálido, de um colorido especial, convida a um espreguiçar-se para melhor acomodar-se. Já está, por bom tempo, imerso em meio líquido.

Um dia, porém, verte suas primeiras lágrimas, frente ao estranhamento pela chegada de um novo tempo. Junto às suas unem-se outras, plenas de emoção, daquela mulher maravilhada pela imagem viva a debater-se, produto de seu ventre.

Nos momentos de grande sofrimento, de profunda alegria, de rara emoção, de êxtase, lá estará ela presente. Ela está sempre pronta a marejar nossos olhos, porque a sua fonte existe em nós desde sempre. Essa fonte é quem nos sustenta desde a concepção até o último suspiro. E nossa mãe sabe disso. Cuida para que ela não nos falte. Afinal, mais de 70% do nosso corpo é constituído por ela.

Mas e aquela outra que jorra, incansavelmente, das profundezas de seu ventre, essa dádiva essencial à nossa sobrevivência, vem tendo um olhar agradecido, um olhar cuidador, um olhar que todos os filhos, já adultos, deveriam ter para com suas mães?

Antes, não cuidávamos porque a fonte parecia inesgotável. Na verdade, ela até seria. Hoje, sabemos que, senão a cuidarmos, tornar-se-á absolutamente proibida ao uso que dela fazemos, tendendo ao exaurimento. Isso significa que as próprias culturas, criações, nossos alimentos, parte da energia existente, tudo estará seriamente comprometido.

Essa mãe, fecunda e pródiga no jorro desse alimento insubstituível, tal qual o leite materno, precisa de ajuda. Com a grande diferença de que esse alimento é necessário durante todos os dias de nossa vida e não apenas nos primeiros tempos.

Quando foi instituído pela ONU, em 1992, o Dia Mundial da Água, a Mãe-Terra agradeceu. Mas, isso representou, já à época, um sinal de alerta, porque, invariavelmente, quando se cria um dia para homenagear alguém ou algo, é sinal de que é absolutamente necessário e urgente que modifiquemos a nossa visão e atuação sobre tal assunto.

Sabemos que o Planeta Terra é composto, aproximadamente, de 70% de água. Desse percentual, 97,5% concentram-se nos oceanos, 2% nas geleiras e calotas polares e 1% destina-se ao consumo. Esses 97,5% são de água salgada. Apenas 2,5% são de água doce, distribuída da seguinte forma: 29,7% nos aquíferos, 68,9% nas calotas polares, 0,5% nos rios e lagos e 0,9% em outros reservatórios (nuvens, vapor d’água). Todos esses são dados aproximados.

O Brasil detém 53% do manancial de água doce na América do Sul e o maior rio do Planeta: o Amazonas. Desse manancial 72% estão na Região Amazônica, 27% na Região Centro-Sul e 1% na Região Nordeste.

Temos ainda vasto lençol freático, também chamado de Aquífero Guarani, localizado no subsolo do Centro-Sudoeste do Brasil, com 1.2 milhões de km2, estendendo-se o restante pelo Nordeste da Argentina, Noroeste do Uruguai, Sudeste do Paraguai e nas bacias do Rio Paraná e do Chaco-Paraná.

Temos ainda o Aquífero Alter do Chão, localizado sob os Estados do Pará, Amazonas e Amapá. São reservas de importância incalculável.

Mas de nada adiantará tais reservas, se não aprendermos a cuidar da água de que dispomos. A continuar essa marcha desenfreada de poluição, estarão também poluídas as reservas quando dela necessitarmos.

O que causa estupefação é que mesmo os mais poderosos, donos das maiores fontes de poluição, não se dão conta de que os efeitos, já presentemente nocivos em regiões de maior pobreza, um dia, fatalmente, atingirão comunidades mais abastadas, onde esses melhor aquinhoados se encontram.

Ou quem sabe, pensem que isso não os atingirá, esquecendo-se dos filhos, netos, bisnetos, e por aí.

Ou quem sabe, pretendam mudar-se para outro planeta. Já estão sendo feitas incursões nesse sentido.

Ou quem sabe, esperem dos cientistas fórmulas milagrosas que despoluam, por completo, as águas dos rios, lagos e mares.

Ou quem sabe, só se interessem por si mesmos, no aqui e o agora, enquanto por aqui estiverem. O depois, a eles não interessa.

Ou quem sabe, a ganância tornou-os cegos e surdos à evidência dos fatos que estão a ocorrer. E continuam a discursar em cima do engodo, da mentira, da desfaçatez.

Ou, melhor ainda, até não discursam. Apenas agem nos subterrâneos malcheirosos de organizações ditas de desenvolvimento.

De qualquer sorte, o meu Guaíba pede socorro, o nosso Sinos, o nosso Gravataí e outros tantos.

Quem sabe ainda possamos sonhar com a despoluição de alguns conhecidos e importantes rios do nosso Brasil.

A poluição hídrica é um fato gravíssimo. Somente através de muita conscientização e mobilização da sociedade é que se poderá reverter esse quadro devastador de despejo nos mananciais hídricos de esgotos domésticos, efluentes industriais, resíduos hospitalares, agrotóxicos, etc.

Que esse dia 22 de março nos leve à reflexão e à cobrança efetiva por medidas de estancamento do despejo de contaminantes em nossas águas. Que os cidadãos comecem a exercer, já tardiamente, o papel que lhes compete, que é: cobrar das autoridades constituídas tais medidas.

Não esqueçamos que ÁGUA É VIDA, DESDE QUE ESTEJA SAUDÁVEL.

 

Agora, o fato incontestável é que essa dádiva, que nos alimenta desde sempre, serve de tema para inúmeras e belas músicas, cujas letras falando dela, da água, são pura poesia. Cassiano Ricardo, Membro da Academia Brasileira de Letras (cadeira nº 31, 1937), definia Poesia “como sendo uma ilha cercada de palavras por todos os lados”. Seria como afirmar que Poesia é o fenômeno criador, presente aí a figura do poeta, que transforma em linguagem as emoções, os impulsos ou suas reações frente a uma determinada realidade.

Segundo definição de Antônio Soares Amora, historiador literário brasileiro, “o poema é a fixação material da poesia, é a decantação formal do “estado lírico”. São as palavras, os versos e as estrofes que se dizem e se escrevem, e assim fixam e transmitem o “estado lírico” do poeta.
Então, quem sabe, um dia, possamos nos apropriar da água que nos cerca e fazê-la um verdadeiro poema, visível aos olhos, transformada, pelas ações corretas do homem, em pura poesia.

Assim como as ÁGUAS DE MARÇO que fecham nossos verões, bela canção interpretada pela saudosa dupla Tom Jobim e Elis Regina, que, também, é pura poesia.






Assista ao vídeo abaixo. Obtemos, através dele, um retrato da situação atual da água no planeta e seus prováveis e terríveis desdobramentos, se acaso medidas não forem urgentemente tomadas.



Documentário Ouro Azul: A Guerra Mundial pela Água.
 
 
Águas de Março - Tom Jobim e Elis Regina
 
 
Planeta Água - Suzy Noronha