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sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

ESPERANDO...

 
No passar dos dias, continuamos esperando.

Aquelas bombas que explodem a qualquer momento, em terras distantes, atingem os nossos olhos através das imagens recebidas.

Outras imagens estão mais próximas a nós. São aqueles seres deitados pelas ruas do bairro. Cenas constantes que chocam e nos fazem aguardar uma solução para tais situações desumanas.

Agora, aquela conhecida jovem diz cuidar por onde pisa, pois desvia das formiguinhas que circulam carregando sementinhas para o ninho.

Deveríamos nos preocupar com o outro, seja ele ser humano ou animal, pois todos estão por aqui cumprindo um papel. Aquele de fazer parte, de forma harmônica, de um todo maior de seres vivos.

Com certeza, um céu deveria cobrir, de forma límpida, aquela terra distante. Será que, por lá, a lua se faz presente? E o sol?

Não há dúvidas de que suas presenças far-se-ão visíveis. Ninguém, porém, terá paz para observá-los.

Momentos difíceis e de instabilidade que a todos nós assusta.

No bairro, a incerteza de que a caminhada possa ser interrompida por um assalto.

Alarmes que se espalham por condomínios para fazer frente às possíveis investidas de intrusos.

Mas os cuidados com os pets permanecem. O que é algo invejável, necessário e gratificante.

As máscaras protetoras contra as diversas cepas de doenças, até então desconhecidas, permanecem como requisito indispensável em meio a grupos que se encontram.

O sorriso anda escondido, pois o olhar amistoso tomou o seu lugar. O problema é não se saber quando é amistoso ou perigoso.

Os valores, reconhecidamente importantes, parecem estar em descrédito.

A praça do bairro parece ainda ser um lugar tranquilo, mas cuidado! Nunca se sabe quem está sentado próximo.

O celular é um atrativo e o seu PIX, mais ainda.

Como chegamos até aqui?

Pela modernidade? Pela inobservância dos valores morais e éticos?

Até quando?

As máquinas, que nos cercam, todas estarão nos servindo?

Elas substituíram os homens?

Será que nos servem mesmo? Se afirmativa é a resposta, então, seus manipuladores são os verdadeiros vilões. E, agora, com superpoderes, pois dispõem dessa tecnologia a seu favor.

Que tempos!

A palavra, que nos permite a comunicação, está cada vez mais confusa, dissimulada, muitas vezes, e passível de desconfiança por quem a recebe cotidianamente.

Ah! A palavra poética de um simples versejar seja, talvez, um alento nestes tempos em que a espera se tornou um desejo a alcançar-se num infinito de possibilidades.


 
 
 
 
 
 
 
 

domingo, 25 de março de 2018

A IMPORTÂNCIA DA MEMÓRIA INFANTIL




Cores guardadas na retina dos tempos em que caminhar pelos campos até a escola era uma prática diária.

Muitas cores alternavam-se pelo trajeto. Verdes, azuis e rosas misturavam-se ao cinza que já se anunciava nas construções que despontavam aqui e ali.

Cheiros, aromas e perfumes, nitidamente diferenciados, porque a poluição ainda não os havia alterado.

Sons, cantos, mugidos, vozes que se alternavam nos folguedos e nos sussurros que aproximavam seres inocentes.

Raspas da panela e restos de massa, pronta para ser cozida e virar um bolo gostoso, exercitavam o paladar para futuras degustações.

Acariciar um bichinho com a mãozinha, aprendendo o afagar como caminho para o afeto, o carinho e o amor.

Os dedinhos e os olhinhos bem próximos de um outro ser vivo, não virtual. Um ser que se podia abraçar, não importando ser um igual a si, um animalzinho ou um ursinho de lã.

Aquela foi uma época em que uma mala significava apenas aquela do avô que trazia sempre um presente para a neta querida.

Tempos em que uma jabuticaba significava apenas uma fruta silvestre, só encontrada no nosso Brasil.

Hoje, ambas adquiriram uma conotação negativa porque foram contaminadas: pela política.

Houve época em que “apagar” era sinal de que velinhas acesas enfeitavam um bolo de aniversário e deveriam ser assopradas para que se consumasse a cerimônia da passagem de idade. Hoje, a expressão ganhou o entendimento banal e cotidiano de “passar alguém desta para outra”.

Tempos atuais em que o despertar de certas comunidades são as rajadas de metralhadoras e os tiros de fuzis.

Como involuímos!

O que diria o poeta Gonçalves Dias se assistisse a tantos brasileiros rumando a Portugal. Ele que, saudoso à sua época, por lá se encontrar, poetava sobre as aves que lá gorjeavam e que não o faziam como aqui, em nosso torrão. Aqui, eram mais maviosas. Aqui, tudo era mais primoroso.

Expressou este amor à terra brasileira em seu poema Canção do Exílio, Primeiros Cantos. Poema este em que foram inseridos os versos 7º e 8º, da 2ª estrofe, com pequena modificação, no Hino Nacional Brasileiro, no trecho:

“Nossos bosques têm mais vida, nossa vida em teu seio mais amores”.

Os versos 19º e 20º da 5ª estrofe do referido poema, com leve modificação, fazem parte, também, da Canção do Expedicionário:

“Por terras que eu percorra, não permita Deus que eu morra, sem que volte para lá”.


Que saudades do Inspetor Carlos, o inesquecível Vigilante Rodoviário, primeiro seriado produzido especialmente para a televisão na América Latina. Neste seriado, o vigilante manifestava o uso adequado da força nas situações em que era demandado. A TV Tupi, à época, com este seriado enfrentou com sucesso as produções “westerns” americanas. Este seriado infanto-juvenil apresentava o vigilante rodoviário Carlos e seu companheiro chamado Lobo, um pastor alemão. Foram heróis, sem dúvida, por longo tempo, com pontuação máxima de audiência. Respeito, admiração, competência, disciplina e efetividade nas ações de controle de variados crimes.

Parece que hoje, pelo menos, a nossa Polícia Rodoviária Federal ainda mantém os mesmos valores enaltecidos naquela série tão premiada.


Os olhos infantis de hoje, por outro lado, assistem a verdadeiras séries de violência em que personagens, mesmo que sob a aparência de bonecos ou de heróis de quadrinhos, alimentam cenas violentas, em nada contribuindo com o universo infantil e mágico da fantasia.

Agora, George Orwell, com seu atualíssimo 1984, expõe, de forma clara, os tentáculos de seu Grande Irmão – o Big Brother no original inglês – vigiando os indivíduos daquela sociedade imaginária e os tornando marionetes dentro de um cenário opressor, em que as “teletelas” mantêm este Grande Irmão como chefe supremo de um poder dominante. Tudo muito semelhante aos acontecimentos atuais que nos cercam.


Oxalá consigamos manter nossos sentidos livres desses fatores desestabilizantes. Que possamos discernir, com relativa clareza, o que é nefasto e o que ainda é passível de recuperação no plano dos valores éticos e morais.

Precisamos de um plano que nos soerga dessa massa fétida em que se transformaram algumas instituições desse nosso país.

E apenas com educação de qualidade poderemos voltar a sonhar com um país que nos devolva a alegria de aqui permanecer e de, novamente, investir naqueles que ainda tem a possibilidade de construir, porque pequeninos, uma memória infantil rica em referenciais éticos e morais. O resto será decorrência.

Sonhar é preciso. Investir em Educação é obrigação.


Albert Einstein disse certa vez:

“O estudo em geral, a busca da verdade e da beleza são domínios em que nos é consentido sermos crianças toda a vida”.

Então, digo eu, busquemos a verdade com todas as interrogações possíveis. Busquemos a beleza com os olhos da memória. Busquemos o estudo onde sempre há o retorno à origem do fato: o que já é uma possibilidade de retorno ao passado, à infância. Nela encontra-se nosso salvo-conduto consentido para toda a vida.

Cultivemos a memória infantil, porque ela dispensará as armas. E, assim, o amor poderá conquistar o mundo. Mesmo que este amor apenas represente o olhar carinhoso, trazido do baú da memória, de um ursinho que até virou inspiração para o poema AQUELE OLHAR, que segue abaixo.

Não esqueçamos que a poesia e a prosa poética sobrevivem porque elas representam a nossa humanidade expressa na palavra escrita. E esta encontra eco em nossos semelhantes, o que pode significar uma terapia e um motivo para nos aprimorarmos como espécie.













quinta-feira, 14 de agosto de 2014

OLHARES RECLUSOS


Que tristeza um olhar que não se atreve a acompanhar o movimento contínuo das nuvens. Numa dança mais lenta ou num frenético bailado, é instigante acompanhar o vai e vem de tantas que povoam o céu de todos nós. E as estrelas? E a lua? Tudo ao dispor do nosso olhar desamedrontado. Um olhar que traça imagens e cenas, que cria histórias, as mais diversas, apenas pelo olhar voltado para o firmamento. 

Isto é contemplação!

Milhões de olhares, porém, não mais dispõem desta possibilidade. Embora a natureza ofereça gratuitamente esta dádiva, ela exige tempo. Mas, primordialmente, ela exige paz. E é disto que estamos a tratar. Paz para assistir a este espetáculo diário. Paz para desfrutar de um pôr do sol, de uma chuva mansa, ou mesmo de trovoadas ameaçadoras. Essas últimas, lembrando-nos apenas que são resmungos de quem se zangou e está a arrastar cadeiras no chão do céu.

De milhões de olhares, porém, foi sonegado este direito: o direito de encantar-se, de maravilhar-se com o espetáculo da mãe Natureza.

Os seus olhares procuram, ao contrário, desviar daquilo que lhes reserva o céu. Este passou a ser uma ameaça constante e implacável. O melhor a fazer é não olhar. É fechar o olhar ao belo e esgueirar-se por caminhos tortuosos, por túneis ou entre escombros. O olhar, pelo menos, estará a salvo de assistir a chegada da tragédia que vem pelo ar, já que o corpo aguarda o desfecho de mais um ataque.

Como se pode permanecer por tanto tempo sob tantas tragédias!

O que fazem os pacifistas?

Pela palavra e pela música tem-se tentado acordar a espécie, que se diz civilizada, para um novo momento de sua evolução.

Alguns desses pacifistas foram, momentaneamente, artífices de movimentos que mudaram sociedades retrógradas. Algumas conquistas. Poucas diante do tamanho do desafio e dos senhores que vivem das guerras.

Luiz Coronel, consagrado poeta gaúcho, patrono da 59ª Feira do Livro de Porto Alegre, ocorrida em 2012, em seu poema OS PACIFISTAS, transcrito, ao final da crônica, na íntegra, em sua 5ª estrofe escreveu:


De gravata ou turbante,
Os padeiros da morte
Sovam seus pães de pólvora.


Daniel Barenboim, famoso regente, argentino de nascimento e de origem judaica, criou, em 1999, a West-Eastern Divan Orchestra, juntamente com o intelectual palestino Edward Saïd, já falecido, e com Bernd Kauffmann, responsável pelo Festival das Artes de Weimar (Alemanha), justamente no ano em que a cidade foi escolhida como a Capital Europeia da Cultura. Esta orquestra é composta por jovens músicos do Médio Oriente, entre eles israelitas e palestinos. Também há iranianos, sírios, libaneses, jordanianos, egípcios e espanhóis. A orquestra tem sua base em Sevilha, na Espanha.

Sem nos atermos às declarações de Barenboim sobre o conflito entre israelenses e palestinos, vê-se com clareza o objetivo da orquestra: o de promover o diálogo e a paz entre judeus e não judeus do Oriente Médio.

O nome da orquestra foi inspirado na antologia de poemas de Johann Wolfgang von Goethe. Na conhecida composição lírica chamada West-Östlicher Divan, ou o Divã Ocidental-Oriental (1819), Goethe procurou conciliar a rica tradição poético-árabe com elementos subjetivos europeus da época. Segundo estudiosos, Goethe começou a estudar árabe quando já tinha 60 anos, tendo, ao longo de sua vida, sempre demonstrado interesse pelas culturas de outros países.

Embora tenha ocorrido um agravamento do conflito entre Israel e Palestina, os jovens músicos continuam a se reunir todos os anos em Sevilha. Cidade que sempre foi exemplo de convivência pacífica entre judeus, muçulmanos e cristãos.

Que belo exemplo! Que belo trabalho!

Sim, é possível unir diferentes povos pela música e, digo eu, pela palavra poética, não comprometida politicamente. Apenas comprometida com aquilo que expressa os amores, as dúvidas existenciais, as belezas postas a cada amanhecer, os sonhos projetados a cada entardecer, os propósitos e desafios que se deitam com cada um de nós. Tudo, enfim, que nos depure e nos aprimore como seres em constante evolução. A busca pela união entre os indivíduos, independentemente de etnias, crenças, culturas ou religiões, é o que deveria nortear os esforços dos povos que habitam este já tão pequeno Planeta.



Que tristeza um olhar que não se aventura, que não sonha, que está preso aos horrores da guerra.

Em algumas partes do mundo, o olhar não está mais solto. Tiraram-lhe a liberdade de vagar pelos céus, pela vastidão do universo. O seu alimento primordial, que são as imagens, estas lhe são servidas, a cada dia, mais sombrias, mais escuras, mais putrefatas, de difícil absorção, de impossível digestão.

Carlos Drummond de Andrade, nostalgicamente, escreveu LEMBRANÇA DO MUNDO ANTIGO, cujos 8º, 9º e 10º versos dizem:

As crianças olhavam para o céu: não era proibido.
A boca, o nariz, os olhos estavam abertos. Não havia perigo.
Os perigos que Clara temia eram a gripe, o calor, os insetos.


O poema, na íntegra, transcrito abaixo, faz referência ao sentimento de insegurança trazido pelos tempos de guerra.

Sob o peso do iminente ataque que sobrevém a todo instante, o olhar pende para baixo. Perde-se ele por entre escombros, por entre corpos, por entre sonhos que recém desabrochavam. Nem mais os abrigos suportam tamanha tragédia.

Para tanto horror, criaram a trégua humanitária. Uma verdadeira falácia. É preciso que existam algumas horas de alívio, em que os ainda sobreviventes recebam alimentos para não morrer tão logo. É preciso ainda ter gente lá embaixo, para alimentar a sanha de quem não se cansa de matar.

Com tanto horror acontecendo, em tantos lugares ao mesmo tempo, acredito que a Superlua, espetáculo que a Natureza nos brinda de tempos em tempos, brilhou solitária no firmamento sobre aqueles distantes campos de guerra. Sem plateia, sem olhares a reverenciá-la. Olhares que se encontram reclusos no círculo de horrores que se instalou ao seu redor. Olhares que não mais ousam erguer-se. Pelo menos, por hora.

Quem sabe na próxima Superlua?





Poema OS PACIFISTAS de Luiz Coronel


Poema LEMBRANÇA DO MUNDO ANTIGO de Carlos Drummond de Andrade


Música para a Paz 


9ª Sinfonia de Beethoven – 4º Movimento – Daniel Barenboim e West-Eastern Divan Orchestra