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terça-feira, 8 de março de 2016

É A LAMA... É A LAMA...



Abre os olhos. Como última imagem, que sobra do sonho, a lama escura se espalha em frente da protagonista que se depara com a impossibilidade de transpô-la. Nem sabe de qual sonho se originou. A lembrança do sonho foi-se, mas a lama, como última imagem, permaneceu: malcheirosa, escura, pegajosa.

Durante o café, busca no expresso sorvido às pressas, a cor escurecida que tanto impactou o olhar ainda sonolento, mas já questionador dos motivos daquela última cena.

Vem, à mente, a provável resposta para tal imagem.

Sim, tem ouvido, lido e, especialmente, visto muitas notícias.

Onde? Na televisão.

Dá de ombros e vai em frente.



Sim, Joice está certa.

E isto é ruim? Claro que não. Estamos vivos e devemos estar a par do que nos cerca e daquilo que, embora longe, nos afeta de forma profunda, por vezes.


A lama, originada do rompimento de barragens, espalha-se por córregos, rios, deixando resíduos tóxicos ao longo das comunidades ribeirinhas, ultrapassando municípios e estados, chegando ao mar. Isto é de extrema gravidade para as pessoas e o ecossistema.

Os prejuízos são consideráveis e a recuperação sem data marcada para acontecer.

É a lama...

Como grave é o relato a mim feito por uma cidadã, trabalhadora, que reside no Município de Esteio, abastecido pela água oriunda do Rio dos Sinos.

Disse-me ela que a água que sai da torneira é escura e malcheirosa, fedida mesmo. O filtro d’água não dá conta de limpá-la. Tentou, então, fervê-la. Não adiantou, pois o cheiro permaneceu. Então, a solução é a compra de água mineral pela população. Para o banho, porém, a água é aquela mesma. E a pele? A pele arde. A água é quase uma lama. Pobre rio que recebe todo o lixo tóxico oriundo de empresas que nele fazem descarte de seus produtos. Pobre população!


A lama virtual subjaz a esta lama real. Aquela que não se vê, mas que parece tomar conta de tudo e de todos, desaguando em todas as lamas reais que se está a assistir.

Joice até já sonha com esta lama. Aquela que a impede, pelo menos no sonho, de prosseguir. Mas que tem o condão de fazê-la refletir. E reflexão é o de que precisamos.

Para tanto, necessário faz-se conversar, dialogar, constatar, tomar decisões e agir. Reflexão, porém, exige informação, leitura, conversa direta com o outro e não através da tela. Não conseguimos mais refletir, pois este exercício requer silêncio num primeiro momento. Depois, conversa face a face com o outro, onde os sentimentos são expressos e sentidos pelo brilho dos olhos dos interlocutores.

A ferramenta digital deveria ser um acessório em qualquer situação. Ela pode até mostrar a lama. Não pode, porém, tomar decisões. Ela é uma máquina, é um objeto: não um ser humano.

Ela, a lama moral, combate-se internamente pela Ética e pelos valores humanos que dignificam este ser. Esta lama será destruída se vingar a empatia com o outro, a solidariedade, a necessidade de justiça social, que nos torna únicos e semelhantes ao mesmo tempo.


Agora, há quem pergunte de onde saiu a jiboia encontrada num poste, no Distrito Federal, neste último domingo.

Ela não vive na lama. Como será que chegou até lá?

Acho que ouviu que uma jararaca anda por lá. Aliás, que, também, não vive na lama, diga-se de passagem.

Bem, acho melhor deixar esta história de lama prá lá.

Quem entende disso é, poeticamente, o nosso Antonio Carlos Jobim com a sua conhecida “Águas de Março”.

Aquela lama cantada é a natural e faz, portanto, parte do ciclo natural da vida e das coisas.

Todas as outras são abomináveis.



Ah! Aquela música?
 

Inesquecível!






Águas de Março com Elis Regina e Tom Jobim

 





segunda-feira, 7 de setembro de 2015

A VIAGEM


Um dia, aquela desastrada viagem teve um final feliz. E a crônica recebeu o nome de O RETORNO DOS DESGARRADOS. Começava, assim:

Nada como dar uma esticada até o Nordeste, não é?

Pois os jovenzinhos saíram, como sempre fazem, em busca de alimento. Só que as águas estavam tão quentinhas, e tão repletas de comida, que ficou difícil resistir à tentação de esticar mais um pouquinho a viagem anual que realizam.

Aqueles mais afoitos acabaram morrendo lá pras bandas de Sergipe e do Espírito Santo. Mas, os que permaneceram pela Bahia, foram mais sortudos. Eles bem que quiseram deixá-la, mas a Bahia com seu encanto, seu axé, seu mar piscoso, não os deixou sair.

E lá ficaram eles: brincando em suas águas. Dizem que foram vistos. Denunciada sua presença, foram capturados com toda a garantia de sua integridade física. Após, embarcados em avião da FAB num voo de Salvador até Pelotas. Aqui, no Estado, foram acomodados em um caminhão refrigerado e levados ao Centro de Recuperação de Animais Marinhos (CRAM), em Rio Grande. Nesse local, após tratamento, foram liberados para voltarem ao lar: as colônias do Sul da Argentina (Patagônia) e do Chile. A soltura dos animais no oceano teve o apoio da Petrobrás e do Exército.

Lá, então, deram, com certeza, continuidade à espécie. 

Que coisa maravilhosa! Perder-se e ter gente sempre atenta a guiá-los de novo ao lar. Gente que se preocupa com os animais.

Pois, os pinguins-de-magalhães voltaram para casa.

Uma viagem que teve um final feliz.

Agora, na viagem em que o mar jogou à praia aquele ser absolutamente indefeso, o final trágico marcou, a ferro e fogo, para sempre, a visão e a consciência de todos os que assistiram à cena. A imagem é por demais impactante, chocante, de profunda emoção e tristeza.

Pátrias deixadas para trás por absoluta impossibilidade de sobrevivência de seus cidadãos. Cidades destruídas, terras arrasadas por revoluções em nome de ideologias, religiões e etnias que se digladiam. Regiões espoliadas de suas riquezas naturais, bem antes, pelos detentores do poder local em arranjos espúrios com outras grandes potências. Venda de armas, que alimentam o terrorismo, encontram nestas áreas terreno fértil. Resta aos seus cidadãos o inquestionável direito de buscarem a sobrevivência a qualquer preço, sob qualquer sacrifício. Seguem, porém, reféns de abjetos “mercadores de sonhos” que os empilham em pequenas embarcações, onde até o ar que respiram será cobrado. Seres vis que são a escória dessa espécie, chamada humana.

Aqueles, que conseguirem chegar ao destino, sofrerão toda a série de dificuldades. Porém, estarão vivos, sobreviverão. Novas terras, novas línguas, novos costumes, novas culturas serão alguns dos desafios que enfrentarão. 

A viagem terá valido a pena, acredita-se.

Ah! Os países que os acolherem não estarão fazendo favor algum. Muitas destas terras, de onde vieram estes milhares de refugiados, foram espoliadas de suas riquezas naturais pelas grandes nações que, agora, os acolhem.



Talvez o problema seja mais complexo que o dos pinguins. No nosso caso, jogá-los ao mar, depois de tratamento, próximo à sua região de origem, foi o bastante. Eles viraram-se sozinhos. E, em suas colônias, sabem proteger-se dos demais predadores. Afinal, podem contar com os da sua espécie.


Parece que não é o que acontece conosco. Somos predadores de nós mesmos.

Precisamos, na verdade, aprender mais com os animais.

Já imaginaram? Se nós, humanos, colocássemos todo o nosso potencial construtivo e de solidariedade em favor dos da nossa espécie?

Infelizmente, o acolhimento dos pinguins, tanto por nós, quanto pelos de sua espécie, causa inveja!

A viagem do pequeno Aylan Kurdi não se completou. Assim como, também, a de seu irmão e sua mãe.

A imagem não se apagará dos nossos olhos.

Também não se apagará a constatação da necessidade de que olhemos com mais humanidade para o nosso semelhante.

Aylan buscava com sua família melhores condições de vida. O seu país de origem não lhe propiciou este direito inalienável de qualquer ser humano.

Da mesma forma, o jovem morto por uma bala perdida ou aquele que jaz inerme de fome e frio são credores do Estado por mais segurança, educação e saúde. Segurança para que possam ir e vir; educação de qualidade para que possam igualar-se aos melhor aquinhoados e saúde para que a geração que os suceda possa levar a frente o projeto de um país grande por natureza, mas, também, de homens dignos e honrados por opção.



Por ora, a nossa viagem, pelos meandros da vida, continua.

A de Aylan, mal tinha começado.

Terminou nas areias de uma praia distante. Seu corpo, entregue pelo mar, repousa, agora, na sua pátria: aquela que não lhe soube dar amparo, que não cumpriu seu papel.

Assim como tantas outras, que conhecemos tão bem.


Que o poema AS FLORES, de Ígor Begossi, aluno da 5ª série da Escola Estadual de Ensino Fundamental Reinaldo Cherubini, do Município de Nova Prata/RS, algum dia possa confirmar-se pela prática efetiva e planetária da generosidade do ser humano para com o seu semelhante.





Por ora, um TOQUE DE SILÊNCIO é o que cabe, o que resta a nós todos.


No vídeo abaixo, descobre-se a inutilidade das guerras na própria história da descoberta da letra deste hino ao silêncio: um verdadeiro pranto a todos aqueles que tombam lutando e àqueles que nem ainda viveram o suficiente para entenderem os horrores da guerra, sendo já vítimas.






Toque do Silêncio





Em tempo:

O RETORNO DOS DESGARRADOS – crônica publicada em 06/10/08.

- Pinguins resgatados na Bahia...













sábado, 8 de maio de 2010


 

NO PRINCÍPIO, ERA A COR


Elaboração de texto sobre imagens obtidas com pingos de tinta jogados, ao acaso, sobre folha de papel em branco. Ênfase no aspecto da "cor", tendo como tema o título acima.


Uma lágrima escorre. A imagem enternece, comove. Despede-se Misha do público. Sem palavras, só uma imagem colorida. A imagem de um ursinho, símbolo dos Jogos Olímpicos de 1980.

Cor, imagem e movimento em perfeita sincronia, alcançando-se uma comunicação perfeita.

Desvio o olhar da tela e vejo, através da vidraça, um céu que se modificou. Está plúmbeo, ameaçador. Pela manhã, estivera tão azul, tão convidativo para uma caminhada. Porém, eu queria assistir ao encerramento dos jogos. Por isso, fiquei em casa. Perdi os raios matutinos, de um sol meio avermelhado, a prenunciar um belo dia. Quisera ter podido caminhar entre o verde do parque, pisando nos raios de sol. Uma sombra de mulher caminhando entre árvores e clareiras, num revezamento de claros e escuros.

Tudo isso veio à mente a partir de imagens construídas com as tintas lançadas, ao acaso, sobre folha em branco, formando um quadro que se poderia chamar de “O Carnaval dos Animais”. Passo a descrevê-lo como se fosse pura animação.


A bicharada toda presente, toda em festa. Concentro-me num par de olhos verdes que se juntam a outro par. São dois gatinhos com as patinhas erguidas a segurar um belo arco, todo cor-de-rosa, como numa performance circense. Acompanhados estão por outros dois animaizinhos com olhinhos de um azul profundo, e de orelhas bem alertas. Brincam como os demais.

E como nesse cenário, terra, água e ar se misturam, vejo um golfinho e também um peixinho a circularem por entre os convivas, dando um show particular.

Sobrepairando a todos, um lindo pássaro com uma envergadura de asas invejável. Seus voos rasantes abrilhantam ainda mais essa bela festa.

E nessa alucinada comemoração, onde tudo vale, até uma garrafa de champanhe, com gargalo e rolha por estourar, aparece no meio da alegoria.

E nada melhor que, no auge da festa, fogos de artifício lancem uma chuva colorida sobre todos os convidados, coroando tão feliz encontro.

Quanto ao champanhe, não se assustem. Foi bebido com moderação por todos que, das arquibancadas, assistiam, como eu, a esse Carnaval dos Animais.


As cores do espetáculo estão guardadas ainda na retina. Da mesma forma, a lágrima de Misha, as nuances do sol sobre o passeio do parque, aquela noite estrelada, o verde-azulado do mar de Maceió, o amarelado das folhas caídas sobre o antigo pátio, até mesmo o tom rosa do antigo berço. Tudo absorvido sempre com lentes coloridas, para que tudo se ilumine com as cores da Criação.

Pois, no princípio, era a cor.