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domingo, 7 de junho de 2020

COMO ESQUECER!




Aquela mãozinha, que se aninhava no peito buscando proteção, Aninha apenas imagina ter sido sua primeira vez. As outras imagens de suas mãozinhas guarda-as na memória visual, nítidas, pois fazem parte de suas ações ao longo da existência.

O dedinho polegar de sua mão direita, que lhe servia como bico, fazia parte da cena junto a um travesseirinho, em que se agarrava e mantinha próximo ao nariz. Esta cena lhe acompanhou por muitos e muitos anos.

Aquelas mãozinhas, bem mais tarde, percorriam céleres o teclado do instrumento que lhe acompanhou por mais de duas décadas. Eram exercícios e mais exercícios que sempre levavam a um aprimoramento na execução de belas composições.

O giz que gostava de usar com a mãozinha sobre um quadro negro, fingindo ser professora. Aquela cena que, após alguns anos, se tornou realidade como professora em várias escolas.

Aquela mão, já mais crescida, que lembra ter fechado o portão de sua casa pela última vez. A mesma mão que escreveu uma carta de despedida, dando as razões da sua atitude.

Aquelas mãos que, também, executaram tarefas domésticas, necessárias ao viver cotidiano.

Foram aquelas mãos que se uniram, prostradas, em agradecimento a ELE, pedindo força para o enfrentamento dos dias que se seguiram.

Todas essas imagens pertencem a um viver que Aninha considera pleno.

Mãos que aninharam, protegeram e acariciaram o fruto do seu amor. Um amor que se tornou cúmplice de momentos amorosos: próprios daqueles que se amam.

Mãos que, também, abriram portas e janelas para aqueles que, juntos, estavam. E que continua a abri-las para os que se encontram, ainda, ao seu lado.

Mãos que muito cumprimentou, acenou e louvou. E ainda o faz: em companhia ou na solidão dos dias.

Mãos que se despediram com um terno toque sobre quem não mais podia despedir-se.

Mãos que jogam letras sobre a folha em branco, para depois juntá-las em frases que possam transformar-se em imagens aos olhos de quem as lê.

Quantos usos podem ter as mãos!

Mãos daqueles que pesquisam, experenciam fórmulas, produtos, medicamentos. Mãos daqueles que curam, que examinam, que operam, que educam, que redigem, que pintam, que constroem.

Mãos daqueles que oram, que abençoam. Poder-se-ia enumerar, por um longo tempo, tudo aquilo que as mãos oferecem a nós, seus portadores.

Aninha lembrou-se do poema que segue. Ele serve para exemplificar que, até em devaneio, nossas mãos têm serventia.



As mãos nos servem da maneira que nós permitirmos que nossos sentimentos sejam dominantes: sejam eles bons ou maus.

E, quando a súplica não é suficiente para que o bom sentimento aflore, tem-se a barbárie instalada.

Assim, diante daquela cena não mais se poderá respirar como antes: nenhum de nós. Tampouco, calar.

Mãos que não cumpriram a finalidade para a qual foram criadas, porque mataram.

E as outras nem puderam reagir para a própria defesa, porque imobilizadas.

Imagens que pertencem ao nosso mundo e que não se conseguirá esquecê-las. 

COMO ESQUECER!






quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

ERA APENAS UM INTERVALO...


E os intervalos acompanham nossa caminhada dia e noite. Sejam eles relativos a espaços, que nos separam de algum lugar, ou a intervalos de tempo que medeiam entre dois momentos. Estamos presos a eles de forma inexorável. Eles podem ser rápidos, longos ou eternos.

Um tempo de nove meses para um abrir-se para a vida. Um antes, no aconchego do ventre materno; outro, depois, já no colo macio daquela que nos gerou. Um intervalo de tempo muito aguardado, acredito eu, pelos seres envolvidos neste ato criador. Intercalam-se aqui tempo e espaço. Acho mesmo que andam de braços dados. São inseparáveis.

Quando a mãozinha, tempos depois, dá um tchau da janela daquela van escolar, ainda assim temos a figura do espaço e tempo a nos conduzir. Tempo para ir e voltar da escolinha. Este pequeno ser já convive com um novo espaço, onde descobrirá um universo diferente do seu habitual. Já consciente, também, do tempo que terá que aguardar para chegar o intervalo. Ele sempre tão aguardado, pois será o tempo das brincadeiras no pátio. Os intervalos já merecerão sua atenção. Tempos e espaços que farão parte dos intervalos que se somarão ao longo da sua caminhada. Espaços que se modificarão, tempos que se somarão, mas que, ambos, estarão garantidos durante a sua jornada como ser humano.

Aos poucos, aprenderá que aquele intervalo de tempo, antes do anoitecer, possibilita que seus olhos iluminem-se com um sol se pondo no horizonte. Ou, que aquele espaço junto à escola poderá, no final das aulas, ser seu lugar de sonhos ao ocupar a quadra de esportes, batendo uma bola com os colegas.

Tempo e espaço juntos fazendo uma parceria que pode ser criativa e solo fértil para a concretização de sonhos. Tudo fluindo de forma suave, previamente elaborada e ajustada para aquele momento.

O problema é quando há a interrupção abrupta deste tempo e espaço. Um intervalo cujo resultado não seria o esperado.

Isto ocorre quando o infortúnio entra porta adentro: sem bater, sem pedir licença. Ou quando este intervalo não renasce num novo tempo e num novo espaço, por conta de uma tragédia por absoluta incúria e irresponsabilidade.

Um intervalo cujas mãos foram causadoras de sua permanência eterna. Orientações errôneas, vistorias e avaliações não consideradas, laudos descumpridos, todos esses elementos podem ser a causa deste intervalo que se tornou eterno.

Menos Justiça, menos Informação, menos Sonhos: este é o resultado de três tragédias que comoveram a nação brasileira.

O Monólogo das Mãos, de Michel Montaigne, recitado por Bibi Ferreira, afirma que elas, as mãos, podem servir para o bem ou para o mal.

Para Bibi, no alto de seus 96 anos, esta eternização do intervalo era previsível. Nem por isto deixa de ser uma perda. E que perda!

Acredito, porém, que seus sonhos foram realizados.

Diferentemente dos meninos cujo intervalo era para dormirem e sonharem.

Não acordaram, porém. E era apenas para ser um intervalo...






Monólogo das Mãos - Bibi Ferreira





sábado, 19 de maio de 2018

MÃOS... MENTES...

Maria Helena assistia àquela cena diariamente. Sempre que passava pela frente daquele estabelecimento bancário, sentado no chão, junto à grade do banco, aquele jovem lá estava com a mão estendida pedindo “um troco”. Algo deprimente.

Maria Helena achava que poderia tentar dar um encaminhamento mais digno para aquele ser humano ali jogado na calçada.

Um dia, resolveu parar para conversar.

E a conversa assim transcorreu:

- Oi, tudo bem?

- Tudo.

- Eu tenho uma ideia e vou te dizer qual é.

- Ah?

- A gente podia arranjar um emprego pra ti.

- Eu não sei fazer nada; só sei mexer em latinha.

-Pois, é isto aí mesmo: uma fábrica de processamento de resíduos sólidos, de latas... Que tal?

 
E Maria Helena continuou descrevendo as possibilidades que ele teria. Com espanto, porém, viu quando o jovem olhou para ela e disse:

-Eu não quero trabalhar.

Maria Helena, inconformada, continuou a discorrer sobre os benefícios que isso traria para ele, quando, novamente, foi interrompida pela frase:

-Eu não quero mais ouvir.

Diante dessa afirmação, dita pausadamente, Maria Helena foi-se rua afora, cabisbaixa.

Atualmente, passados uns dois anos, continua a encontrá-lo naquele lugar, tão seu conhecido, bem como em outros do bairro. Por vezes, está estirado na calçada a dormir. Quando acordado, senta-se junto aos muros.

E as suas MÃOS?

O que fazem?

Estendidas: pedem.

Recolhidas em concha: cheiram. Às vezes, fumam.



Giuseppe Artidoro Ghiaroni, poeta, radialista e jornalista carioca, escreveu o MONÓLOGO DAS MÃOS. Nele, o autor aponta inúmeras funções que nossas mãos exercem ao longo da vida.

Na realidade, depende de nós o bom ou o mau uso delas.

No caso do jovem adulto, elas são usadas para pedir, para drogar-se e não trabalhar.


Bem diferente do exemplo trazido em matéria publicada na data de 10 de maio, no jornal Zero Hora, página 22. Temos ali um exemplo de alguém que foi catador de latinhas, mas que virou empresário. Geraldo Rufino, 56 anos, foi palestrante na Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul). Expôs sua experiência de vida à plateia. Suas MÃOS, sem dúvida, foram usadas de forma inteligente. Carregava tudo o que poderia servir a si e aos outros. “O lixão, disse ele, foi um lugar “maravilhoso”. Lá, encontrava roupas, sapatos e brinquedos, além das latinhas. Eram 12 horas por dia recolhendo material que vendia para a reciclagem”.

Este é apenas um trecho do seu relato. A matéria completa pode ser vista ao final desta crônica.

E as MÃOS de Rufino?

Foram usadas para procurar, selecionar, carregar, dividir: para trabalhar.

E, assim, foi conduzindo a sua necessidade, atingindo momentos futuros que, com sua persistência e criatividade, lhe retribuíram com o sucesso de ser, hoje, um empresário. A sua frase “As pessoas agradecem muito pouco, lamentam muito e terceirizam a culpa”, revela a sua postura de um ser humano que atingiu o que buscava alcançar. Sermos construtivos, criativos, como digo eu, e responsáveis, como afirmou ele, pela própria vida, deveria ser um objetivo comum a todos.

Ah! Imaginem só!

Está feliz com o país que tem.


Não abordou a violência que grassa pelo país. Não era este o propósito de sua palestra.

Ao que parece transita, com otimismo, pela cidade em que se estabeleceu.

Cabe aos governantes resolverem o problema da violência.

E as MÃOS destes? Como estarão? Prometendo, desviando, destruindo, abandonando, iludindo, subtraindo, evadindo, entregando... (?)

Partamos para o construir, o encorajar, o trabalhar, o escrever, o reivindicar, o calcular, o exaltar, o aplaudir, o confessar, o exigir, o recusar, o condenar ou absolver, o reconciliar: verbos que constam do Primeiro Parágrafo do MONÓLOGO DAS MÃOS.

Tudo dependendo da necessidade do momento, em que se está vivendo, e dos atores envolvidos nesta nossa sociedade.

Para Rufino o Brasil é fantástico.

Concordo com ele.

Tudo depende de nós.


Agora, será que todos aqueles que estão se “dando bem”, também, não terão eles as MÃOS poluídas por algum desvio?

Maria Helena sempre se questiona. Com leis tão confusas, feitas com lacunas imensas, com meandros que exigem incursões malabarísticas, com exegeses (palavra bonita!) ou interpretações variadas: o que esperar?
MENTES esclarecidas são indispensáveis na avaliação do que nos cerca. Que elas se multipliquem e, insubmissas, não se conformem com a situação vigente.

Estarmos de prontidão para tanto é a missão que a nós todos cabe levar adiante.

Maria Helena permanece com o otimismo e o empreendedorismo de Geraldo Rufino: um exemplo a todos quantos desistem no meio da caminhada. Ou, como o jovem adulto sentado na calçada, nem ao menos tentam.






Fonte: Jornal Zero Hora de 10 de maio de 2018.