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quarta-feira, 26 de março de 2014

UMA BUSCA DIÁRIA


 
São as águas de março fechando o verão...
 
Tristeza não tem fim
Felicidade, sim...
A felicidade é como a gota de orvalho numa pétala de flor.
Brilha tranquila
Depois de leve oscila.
E cai como uma lágrima de amor.
 
Quanta poesia!
 
E de quanta alegria é feita uma cidade que carrega em seu nome o adjetivo alegre?
 
 
São várias as datas comemorativas reunidas num pequeno par de dias do mês de março.
Como reuni-las e escrever sobre elas?
Pois, pensando bem, todas se encontram interligadas.
Selecionando uma delas como fonte para as outras, talvez, consigamos entendê-las no seu conjunto.
Destaquemos, então, aquela que se convencionou comemorar no dia 20 de março: a tão desejada FELICIDADE.
Ela que é breve como as nuvens, que se desfazem e se refazem a todo o instante. Mantê-la requer a capacidade de somar momentos ao longo do dia. Instantes em que o olhar acompanha, ao entardecer, um sol entre nuvens, que empresta nuances quase indescritíveis, tal a grandeza da beleza. Um poeta, porém, sabe captá-las. E isso é poesia. E é, também, desfrutar instantes de encantamento. Ou, ainda, quando os acordes daquela canção fazem-nos sonhar acordados. Quem sabe, quando sorvemos um bom chimarrão e nos perdemos em pensamentos durante minutos enriquecedores. E isso também um poeta reconhece como possibilidade criativa.
E aqueles outros instantes em que a água, escorrendo pelo corpo, propicia imagens de puro desapego, deixando deslizar pelo ralo tudo o que é além de nós. E o perfume do sabonete? E logo, logo, aquela toalha felpuda nos envolvendo, que passará a sensação de aconchego e proteção. Esses também são momentos ricos, que se somam a tantos outros, e que acontecem cotidianamente.
E que tal o abraço de um filho? Ou de um parceiro querido?
E quem sabe assistir ao pôr do sol, tão decantado, da nossa Porto Alegre?
Talvez, uma boa conversa com os amigos?
Ir somando esses momentos é a receita para a tal felicidade.
Claro que ter saúde é fundamental, bem como usufruir daquela que é a fonte de vida: a água benfazeja. Ela que nos acompanha desde a concepção e que é essencial à nossa sobrevivência.
A estação que se aproxima, o Outono, a exemplo do que ocorre com o nosso banho diário, traz um espetáculo de desapego da natureza. O tapete de folhas que cobre os parques nos dá esse sinal de renovação.
E renovação é uma palavra chave para a felicidade. Essa tal felicidade tem que ter instantes renovados, para que se mantenha constante. Ela permeia todo o nosso cotidiano. Observar o que de bom existe, ter emoção e paixão pela vida: é não perdê-la. Esse cultivo de enriquecedores instantes transformará o dia para além do trivial, embora esse aspecto  contenha elementos significativos na busca de instantes em que a felicidade pode ser, também, ali encontrada.
É! A felicidade aparece e desaparece que nem as marés, de forma constante. O que importa é captá-la. E se o engenho e arte forem bagagem criativa desse observador, transformá-la em pura poesia será seu mister.
Quanto a nossa mui leal e valerosa cidade de Porto Alegre, espero que ela se mantenha com seu sorriso estampado para sempre, porque ele é tudo para mim.
Esse sorriso é como uma bússola que me guia, diariamente, quando percorro os caminhos dessa cidade em busca da tal FELICIDADE.
Brindemos às datas, que se juntaram numa ode à manutenção do essencial à vida: SER FELIZ.
 
Uma saudação especial ao:
Dia da Felicidade, 20 de março;
Início do Outono, 20 de março;
Dia da Poesia, 21 de março;
Dia Mundial da Água, 22 de março;
Ao Aniversário de 242 anos da nossa cidade de Porto Alegre, 26 de março.
 
Diferentemente do refrão da letra de A Felicidade, música de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, a tal FELICIDADE pode também não ter fim. Basta que saibamos cultivá-la.
E quanto ao sorriso de Porto Alegre, os ex-integrantes do TNT, uma das mais clássicas bandas de rock do Rio Grande do Sul, na canção Do Teu Sorriso Vou Lembrar, Porto Alegre, souberam muito bem musicá-lo, em uma homenagem aos 240 anos de Porto Alegre.
Boa audição!


A Felicidade – Tom Jobim
 
  


Do Teu Sorriso Vou Lembrar, Porto Alegre – Banda TNT
 
 
 

quinta-feira, 13 de junho de 2013


DIÁRIO DE UM POETA


O que é um diário?

Marina Colasanti, em seu livro Uma Nova Mulher, indaga se um diário seria um amigo ou uma companhia. Também é isso. E acrescenta a autora:

“Mas é, sobretudo, uma duplicação da gente mesma, espelho que não se apaga quando o rosto se retrai ou muda, álbum de retratos que conserva muito mais que um belo sorriso e a paisagem ao fundo”. E ela prossegue descrevendo os benefícios de um diário.

“A verdade é que um diário não pode ser lido por ninguém, a não ser pelo autor. E só será válido se escrito despreocupadamente, as coisas ditas às claras, sem metáforas ou jogos verbais criados para encobrir verdades a olhos curiosos.”


Agora, para José Saramago, em Cadernos de Lanzarote, a definição para diário é a que segue:

“Por muito que se diga, um diário não é um confessionário, um diário não passa de um modo incipiente de fazer ficção. Talvez pudesse chegar mesmo a ser um romance se a função da sua única personagem não fosse a de encobrir a pessoa do autor, servir-lhe de disfarce, de parapeito. Tanto no que declara como no que reserva, só aparentemente é que ela coincide com ele. De um diário se pode dizer que a parte protege o todo, o simples oculta o complexo. O rosto mostrado pergunta dissimuladamente: Sabeis quem sou?, e não só não espera resposta, como não está a pensar em dá-la.”

Para um poeta a definição acima é bastante adequada. É o que se depreende da leitura do poema/letra, de autoria de Chico Buarque de Holanda, Querido Diário, uma das músicas de seu mais novo CD.

Após ler inúmeras interpretações acerca da letra, desde aquelas que, ainda, vislumbram um viés político, àquelas outras que depreciam o poeta/compositor, colocando-o ao rés da mediocridade e sob o peso da decrepitude, filio-me àqueles outros que o enxergam como alguém que ainda acrescenta qualidade às letras da nossa música popular brasileira.

E por que esse alvoroço?

Porque o autor da letra usou, no décimo segundo verso, a expressão:

-“Amar uma mulher sem orifício”.

Valendo-me do conceito de Saramago, o tal diário do Chico, com seus versos metafóricos, aparentemente simples em seu conteúdo, ocultaria o complexo, protegeria o todo através das verdades ditas a conta-gotas. E a ele, autor, não interessaria se estão a entender ou não. O que quer é jorrar verdades que, com certeza, espelham nossas próprias dificuldades. Principalmente, quando a idade chega inexoravelmente, mostrando a cara sem enfeites. Porém, para um poeta isso ainda será mote para muita poesia. E é o que fez Chico, como sempre, de forma magistral, possibilitando interpretações diversas. E é isso que universaliza o texto, que o torna por demais humano, pois se amolda a qualquer um de nós.

À semelhança de uma quadra, construída em 5 estrofes de 4 versos cada, com rima alternada, vai sobrepondo imagens de uma realidade que se apresenta a cada dia (observe a expressão “Hoje”, usada repetidamente), exigindo-lhe uma reflexão diária , o que em nada o desmotiva ou arrefece o seu ímpeto de luta, quando afirma, quase num tom desafiador: “Mas eu não quebro”.

Constata, inicialmente, que seus conhecidos expressam um sentimento de pena, quando o encontram, por percebê-lo vivendo em solidão.

Arrastado pela cidade afora, vai, como todos, de roldão. Na volta para casa, porém, recolhe um cão de rua. Dar-lhe-á afeto? Receberá afeto? Não sabe, ainda. Logo depois, constata que esse ser lhe arranca um pedaço, de quando em quando. É! O amor é um sentimento que dá e exige. Talvez o olhar desse cão reforce mais ainda a constatação da solidão que o cerca. Com humanos, porém, o convívio é bem mais trabalhoso.

Busca, na caminhada, algo que lhe inspire ao sacrifício. Ter, quem sabe, uma religião a professar, com todos os seus símbolos, mártires e santos protetores. Quem sabe amar uma mulher sem orifício? Uma santa?

Não, acho que não é por aí. O autor também não acredita que esse seja o caminho.

Tanto que, de repente, afinal, conhece o amor. Constata, porém, que esse tal amor é difícil de entender. É, na verdade, uma obscura trama, como diz.

Chico, que dizem ser um grande conhecedor do universo feminino, em entrevista, transcrita abaixo, diz ser um desconhecedor do sexo dito frágil. Acredito nessa assertiva.

Ele não consegue entender, porque sem nunca bater nela (mulher) nem com uma flor, se ela vier a chorar, seu desejo, sua libido aflorará. Essa tal libido acordará, quando ele, ao vê-la chorar, pensar em protegê-la. Serão necessários gatilhos mais contundentes, de ora em diante, para tal despertar?

De qualquer maneira, quando o inimigo (?) (libido- porrete- símbolo fálico) vier espreitar, armando tocaia “pra mó de lhe quebrar”, vai avisando que não se quebra fácil, no máximo irá vergar-se. Porque é macio, viu? Não se desespera o poeta frente à incapacidade momentânea.

Pois o poeta, esse homem frente à solidão e às inúmeras carências que vão se somando à idade, busca alento, refúgio, companhia na figura de um cão que o afague com o olhar, de uma religião que o ampare ou de uma mulher sem orifício que, quem sabe, seja a solução.



Porém, encontra, ao final, aquela que o transforma. Aquela que lhe inflama o desejo.

Mas, digo eu, muito provavelmente, terá essa nova parceira que acompanhá-lo nas suas incertas e imprevisíveis investidas. Isso, se tiver orifício. Caso não tenha, até que seria uma solução. Depois de certo tempo de vida, o que interessa mesmo, para ambos, é o companheirismo, a amizade, a cumplicidade, o carinho, o zelo.

Talvez, finalmente, Chico passe a entender as mulheres.

Pois é, dentre tantas interpretações, essa é apenas mais uma.

VIU?

 
 

Ah! Ia esquecendo:

Para aqueles que criticaram o autor pela pobreza da rima sacrifício/orifício, acredito ser absolutamente ajustada. Tenho para mim que esse casal de Adão e Eva vai ter que encontrar outro “approach”, porque esse já se esgotou. Depois de certo tempo na estrada, alguns prazeres passam a ser um problema, quase um sacrifício.

 
 
 
 
 
Bastidores da gravação da música Querido Diário - Chico Buarque 
 
 
 Chico Buarque e a Internet – Velho e Bêbado
 
 
 
Chico Buarque – o desconhecedor de mulheres