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terça-feira, 16 de dezembro de 2014

DE VOLTA? SÓ A BACIA...


Do interfone uma voz masculina perguntava se a calopsita, que caíra no pátio de sua casa, era de alguém do edifício. Aninha, atendendo ao celular com uma das mãos, informou que não conhecia alguém do prédio que tivesse uma calopsita. A bem da verdade, havia um vizinho, recém-chegado, que talvez fosse o dono da tal ave. Quem sabe? Forneceu o número do apartamento, então. Poderia, também, ter referido outro edifício bem próximo, com apartamento térreo e pátio, além de uma casa com um quintal imenso, também próxima, de onde poderia a calopsita ter escapado. Diante da impossibilidade de falar, ao mesmo tempo, com um celular e o interfone preferiu apenas mencionar o novo vizinho, por absoluta economia de tempo.

No dia seguinte, soube pelo tal vizinho que a calopsita fora entregue a ele dentro de uma bacia, para que se informasse ou descobrisse de onde ela partira e quem seria seu dono. Que empreitada!

Aliás, o Roberto, nome do novo vizinho, contou a Aninha que a calopsita já se encontrava na casa de sua sogra. Ao que parece, até já teriam dispensado a bacia e adquirido uma gaiola. Eh! O afeto já tinha tecido alguns fios de acolhimento ao pequeno ser.

A calopsita é um pequeno papagaio da família Cacatuidae, descrita como espécie, pela primeira vez, em 1792. Originariamente, é uma ave das áreas úmidas da Austrália.

Quando da entrega, ficou a dúvida se a calopsita tinha se perdido por aí ou se o dono não mais a queria. Pelo menos, foi esta a sensação extraída pelo Roberto do encontro com o suposto salvador, homem forte de cabeleira vasta.

Aninha sabe que comida para uma calopsita exige certo cuidado. Basicamente, são grãos misturados. Cuida-se, porém, que a porcentagem da mistura seja 20% de alpiste, 50% de painço, 15% de arroz com casca, 10% de aveia e 5% de girassol. Mas não mais de 5%, porque o dito engorda e não é muito bom para animais em cativeiro. Muito menos para calopsitas que são pequeninas em tamanho (12.8cm até 32cm de comprimento incluindo a cauda) e leves no peso (78g a 125g). Mas claro, há os alimentos balanceados para melhor controle de peso. Olha só o gasto!

O que deve ter acontecido com a calopsita? Ninguém sabe. Talvez, seu dono tenha resolvido propiciar alguns minutos de liberdade a ela, soltando-a pela casa. Bastou um descuido e ela sumiu por encanto. É o que pode ter acontecido. Que mão de obra!

Agora, Aninha tem outra versão sobre a entrega da calopsita. O tal homem de cabeleira vasta pode ter usado o expediente para livrar-se da ave.

Tempos atrás, Aninha adentrou no mundo das calopsitas, quando andava às voltas com a crônica O DONO DO ASSOBIO, publicada em 14/02/14. Na oportunidade, encontrou dois vídeos muito elucidativos. Num, a calopsita repetia frases tipo:

Papai é meu amigo...

Papai me ama...

Deus é bom pra mim...

Papai chegou...

Bate o pé, bate o pé...

Nana, nenê...



Já pensaram bem?

O indivíduo chegando em casa, exausto, e sendo cobrado “sutilmente” por atenção com a frase Papai é meu amigo, repetida à exaustão? Esta calopsita, a do vídeo, fala e não se aninha aos pés de seu dono como um cachorrinho ou um gatinho. E olha que a palavra é uma ferramenta poderosa!

Agora, quando ela é treinada para assobiar o Hino Nacional Brasileiro, o bicho pega!

Aquilo que, cantado na hora certa, é pura emoção, torna-se algo enfadonho, até irritante, dependendo do humor e das dificuldades enfrentadas, no dia a dia, pelo dono da casa e, por óbvio, da calopsita. Este assobiar, convenhamos, cheira mais a provocação do que incentivo.

E há quem esteja já treinando as calopsitas para cantarem a letra do Hino Nacional do Brasil! Já pensaram?



Se a versão da Aninha vingar, o dono verdadeiro da calopsita nunca mais vai aparecer.

De todo este imbróglio, parece que o Roberto apenas foi questionado sobre a bacia, que se encontra na casa da sogra, e que o dono virá buscar, oportunamente.

Agora, para quem não dispensa uma calopsita engaiolada em casa, Aninha pede que a deixem emitir o seu som característico, o seu arrulhar que pode transportar o seu dono para o mundo das calopsitas, ou para qualquer outro, podendo fazê-lo viajar em pensamento. Desta mesma forma é que Aninha viaja com os papagaios que habitam o Bairro Menino Deus. Todos livres, leves e soltos a marcarem local e hora: ao amanhecer e ao entardecer, especialmente. Junto a eles variados pássaros que os acompanham em voos circulares e que oferecem seu bailado como pano de fundo para os alegres papagaios.

Como Aninha poderá manter a imaginação fluindo se prenderem os papagaios?



Ah! Para finalizar, os estudiosos das calopsitas afirmam que o penacho sobre suas cabeças é tão expressivo quanto o rabo é para o cachorro. Penacho para cima significa estar nervosa ou atenta; quando emitem um som parecido com uma tosse é porque estão bravas; se for um grito, pode ser carência. 

Agora, se puderem, de vez em quando, sair da gaiola e voar por dentro de casa, será melhor ainda. Afinal, não lhe cortem as asas, pois com elas poderão voar por sobre os móveis e, talvez, seu dono possa apreciar melhor a beleza exuberante desta ave que não canta como um sabiá, mas que voa com graça. Ação esta que é própria de sua natureza.

Pois em gaiola, nem sendo dourada, os coitados dos passarinhos gostam de estar.

Olavo Bilac em O PÁSSARO CATIVO retrata bem a tristeza e a angústia que a gaiola representa para os pássaros, conforme poema transcrito abaixo.

E para ficar pela metade do século passado, um pouco após o falecimento do grande poeta parnasiano, ocorrido em 1918, a música SABIÁ LÁ NA GAIOLA, um dos hits do ano de 1950, dá o tom alegre e infantil, num vídeo animado, ao desejo de liberdade do sabiá.



Sinceramente, acho que de volta só querem mesmo é a bacia. Ainda bem! Acho que a calopsita já encontrou um novo lar. Nesta nova morada, acredita-se que a portinhola da gaiola todos os dias abrir-se-á, por um tempo, para que ela desfrute de uma liberdade protegida. Não é a ideal. Mas... 

Parece, pelo que soube Aninha, que, na nova morada, a calopsita já é a rainha do pedaço.



É! Até o momento, o único dono, que se apresentou como tal, é o dono da bacia: que virá buscá-la. Virá buscar a bacia, é claro. Será?






SABIÁ LÁ NA GAIOLA – Grupo Anima/Letras 




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Comentários via Facebook:

Rosangela Guerrieri Pereira: Ah, Soninha, que bonitinho o vídeo, a menininha chamando o pássaro com a mãozinha. O texto está muito lindo. Afinal, o dono virá ou não buscar a bacia? Bjo

Amelia Mari Passos: "O afeto já tinha tecido alguns fios de acolhimento ao pequeno ser" AiiI!!!que delicia de ler , escutar e assistir. Soninha Athayde tu nos faz bem. Um abraço

Anninha Simioni: Texto maravilhoso carregado de leveza, sensibilidade, amor e poesia, Parabéns e um abraço, Soninha!


quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

SEU SONHO ERA BEM OUTRO!

Foi muita frustração! Estava tudo acertado. Ele seria ela. Bela, colorida, variada nos matizes. Por um erro, que não sabe bem de quem, acabou na mesma família delas, mas com atributos que dispensaria, sinceramente.
Com certeza até abriria mão da coroa que lhe outorgaram, só para ser admirada, olhada, cultivada com todo o carinho.
Por vezes, se insurge, pois destoa, em beleza, da família a qual pertence.
Se a coroa não lhe traz benefício algum, o que adianta ser rei!
É um rei frustrado, pois seus súditos, embora gostando dele, por vezes, machucam-se ao tocá-lo. E ele gosta de ser tocado, puxa vida!
Tem o corpo todo espinhoso e ressequido e sua maciez está tão escondida que causa esforço e grande cuidado a quem precisa desnudá-lo. Possui farpas pelo corpo afora.
Na verdade, nunca conseguiu conformar-se com essa situação.
Além disso, guarda uma estória bem desagradável, que lhe contaram há anos atrás.
Pois um irmão seu foi causador, sem querer, de um ferimento, que teve como consequência a eliminação desse pobre irmão da vida daquela pequena vítima.
Existia uma menininha que gostava tanto desse seu irmão, mais tanto, que o consumia diariamente. Era um, inteiro, por dia. Ao final de vinte e poucos dias, na língua da pequena vítima surgiram pequenos cortes com pontos de sangue.
Vejam se isso aconteceria com o consumo diário de uma banana, uma maçã, uma pera ou uma ameixa. Poderia estar comendo até hoje sua porção diária, sem problema.
Mas a paixão é cega. Atirou-se, de cabeça, no consumo diário de um abacaxi. E deu no que deu.
Na realidade, esse coitado, pertencente à família das Bromélias, vive acabrunhado. Não é belo como suas irmãs, nem tampouco benquisto.
Vejam bem o que registra o "amansa-burros" sobre este vocábulo:

* Bras.Gír. – coisa trabalhosa, complicada, embrulhada, intrincada (Antes de viajar, teve vários abacaxis para resolver);
* “Dois meses depois, ela telefona em pânico: ‘Vou ser mãe!’ Do outro lado da linha, Sandoval explode: ‘Que abacaxi!’ E, então, começa a evitar a pequena.” (Nélson Rodrigues, 100 Contos Escolhidos. A Vida Como Ela É, II, pp. 57-58);
* Descascar um abacaxi: resolver uma dificuldade, um problema.
                                            (Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 5ª edição)


Na verdade, nem sabe bem por que existe.
É gostoso? É.
É cheiroso? É.
É de difícil trato? Reconhece que sim.
Pergunta-se, até hoje, por que não lhe deixaram seguir o caminho das companheiras da espécie, por que o impediram de servir de enfeite nos avarandados?
Já tentou convencer-se de que vale mais, de que é mais importante do que as belas da sua espécie.
Analisa-se e percebe que cada um de seus “olhos”, que estão espalhados pelo seu corpo, corresponde a uma flor. Ele é, portanto, um conjunto de flores que se fundiram em um grande fruto de um só corpo. E pra compensar sua transformação em um fruto, e não uma flor, puseram-lhe no topo do corpo uma coroa.  Foi só pra enganar. Ela não lhe serve pra nada. Pelo contrário, é por ali que começam os primeiros sinais de sua destruição. É quando lhe arrancam esse sinal de nobreza, à força, ou ele apodrece, indicando a sua já próxima e completa deterioração. Por conta da beleza dessa coroa, ele é conhecido como o rei dos frutos. Alguns o chamam de rei das frutas. Imaginem! É pra enlouquecer!
Não tem certeza, mas acha até que vive menos tempo do que sua irmã, a bromélia em flor. Esse pensamento, que o atormenta, deve ser por conta da baixa autoestima que carrega consigo.
Ela até é nome de música da Bidê ou Balde, conhecida banda gaúcha.
Ele, depois de muito procurar, só encontrou referência a sua existência através da música Piuí Abacaxi. Assim mesmo foi só pra rimar com “por aí”.
Vejam:
“Piuí Piuí, Piuí Abacaxi,
Choc, choc, choc, choc por aí."

É! Pelo menos a letra da música fala em sino que toca. Acredita que aquele seu irmão, que salta da frente do vagão na descida do trem, é o tal apito: o Piuí.
O barulho do trem, por outro lado, lembra o som cadenciado do seu nome: abacaxi... abacaxi... abacaxi... abacaxi...
Isso não é o bastante, porém.
Ainda vai conferir melhor aquele vídeo.
Que tristeza!
Diante desse quadro, confessa que portar uma coroa é muito pouco.
Inconformado, declara-se ser uma fruta a contragosto.
Seu sonho era bem outro!

*Crônica elaborada a partir da frase “O ABACAXI É FRUTA A CONTRAGOSTO”, ideia guardada no baú da memória de Luis Fernando Veríssimo e revelada na crônica de sua autoria publicada, em 16 de fevereiro de 2014, no jornal O Estado de São Paulo, Caderno Cultura.
Em face da sua confissão de não ter a menor ideia do que pretendia dizer com ela, o que eu duvido por conta da genialidade que o faz meu ídolo, tentei achar uma explicação para a referida frase. Espero ter conseguido.


Bromélias – Bidê ou Balde


Piuí Abacaxi – Patati Patatá 



sexta-feira, 28 de junho de 2013

BEM MAIS QUE 0,20 CENTAVOS!

O olhar desolado, por vezes aflito, suplicante na maior parte do tempo. Poucos chegarão de forma diversa dessa. Poucos conseguirão manter-se dignamente após tantos anos de trabalho e contribuição aos órgãos competentes. Expliquemos melhor para entender a imagem.

Esse é o caso de Dona Mariazinha. Pessoa que trabalhou por anos a fio, perfazendo regularmente o tempo para a aposentadoria. Seus últimos vinte anos de trabalho passaram-se junto a um conhecido laboratório de análises clínicas dessa Capital. Era excelente datilógrafa, cumpria suas atribuições com assiduidade e responsabilidade, sendo elogiada pelos chefes.

Essa senhora, hoje com 83 anos de idade, contribuiu, regularmente, durante todo o tempo de trabalho exigido por lei para se aposentar sobre o valor de quatro (04) salários-mínimos. Aposentou-se, efetivamente, ganhando quatro (04) salários-mínimos. À época, era um valor razoável. Aliás, como hoje também o é. Sendo ela solteira e sem filhos, o que percebia satisfazia suas necessidades, considerando que não pagava aluguel, pois vivia na casa de um irmão.

Acontece que Dona Mariazinha foi envelhecendo. Seu irmão, que lhe auxiliava, veio a falecer antes dela. E ela, após algum tempo, percebeu que sua aposentadoria definhava a cada ano. E a diferença aumentava entre o que iniciara ganhando e aquilo que, agora, vinha percebendo mês a mês.

E a sua estupefação chegou ao clímax quando verificou que um dia, de não sei que ano, porque coisas desse tipo é preciso esquecer para não desabar, ela recebeu, no final de um mês, a quantia de um (1) salário-mínimo.

Já com a saúde abalada, com dificuldades para caminhar e alimentar-se, não mais tendo o irmão para socorrê-la, uma sobrinha resolveu assumir a posição de seu tio, irmão de Dona Mariazinha.

E essa contribuinte do INSS passou a viver em clínicas. Sua aposentadoria, de um (1) salário mínimo, não é suficiente para a compra dos remédios e das fraldas de que faz uso. A tal sobrinha de Dona Mariazinha paga a clínica e uma cunhada cobre o valor que excede do salário-mínimo para as referidas compras.

Agora, o dramático é que Dona Mariazinha se hoje ganhasse os quatro (04) salários-mínimos para os quais contribuiu e que efetivamente iniciou ganhando, teria tido condições de pagar SOZINHA a clínica onde se encontrava até a poucos dias atrás. Restaria aos parentes apenas uma contribuição para o complemento necessário de suas despesas.

Calculando:

Preço da clínica onde se encontrava: R$ 2.450,00

Valor da aposentadoria, mantidos os (04) salários-mínimos: R$ 2.712,00

CONCLUSÃO: Sobrariam R$ 262,00 para ainda colaborar na contribuição dos demais parentes, que aportariam o que faltasse para suprir as necessidades.



Seu olhar aflito, por ter nova mudança de clínica, é perfeitamente compreensível e desesperador. Há tantas outras pessoas em condições semelhantes, de verdadeira miserabilidade. Com essa aposentadoria de (01) salário-mínimo não precisaria ter ela contribuído sobre (04) salários, durante tantos anos. O mais sensato, correto e justo, no seu caso, teria sido ter contribuído apenas sobre o mínimo, pois é o que lhe sobrou hoje. Ou, se estivesse na informalidade, bastaria ter aguardado a idade prevista de 65 anos, comprovada a impossibilidade de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família, conforme prevê o art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e requerido esse tal salário-mínimo.

O fato é que as modificações que estão a acontecer em nada tem melhorado a discrepância entre a contribuição paga durante a vida laboral e a contraprestação do Estado no gerenciamento de tais recursos e na destinação correta e atualizada de valores descontados, ao longo do tempo, de milhões de aposentados.

Após anos, constata-se o logro em que caíram milhões de aposentados.

Ocorreu, de verdade, uma expropriação de seus haveres.

Isso é uma vergonha nacional.


O poeta Luiz Coronel, patrono da Feira do Livro de 2012, sintetiza, através do poema SALÁRIO MÍNIMO, extraído do livro Um Querubim de Pantufas, exatamente como abaixo transcrito, as agruras de quem dele vive.

Diante dessa triste constatação, deveriam todos os aposentados, espoliados que foram, levantar cartazes onde se leriam os valores a que têm direito, levando-se em conta suas aposentadorias no exato momento de sua obtenção.

No caso de Dona Mariazinha, o seu cartaz estamparia a quantia de R$ 2.034,00, que é o que lhe tiraram ao longo do tempo. Para ela que, hoje, ganharia quatro (04) salários-mínimos, faltam-lhe exatamente R$ 2.034,00.


Para Dona Mariazinha a briga é por

                                                                                                BEM MAIS QUE 0,20 CENTAVOS!









Vanera do Aposentado – Os 3 Xirus

Pobre Aposentado – Bezerra da Silva  
Melô dos Aposentados

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013



Ó ABRE-ALAS...

A época é oportuna. A hora é agora. Aproveite os próximos dias para exercitar essa necessidade que nos mantém mais vibrantes, mais esperançosos.

Abra as gavetas da alma, retire os trapos, sim, desde que sejam bem coloridos. Desnude-se da tristeza, vista-se por fora e por dentro com o que de há muito estava jogado no canto. Transforme-se num outro personagem. Escale muros, rompa paredes e se jogue de corpo inteiro, num mundo do faz de conta. E faça de conta que é bom de samba no pezinho. Se não conseguir, saracoteie mesmo assim.

Permita-se esse devaneio. Inspire-se na alegria contagiante dos passistas, dos ritmistas, dos puxadores de samba, da escola como um todo.

Não importa onde você esteja: se em casa ou na avenida. Introjete essa alegria contagiante e viva, por esses poucos dias, apartado da tristeza. O Carnaval serve para isso. São poucos dias. É acessível a todos e vale como uma terapia. Muito cuidado, é claro, para não exagerar. Tudo o que é em excesso prejudica.

O grande risco é tornar-se mais alienado do que já se é normalmente. Se a imersão for muito profunda, levará um tempão para a recuperação. E aí já teremos atingido o próximo Carnaval.

Mas como não sucumbir à necessidade de sonhar?

Quando a sociedade civil organizada parece não encontrar mais rumo, nem seus cidadãos, aqueles que efetivamente constroem o país com o seu trabalho honrado, mais amparo no atendimento às necessidades básicas de saúde, educação e segurança, o que esperar dos outros 361 dias?

Aproveitemos do Carnaval, pelo menos, a alegria, a capacidade de sonhar, a capacidade de transformar sucatas em verdadeiros castelos, carregados de sonhos e de esperanças.

Mas que não herdemos apenas o sonho pelo sonho, que nos alimenta a alma, mas não nossas famílias, tampouco nossa cidadania.

Abramos bem os olhos para o rumo que as coisas estão a tomar.

Que a zona de dispersão, que acompanha toda escola de samba, não espelhe o comportamento do coletivo. Porque nós somos o coletivo e devemos estar unidos em busca de soluções para os graves problemas que afligem nossa sociedade.

Parodiando o refrão da antiga marchinha carnavalesca que diz:

“Ó abre-alas que eu quero passar”, digamos:


Ó ABRE-ALAS QUE EU QUERO SONHAR

Ó ABRE-ALAS QUE EU PRECISO SONHAR COM UM NOVO TEMPO





 
 
 
 
 
Ó Abre-Alas(Chiquinha Gonzaga) - Leandro Braga / Marlene, Emilinha e Angela Maria
 
 
 
 
 
 
 
 

 

sexta-feira, 2 de novembro de 2012












AOS QUE JÁ SE FORAM


Na esquina encontraram-se. Uma esperava para atravessar, a outra também, só que no sentido contrário. Saia e blusa pretas e um olhar triste trazia uma. O sol que brilhava parecia relevar mais ainda a escuridão da figura. Joana permaneceu na calçada, esperando pela vizinha que se deslocava até ela. Trazia aquela no semblante a tristeza que já perdurava há dois meses.

Chegou e parou. Contou detalhes. Falou aquilo que disseram os irmãos na derradeira hora. Um acerto de contas de quem fica. Sem a contrapartida. Disse do seu descontentamento com tais falas. Ela, porém, não dissera nada. Ele também assim faria. E isso doía mais ainda. Não precisavam ter dito o que disseram, não havia necessidade. Principalmente, porque não havia mais possibilidade de resposta. Há coisas que se diz enquanto ainda existe sentido em dizê-las. Com a voz embargada, surpreendeu-se com Joana, olhos marejados de lágrimas, que tentava explicar a ela a catarse a que os irmãos haviam se submetido, oferecendo as falas, desnecessariamente, aos circunstantes.

E as duas, na esquina, alheias aos passantes, estiveram a ponto de romper em um choro convulsivo. Uma, pelo pai que se fora. A outra, pelas lembranças dos seus, que também já tinham se ido.

Contiveram-se, porém. Mantendo a conversa, racionalizaram a emoção do momento até que ela se dissipasse. E ela foi, aos poucos, sumindo.

O que faz a morte conosco!

Surpreende a quem a assiste, principalmente quando não é esperada. O que não era exatamente o caso. O seu pai iria completar 101 anos dali a dois meses. Mais de cem anos de vida, parece muito tempo. Para a vizinha, porém, não foi. Havia muito ainda a falar, a dizer, a conversar, a se identificar. Ela que era a mais parecida com ele. Acredita, por isso, que, ao contrário dos irmãos, dissera ao pai, quando vivo, tudo o que quisera e que achara importante à época. Essa também era uma marca conhecida do pai: dizer direto ao interlocutor o que pensava a respeito de tal ou qual coisa.

Pois Joana, a vizinha que aguardara na calçada, aquela que se emocionara, chegando às lágrimas, crê que temos e teremos sempre dificuldade enorme em recebermos essa visita indesejada. Esse apagar abrupto, ou mesmo lento, da centelha que arde no peito de quem amamos, coloca-nos frente a frente com a nossa própria derradeira hora.

Os minutos passaram-se. A vizinha, ao final, conta ainda de seu temor em defrontar-se com pessoas falecidas. E isso ocorre mais à noite. Essa observação faz com que Joana, muito brincalhona por natureza, faça gestos de quem surge por detrás da cortina da sala, ou no vão da porta do quarto, brincando com o assunto. Tudo para descontrair.

A buzina insistente de um carro desperta a atenção das duas para o trânsito, que é intenso àquela hora.

Despedem-se, cada uma, tomando o rumo inverso. Uma que volta para casa, outra que segue para novo compromisso.

Pois, naquela esquina da vida, duas vizinhas aproximaram-se um pouco mais daquilo que nos faz, a todos, absolutamente iguais: o sentido de finitude. Seremos mesmo finitos? Há quem creia que não. Por enquanto, o que sabemos é que fizemos parte dessa teia chamada Vida.

Sabem de uma coisa? O melhor mesmo é deixar pra lá.

O sol ofusca o olhar de Joana. Com cuidado, atravessa a rua e vai lembrando-se dos seus queridos que já se foram. Teria ela, própria, dito tudo o que gostaria se tivesse tido oportunidade? Tivera ela oportunidade? Ou nunca ousara tal enfrentamento?

O tempo, que é sábio, sussurra-lhe que isso não mais importa.

Nesse Dia de Finados, nossa homenagem à lembrança de todos os que já partiram.





E para lidar com esse assunto, de uma forma mais campeira, nada melhor do que assistir ao vídeo do pajador Leonel Gomez cantando a música Campo Santo, de sua autoria em parceria com Rogério Ávila.

Aliás, para finalizar, como diz a letra, a mim, também, me gusta cruzar de largo...

Assistam e vejam se concordam com o pajador.





 

 
 
 
 

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Comentário recebido via e-mail:




Sonia.
          Primeiro quero agradecer a homenagem  ao meu pai. Quanto a crônica ao lê-la me emocionei muito já que tudo estava real.Tenho certeza que, quem a leu viajou no tempo e na realidade do fato em si.Está tudo exatamente como aconteceu,até a emoção das duas vizinhas que se encontraram na esquina e da tristeza da outra enlutada. Acho que somente uma escritora sensível como tu poderia relatar esta história com o verdadeiro sentimento de solidariedade.Obrigada e continue...