terça-feira, 2 de abril de 2013



CERIMÔNIA ANTECIPADA


Geralmente, prepara-se com antecedência o objeto que sofrerá as penas infligidas a quem traiu o Salvador.

Há notícias de que esse ritual data de antes de Cristo e que dizia respeito às colheitas. Primitivamente, afastaria os maus espíritos das culturas agrárias.

Há relatos, porém, que esse ritual simbolizaria a perseguição aos judeus na Idade Média, época da Inquisição. Também há quem afirme que essa manifestação remontaria às festas pagãs, na época dos romanos.

Ao que se sabe, essa cerimônia ingressou na América Latina nos primeiros séculos de colonização europeia. E, no Brasil, foi trazida pelos povos da Península Ibérica.

O fato é que aqui se instalou e até hoje, principalmente em cidades do Interior, é prática usual no Sábado de Aleluia. Trata-se da conhecida Malhação de Judas. Cerimônia, em que gente do povo, previamente, constrói um boneco do tamanho de um homem, enchendo-o de trapos, serragem, jornal, pedaços de galhos, possibilitando deixá-lo com a aparência de um indivíduo. Então, no Sábado, véspera da Páscoa, moradores levam-no para a praça pública. Lá, ele será apedrejado, tripudiado, rasgado, destruído até virar frangalhos. Por fim, ateia-se fogo, inclusive.

Isso tudo representaria o revide dos filhos de Deus contra a traição de Judas Iscariotes, um dos discípulos, a Jesus Cristo, guia deles e nosso.

A cena lembra os primitivos tempos da barbárie em que o homem esteve submerso. Algo que, em nossos dias, ao que parece, perde força. Pelo menos, falando-se dessas encenações em nossas capitais. Um parêntese: Não nos esqueçamos dos apedrejamentos das mulheres na Arábia Saudita, prática ainda usual. Isso demonstra ainda estarmos, em alguns lugares do Planeta, vivendo situações da barbárie, ainda existente.

Voltando a nossa realidade, há, com certeza, porém, cidades que ainda mantêm viva a tradição como, por exemplo, a cidade de Itu, no interior do Estado de São Paulo. O boneco deles é de tamanho avantajado, porque a tradição manda que tudo seja grande por lá. Também, ateiam fogo. Porém, há quem informe que, inclusive, colocam dinamite para promover o Estouro de Judas.

De algum tempo para cá, políticos, que caem no desagrado popular, veem estampadas suas fisionomias no Judas, para sofrerem agressões físicas e serem ridicularizados, tudo o que a cerimônia permite. Isso também ocorre com quaisquer outras personalidades, todas as que não sejam bem-vistas pela população.

Aqui pelo Rio Grande do Sul, em algumas cidades, também ocorrem essas cerimônias. Até mesmo em Porto Alegre, em alguns redutos, é tradição esse ritual.



Pois esse ano, um grupo de moradores, imbuídos do espírito da Páscoa, de renovação, resolveu antecipar a cerimônia para dois dias antes da tradicional data.

E o que se viu foi uma Malhação de Judas contra um patrimônio histórico, de valor inestimável à cidade.

Será que a ideia era destruir para, depois, renovar?

Se era essa a ideia, conseguiram. E nós, todos nós, porto-alegrenses, teremos que pagar pelos estragos deixados pelos participantes da cerimônia de Malhação contra o prédio da Prefeitura de Porto Alegre. Um prédio cuja pedra fundamental data de 05 de abril de 1898; de construção iniciada em 28 de setembro de 1898 e concluída em abril de 1901.

Numa autêntica Malhação de Judas, manifestantes munidos de paus, taquaras, pedras, bolas de gude e tinta, dirigiram-se ao Paço Municipal e lá, ensandecidos, protagonizaram cenas semelhantes ao antigo ritual.

Será que também o Paço os terá traído como fez Judas a Cristo? Ou melhor, será que o Chefe do Paço os terá traído?

Se assim ocorreu, no entendimento desses manifestantes, não podemos voltar à barbárie e destruir, a paus e pedras, o prédio que abriga o Chefe e, muito menos, por óbvio, o próprio Representante do Paço e seus colaboradores.

As regras de urbanidade, a busca pelos foros adequados, o diálogo e o espírito de renovação da Páscoa, indicam outros caminhos.

O caminho não é esse. Aprendamos a lutar com armas mais sutis. Sejamos mais inteligentes, mais criativos, mais colaborativos, mais civilizados.

Há que lutar por soluções pacíficas.

Há que lutar pela não violência.

Há que lutar pela PAZ.



E isso, absolutamente, não significa que sejamos pusilânimes no enfrentamento das questões que envolvem a comunidade por melhores condições de vida.

Continuemos a reivindicar nossos direitos a um melhor transporte público, a uma segurança pública efetiva, a uma educação e saúde, também públicas, de qualidade.

Mantenhamos, porém, a ordem.

Esse é nosso dever como cidadãos.





Recital a la Paz – Dante Ramon Ledesma
 
 
 
 
 
 
 
 

terça-feira, 26 de março de 2013


ENTRE O VISÍVEL E O DESEJÁVEL

O sorriso anda meio amarelado. Não te vejo, nem te sinto mais tão feliz, tão leve quanto eras.

Tu que a tudo assistias ao sopé do morro, de nome de Santa. Lá, embaixo, eras plateia. Eu encenava e contracenava. Tu, já eras pura exibição. E acompanhavas meus devaneios, sussurros e juras.

Não te punhas enciumada, pois a ti, de há muito, já me entregara. Ao outro, apenas no tempo certo me entregaria. De ti já era amante, apaixonada, desde sempre.

Desde quando, na ponta dos pés, espiava pela janela o movimento e o som buliçoso que de tuas artérias ouvia. Foste para mim um desafio a conquistar, desde quando buscava, no armazém da esquina, os saborosos docinhos de leite condensado.

Aos poucos, fui contigo formando um par indissolúvel. Fiz de ti minha morada. Casei contigo e com o outro. Tu, dada a tua natureza, não te importaste. Pelo contrário. É tua missão acolher mais e mais pessoas sob esse manto hospitaleiro.

Vivendo em ti, com o outro procriei e uma nova estrela veio juntar-se a tua já tão grande constelação.

Sinto-te perene, mas confesso que ando preocupada. Sei que a tudo assistes. Silenciosa, às vezes. Esfuziante, em outras. Tu és minha deusa à beira de um rio, reverenciada a cada entardecer pelo mais belo pôr do sol.

Agora, teus filhos andam meio desleixados contigo. Por vezes, para chamar a atenção, aproveitando-se da companheira chuva, esparramas tuas lágrimas para além dos limites desejáveis. Só para “inticar”. Só para mostrar que a coisa não anda bem.

Por outro lado, teus cartões de apresentação, igualmente, não têm tido os reparos necessários, para que consigas sorrir por inteiro.

Ah! O teu parque mais antigo e famoso, que eu amo tanto, sabes bem quanto precisa de um constante olhar protetor.

Tuas artérias, antes buliçosas com o calor humano, estão esgotadas por tantas máquinas potentes que trafegam espremidas que nem bois no brete.

Teus mais lindos enfeites, as árvores, que te tornam verdejante, fértil e bela, andam assustadas. Afinal, as espécies têm diminuído e a quantidade como um todo, ao que parece, também. E como vamos respirar?

Será isso um desvario?

Será apenas uma reacomodação?

Ando preocupada com a minha amada!

Quero vê-la sempre bem, sempre feliz, sorridente. E o que ando vendo não é mais esta expressão de felicidade.

É bom que acendamos o amarelo piscante. Que ele permaneça aceso a nos lembrar da responsabilidade desses filhos e dos filhos de seus filhos para com esse chão que nos acolhe.

E tudo, como se sabe, passa pelo grau de prioridade que se deposita como objetivo maior a ser alcançado pela comunidade.

É necessário priorizar as condições de sustentabilidade da nossa cidade, para que ela abrigue cidadãos satisfeitos com as condições ambientais proporcionadas a eles, no seu dia a dia. É o que todos nós, sinceramente, desejamos.

Para tanto, as forças vivas da comunidade, em mutirão, deverão empenhar-se na solução dos problemas que a todos afligem.

Não é para qualquer um manter esse cognome de CIDADE SORRISO.

Já que adotamos essa marca, temos a responsabilidade de cinzelar, em nossa identidade, a ferro e fogo, como se faz no gado, metaforicamente falando, um sorriso estampado no semblante de nossa amada cidade.

Tomara que possa ela, com a nossa ajuda, recuperar o seu autêntico sorriso de felicidade.


Feliz Aniversário, Porto Alegre!

Parabéns pelos teus 241 anos de existência!





Porto Alegre é meu porto – Kledir/ Ramil


Porto Alegre, Porto Alegre – Hermes Aquino

 
Ramilonga – Vitor Ramil
 
 
 
 
 
 
 
 

quinta-feira, 21 de março de 2013

A PRESENÇA DELA
                                 É GARANTIA DE VIDA
 
O berço cálido, de um colorido especial, convida a um espreguiçar-se para melhor acomodar-se. Já está, por bom tempo, imerso em meio líquido.

Um dia, porém, verte suas primeiras lágrimas, frente ao estranhamento pela chegada de um novo tempo. Junto às suas unem-se outras, plenas de emoção, daquela mulher maravilhada pela imagem viva a debater-se, produto de seu ventre.

Nos momentos de grande sofrimento, de profunda alegria, de rara emoção, de êxtase, lá estará ela presente. Ela está sempre pronta a marejar nossos olhos, porque a sua fonte existe em nós desde sempre. Essa fonte é quem nos sustenta desde a concepção até o último suspiro. E nossa mãe sabe disso. Cuida para que ela não nos falte. Afinal, mais de 70% do nosso corpo é constituído por ela.

Mas e aquela outra que jorra, incansavelmente, das profundezas de seu ventre, essa dádiva essencial à nossa sobrevivência, vem tendo um olhar agradecido, um olhar cuidador, um olhar que todos os filhos, já adultos, deveriam ter para com suas mães?

Antes, não cuidávamos porque a fonte parecia inesgotável. Na verdade, ela até seria. Hoje, sabemos que, senão a cuidarmos, tornar-se-á absolutamente proibida ao uso que dela fazemos, tendendo ao exaurimento. Isso significa que as próprias culturas, criações, nossos alimentos, parte da energia existente, tudo estará seriamente comprometido.

Essa mãe, fecunda e pródiga no jorro desse alimento insubstituível, tal qual o leite materno, precisa de ajuda. Com a grande diferença de que esse alimento é necessário durante todos os dias de nossa vida e não apenas nos primeiros tempos.

Quando foi instituído pela ONU, em 1992, o Dia Mundial da Água, a Mãe-Terra agradeceu. Mas, isso representou, já à época, um sinal de alerta, porque, invariavelmente, quando se cria um dia para homenagear alguém ou algo, é sinal de que é absolutamente necessário e urgente que modifiquemos a nossa visão e atuação sobre tal assunto.

Sabemos que o Planeta Terra é composto, aproximadamente, de 70% de água. Desse percentual, 97,5% concentram-se nos oceanos, 2% nas geleiras e calotas polares e 1% destina-se ao consumo. Esses 97,5% são de água salgada. Apenas 2,5% são de água doce, distribuída da seguinte forma: 29,7% nos aquíferos, 68,9% nas calotas polares, 0,5% nos rios e lagos e 0,9% em outros reservatórios (nuvens, vapor d’água). Todos esses são dados aproximados.

O Brasil detém 53% do manancial de água doce na América do Sul e o maior rio do Planeta: o Amazonas. Desse manancial 72% estão na Região Amazônica, 27% na Região Centro-Sul e 1% na Região Nordeste.

Temos ainda vasto lençol freático, também chamado de Aquífero Guarani, localizado no subsolo do Centro-Sudoeste do Brasil, com 1.2 milhões de km2, estendendo-se o restante pelo Nordeste da Argentina, Noroeste do Uruguai, Sudeste do Paraguai e nas bacias do Rio Paraná e do Chaco-Paraná.

Temos ainda o Aquífero Alter do Chão, localizado sob os Estados do Pará, Amazonas e Amapá. São reservas de importância incalculável.

Mas de nada adiantará tais reservas, se não aprendermos a cuidar da água de que dispomos. A continuar essa marcha desenfreada de poluição, estarão também poluídas as reservas quando dela necessitarmos.

O que causa estupefação é que mesmo os mais poderosos, donos das maiores fontes de poluição, não se dão conta de que os efeitos, já presentemente nocivos em regiões de maior pobreza, um dia, fatalmente, atingirão comunidades mais abastadas, onde esses melhor aquinhoados se encontram.

Ou quem sabe, pensem que isso não os atingirá, esquecendo-se dos filhos, netos, bisnetos, e por aí.

Ou quem sabe, pretendam mudar-se para outro planeta. Já estão sendo feitas incursões nesse sentido.

Ou quem sabe, esperem dos cientistas fórmulas milagrosas que despoluam, por completo, as águas dos rios, lagos e mares.

Ou quem sabe, só se interessem por si mesmos, no aqui e o agora, enquanto por aqui estiverem. O depois, a eles não interessa.

Ou quem sabe, a ganância tornou-os cegos e surdos à evidência dos fatos que estão a ocorrer. E continuam a discursar em cima do engodo, da mentira, da desfaçatez.

Ou, melhor ainda, até não discursam. Apenas agem nos subterrâneos malcheirosos de organizações ditas de desenvolvimento.

De qualquer sorte, o meu Guaíba pede socorro, o nosso Sinos, o nosso Gravataí e outros tantos.

Quem sabe ainda possamos sonhar com a despoluição de alguns conhecidos e importantes rios do nosso Brasil.

A poluição hídrica é um fato gravíssimo. Somente através de muita conscientização e mobilização da sociedade é que se poderá reverter esse quadro devastador de despejo nos mananciais hídricos de esgotos domésticos, efluentes industriais, resíduos hospitalares, agrotóxicos, etc.

Que esse dia 22 de março nos leve à reflexão e à cobrança efetiva por medidas de estancamento do despejo de contaminantes em nossas águas. Que os cidadãos comecem a exercer, já tardiamente, o papel que lhes compete, que é: cobrar das autoridades constituídas tais medidas.

Não esqueçamos que ÁGUA É VIDA, DESDE QUE ESTEJA SAUDÁVEL.

 

Agora, o fato incontestável é que essa dádiva, que nos alimenta desde sempre, serve de tema para inúmeras e belas músicas, cujas letras falando dela, da água, são pura poesia. Cassiano Ricardo, Membro da Academia Brasileira de Letras (cadeira nº 31, 1937), definia Poesia “como sendo uma ilha cercada de palavras por todos os lados”. Seria como afirmar que Poesia é o fenômeno criador, presente aí a figura do poeta, que transforma em linguagem as emoções, os impulsos ou suas reações frente a uma determinada realidade.

Segundo definição de Antônio Soares Amora, historiador literário brasileiro, “o poema é a fixação material da poesia, é a decantação formal do “estado lírico”. São as palavras, os versos e as estrofes que se dizem e se escrevem, e assim fixam e transmitem o “estado lírico” do poeta.
Então, quem sabe, um dia, possamos nos apropriar da água que nos cerca e fazê-la um verdadeiro poema, visível aos olhos, transformada, pelas ações corretas do homem, em pura poesia.

Assim como as ÁGUAS DE MARÇO que fecham nossos verões, bela canção interpretada pela saudosa dupla Tom Jobim e Elis Regina, que, também, é pura poesia.






Assista ao vídeo abaixo. Obtemos, através dele, um retrato da situação atual da água no planeta e seus prováveis e terríveis desdobramentos, se acaso medidas não forem urgentemente tomadas.



Documentário Ouro Azul: A Guerra Mundial pela Água.
 
 
Águas de Março - Tom Jobim e Elis Regina
 
 
Planeta Água - Suzy Noronha