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terça-feira, 20 de maio de 2014

A ELA

Desde sempre ela me acompanha. Suave som que me embalava já nos primeiros momentos de vida. Vibrações que percorrem meu ser, ainda tão pequenino. Sons da primeira infância, tão presentes. Ouvido extremamente perceptivo aos sons que me rodeavam. Assim foram os sons das folhas ressequidas, caindo ao chão, no pátio lá de casa. Transformei, bem mais tarde, esses sons em poesia e crônica.

Assim, sempre atenta aos silêncios, percebia também neles sons, os mais diversos. Fui, aos poucos, vivenciando os sons musicais, propriamente ditos. Fui acercando-me dela, habituando-me com ela. Fui aprendendo a senti-la das mais diversas maneiras: em exaltação, em êxtase, em recolhimento, em profunda tristeza, em apoteose.

Até que tive o privilégio de poder atravessar o Atlântico, sem nunca lá ter estado, pelo som de um alto-falante do navio que levava os pracinhas gaúchos à Suez, pois eu gravara músicas em uma fita cassete levada por um tio. Disso resultou uma crônica, também.

Não menos importantes foram as tardes de sábado e domingo, nas distantes décadas de 70 e 80, quando, novamente, sua companhia foi decisiva em momentos difíceis, de desesperança e muito trabalho. Mas ela estava lá, fiel. Sempre foi perfeita em todos os momentos, adequada a cada situação vivida. Em instantes de dor ou de alegria, uma diferente era escolhida e cumpria seu papel catártico de forma exemplar. Sempre foi capaz de restabelecer o equilíbrio interior, de confortar com sua divina presença. Sim, porque deve haver algo divino nesse poder que ela exerce sobre meu ser.

Buscar, na Ouverture “1812” de Peter Ilich Tchaikovsky, garra para avançar nos dias que se iam sucedendo, era uma constante. Captar a apoteose de uma Nona Sinfonia de Beethoven e vibrar com ela, bem como ouvir o belíssimo Concerto Tríplice, em dó maior, opus 56, acompanhado do Coral Fantasia, do mesmo autor, era um deleite para os meus ouvidos. Apreciar o virtuosismo de Salvatore Accardo, interpretando os seis concertos para violino de Nicolò Paganini, era inspirador. Perceber a riqueza de sonoridades das Quatro Estações de Antonio Vivaldi transmitia leveza. Sorver a paz, que emana de uma Ave Maria de Schubert, é divino. E quantos outros mais compositores clássicos poderíamos aqui mencionar, como: Brahms, Bach, Chopin, Haydn, Rachmaninoff, Liszt, Handel, Mozart, Strauss, Mendelssohn, Schumann, Wagner, Albinoni. Carlos Gomes e suas aberturas e prelúdios e Heitor Villa-Lobos, mais recentemente, já mais próximos do nosso tempo e de raízes brasileiras.

Também orquestras como as de Andre Kostelanetz, Mantovani, Franck Pourcel, Billy Vaughn, Glenn Miller, Henry Mancini, Bert Kaempfert, Burt Bacharach, Ray Conniff, Waldir Calmon, Radamés Gnatalli, famosas à época, ofereciam interpretações de músicas de excelente qualidade.

E o que dizer de Acker Bilk e seu trompete? E os tangos da Orquestra Típica de Edoardo Lucchina? E a excelente música popular brasileira, oriunda dos grandes festivais da época? E a nossa Bossa Nova? E os nossos cantores e cantoras mais conhecidos já incorporados aos novos tempos, com ritmos bem ao gosto da galera de hoje?

Ela está, como sempre esteve, por todos os lados a nos brindar através de inspiradas melodias e letras que nos acompanham no dia a dia. Mais recentemente, os sambas de partido alto e a música gauchesca foram incorporados ao meu cotidiano. Tudo, claro, com uma roupagem nova para entrar de vez no ritmo da Internet. Cada tipo de composição e letra tem o seu lugar guardado para um ouvinte que se disponha a buscar, sem preconceito, aquilo que aquela música, naquele momento, pode lhe acrescentar. Haja vista, as inúmeras bandas gaúchas e brasileiras que, com uma batida moderna, fazem os jovens, e também os não tão jovens, sacudirem “o esqueleto”. Ela é poderosa. Não importa se ela remonta aos tempos do Barroco, do Classicismo ou do Romantismo. Lá, foi importante. E, ainda, o é para quem se dispõe a ouvi-la com atenção redobrada, quase de forma reverencial. Composições primorosas em que a melodia torna dispensável qualquer letra. A exceção eram partituras que incluíam corais, como a apresentada no primeiro vídeo, em sua parte final, que segue abaixo. Ou se já pertence à era Modernista, onde a composição reúne melodia e letra, pelo menos na música dita popular.



Portanto, para mim ela tem ciclos mais ou menos predominantes, mas sempre presente. Quanto mais vazios existirem, mais ela far-se-á presente. Sempre foi assim. Ela preenche vazios, pois reverbera no meu interior.

Assim, desfilaram, ao longo dos anos, um sem-número de sons que se harmonizavam em composições clássicas ou populares. Coincidentemente, quando um ciclo de vida encerrava-se, ela aparecia com redobrada força a amparar essa sua amante, sempre tão carente de sua presença. Continuo a mesma. Encharco-me dela em momentos de necessidade. E ela possui a mim de forma avassaladora. Entrego-me a ela de bom grado. E ela, fidelíssima, nunca me desampara. Ao contrário, nada pede a mim. Apenas dá-me, em abundância e a minha escolha, o que de melhor possui: sua envolvente e inebriante sonoridade. Minha necessidade é o de que precisa. E é ela uma de minhas necessidades básicas. E, como tal, sempre que necessito (e sempre necessito) lanço mão dessa companheira. Às vezes, seu som basta-me. Outras, quero ouvi-la e vê-la executada por quem tem esse mister por profissão.

Ouço-a, também, num chilreio, num pingo d’água teimoso, até no bater ritmado de um coração que nunca para, obra-prima do Criador.

Originários de um universo barulhento, fomos embalados em suave borbulhar, nadando num meio ritmado. Expelidos, passamos a conviver num novo mundo sonoro, bem mais agitado. Mas, com o passar dos anos, descobrimo-la. Ela, agora, aparece já de forma ordenada. É uma festa de ritmos e sons. Tudo humanamente trabalhado para que ela se apresente de forma total: ritmos e sons perfeitamente ajustados e harmônicos.

E dela nunca mais nos separamos. Alguns serão mais dependentes, outros nem tanto. Mas de todos nós, em algum momento, ela fará parte. Nem que seja no Parabéns a Você, tão aguardado pelas crianças e por nós adultos, também.

Então é isso... Começa com aquele sonzinho do tapinha ao nascer, do estalo de um beijo, do som da chuva sobre o telhado, do vento zunindo. E por aí vai... Com o tempo, tomará contornos definidos e será cantada nas cantigas de roda, se ainda existirem, é claro. Acalantará o sussurro ao pé do ouvido, relembrará encontros inesquecíveis. Nunca mais nos largará. Acompanhar-nos-á até quando os sinos derem o toque final. Serão cânticos de despedida que, em algum momento, anjos entoarão, dando aos que ficam a certeza de que sua existência nos empresta motivo suficiente para vivermos melhor por aqui.



Portanto, sugiro que guardemos um tempo, a cada dia, para desfrutarmos de sua envolvente presença que nos reenergiza, descontrai, acalma, nos faz sonhar, tudo dependendo de qual carência estivermos apresentando e da correta escolha que fizermos dela. Com certeza, ela cumprirá seu papel, alimentando nossa vida interior com aquilo de que estivermos precisando.



Segundo John M. Ortiz, compositor, multi-instrumentista e psicólogo, autor do livro O TAO DA MÚSICA, ela é invisível, mas sabemos que está presente. Não podemos tateá-la, mas ela pode ser tocada. Não podemos prová-la, mas ela pode ser saboreada. Não podemos cheirá-la, mas ela enche o ar de fragrâncias. Quando sentimos o Tao da música, nunca mais o esquecemos.

E, mais adiante, continua:

Muitas pessoas, ao se sentirem deprimidas, escutam músicas, que refletem essa emoção ou que, ao contrário, as tornam alegres. Ela nos propicia uma oportunidade rara e prazerosa para alterar o padrão de nossos pensamentos, tornando nossa vida mais saudável e satisfatória.

O caminho da música, digo eu, é eterno, porque infinito.



Artur da Távola, conhecido jornalista, advogado, professor e escritor, cunhou uma frase que se tornou muito conhecida e com a qual encerrava um programa da Rádio MEC sobre música clássica, que é absolutamente verdadeira. Dizia ele:

“Música é vida interior. E quem tem vida interior, jamais padecerá de solidão”.

Ah! Ia esquecendo de acrescentar que parte desse amor à música deve-se ao contato que tive muito cedo com ela. Há poucos dias, graças ao Senhor Google e ao Facebook, descobri que minha professora de música, Nívea Rosa Thumé Karam, continua bela, como sempre foi. 

Um agradecimento especial a essa professora e a minha homenagem a ELA, a MÚSICA.



Em dias tão conturbados, precisamos cada vez mais dela. Busquemos nela a força para enfrentar os embates diários, a alegria que pode nos transmitir, a descontração tão necessária, bem como a fruição de momentos de paz e vivência interior. Tudo a nossa escolha.






Triple Concert - Choral Fantasy – Beethoven


Ave Maria de Schubert - Daniela de Santos



Pink Panther Theme - Henry Mancini




Afrikaan Beat  - Bert Kaempfert  



Stranger on the Shore – 1988 (Live) - Mr. Acker Bilk
  



Pela Internet – Gilberto Gil 




Fundo de Quintal ao Vivo 




Cheiro de Galpão - Os Monarcas 











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Comentário via Facebook:


Nívea Rosa Thumé Karam escreveu: 
"Soninha Athayde Parabéns pela maneira fácil com que consegues te expressar,li tua crônica do dia 20 de Maio e muito me envaideceu saber que de alguma forma eu contribui para que também te apaixonasses por Ela a música.Com esse poder que ela exerce sobre nós Soninha ,creio piamente a Solidão será para qualquer um que a cultivar,uma eterna desconhecida..Um grande abraço e obrigada menina dos olhos azuis."





quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

COMPOSITORES POR TABELA


Talvez tenhamos chegado ao momento em que tudo anda meio misturado. Não se sabe bem, pelo sentir, em qual época do ano andamos. Seria também essa a sensação nos já distantes séculos XVII e XVIII? Impossível saber-se. Mas houve quem se atrevesse a descrever, musicalmente, as estações do ano. E, ao que parece, eram já quatro as estações do ano. O que não se sabe é se seriam como as nossas de hoje, isto é, todas misturadas, independente do período. Isso, porém, não é o que nos interessa nessa reflexão de hoje.

Interessa, isso sim, destacar a importância dada a elas por um compositor italiano de nome Antonio Lucio Vivaldi (1678-1741) que compôs a conhecida obra AS QUATRO ESTAÇÕES. Composta por quatro Concertos para Violino que retratam fatos que ocorrem durante cada estação do ano como, por exemplo, o aparecimento do gelo, ocasionando possíveis quedas.
Que sensibilidade aguçada deveria ter quem transpôs para notas musicais sensações tão diversas, que se iam modificando a cada nova estação do ano. É o estado da alma das diversas estações que ele transcreve musicalmente.
E, para tal, o violino é o instrumento que canta em todas as suas obras.
Posteriormente, usou da voz na sua música coral, onde também sua produção foi importante.
Agora, para um violino cantar, parecendo, por vezes, falar, substituindo a voz humana, seu compositor e instrumentistas tinham que ser muito bons.
Aliás, grandes artesãos, como, por exemplo, Antonio Giacomo Stradivari (1644-1737), entre outros, transformaram o violino em instrumento nobre.
A profusão de invenção melódica de Vivaldi foi, talvez, o que o tenha tornado mais popular. Por óbvio, não teve a densidade polifônica de um Bach. Porém, foi genial em invenção e em imaginação transpostas musicalmente.
Como compositor e violinista foi famoso na Europa inteira. Sua obra é extensa, sendo considerado um gênio no gênero típico da música instrumental barroca que é o Concerto Grosso, onde dois, três ou mais solistas alternam-se com a Orquestra de Câmara.
O que a nós importa, porém, é perceber a dimensão da dificuldade de transpor para notas musicais as sensações, as nuances, as emoções, o estado d’alma que cada estação do ano propicia individualmente. Daí a importância de um compositor. E ele soube sê-lo.
No seu tempo, na sua época, do lugar de onde vinha, suas raízes culturais, suas circunstâncias e vivências, foi ele representativo e figura ímpar.
Essas QUATRO ESTAÇÕES não foram qualquer coisa. Tornaram-se universais, pois perduram até hoje.
 
E as QUATRO ESTAÇÕES, nome original do samba-enredo Cântico à Natureza, da Estação Primeira de Mangueira, no Carnaval de 1955?
E lá vão 59 anos de existência do samba de autoria de Nelson Sargento, seu padrasto Alfredo e, dizem também, com a parceria de Jamelão (José Bispo).
Muitos outros belos sambas foram compostos por Nelson Sargento.
Abstenham-se de comparar composições e compositores.
Não estamos aqui para dizer que a segunda obra é “uma coisa” e a primeira, é “outra coisa”! Até porque nem poderíamos comparar música erudita com música popular.
Estamos, isso sim, a reverenciar a figura do compositor e a data de 15 de janeiro como a escolhida para homenageá-los. A figura do letrista que, às vezes, é também o compositor da música, contribui para o sentir de quem ouve. As palavras, quando bem escolhidas, só acrescentam beleza à melodia posta.
A música, porém, quando de excelência, preenche o ser humano, trazendo-lhe um melhor entender-se, pois repousa na emoção. Ela é pura harmonia e traz paz. É o caminho da luz.
Pode, também, nos fortalecer, nos energizar, restaurar, motivar, impulsionar, reequilibrar, dependendo do seu estilo, do seu movimento e também de suas letras, por que não? Quantas músicas fizeram parte da nossa infância, da juventude, de momentos felizes, de expectativas, de instantes tristes?
E os compositores, por certo, são os responsáveis pela música que nos liga à nossa essência, que é movimento e vibração. O equilíbrio entre ambos, alternando-se com o relaxar, o dormir e o acordar, chama-se viver. Tudo com os andamentos variados de moderato, andante, allegro, allegretto, allegro com brio, adágio e, quando possível, com muito scherzando: que é pura alegria, graça, rapidez e leveza. E por aí vai...
Música é, portanto, vida. É ela que nos ajuda a nos tornarmos, também nós, compositores de uma partitura rica em tons maiores, menores, dissonantes, às vezes, mas, também harmônicos, no mais das vezes, que é a nossa jornada.
Segundo John M. Ortiz, compositor, multi-instrumentista e psicólogo:
“Só pela música conseguimos ouvir o passado, desfrutar o presente e compor o futuro”.
E mais adiante:
“Quando uma peça musical é composta, reflete o mundo do compositor – seus pensamentos, emoções ou estado psicológico – naquele momento. Transpostos para a música, esses sentimentos – a tradução de uma emoção que, de outra forma, seria fugaz – vivem na composição. Mais tarde, por meio da música, não apenas conseguimos ouvir, mas, às vezes em determinados níveis, sentir as emoções sendo processadas pelo compositor sob nossa própria ótica. Captada pela imaginação e introduzida em nosso mundo auditivo, a música fica capturada como um gênio na garrafa. Quando é solta, torna-se ora nossa escrava, ora nossa soberana.” (excerto extraído do livro O Tao da Música)
 
Portanto, abra a garrafa e solte-a para ouvi-la. Escolha qualquer uma das QUATRO ESTAÇÕES, a que mais preferir.
Escolhemos a “PRIMAVERA” de Vivaldi (10’20’’), para fazer par com a outra, porque é essa estação, conforme se vê da letra do samba, a mais reverenciada, pelo que se observa no refrão.
Boa audição!
Parabéns a todos os compositores!
 
E para os que quiserem ouvir as demais estações do ano, na criação de Vivaldi, deixem o vídeo rolar, pois ele dura 42 minutos.

 
 
 
 
Four Seasons – Vivaldi
 
 
 
 
 
Cântico à Natureza (As Quatro Estações)